Título: PSDB propõe retomar reforma política pelo voto dis
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 30/08/2007, Política, p. A12

Os defensores da reforma política tentarão desencadear uma campanha pública a favor do voto distrital, ao em vez de relançarem agora a discussão dentro do Congresso Nacional. A nova estratégia foi discutida ontem, em uma reunião promovida ontem pela Confederação das Associações Comerciais Brasileiras (CACB) com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-governador paulista Geraldo Alckmin e um grupo de parlamentares. Tanto Fernando Henrique quanto Alckmin se dispuseram a participar de atos públicos pela mudança.

"A reforma política só se fará quando houver uma interação do meio político com a sociedade", afirmou o ex-presidente. "O voto distrital é um sonho e não sairá nenhum sonho da cartola do Congresso Nacional, que é composto dos políticos que nós não precisamos", disse o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), em seu quinto mandato consecutivo.

Todos os palestrantes da reunião admitiram que o voto distrital possui defeitos. A regra pode distorcer a vontade popular, já que tecnicamente é possível um partido com 25% dos votos ficar com todas as cadeiras de um Estado, se o número de concorrentes por distrito for muito grande, ou sem qualquer cadeira, se for muito pequeno. E a divisão dos distritos pode direcionar o resultado eleitoral.

O próprio Fernando Henrique citou o caso da alteração distrital feita na França por Charles De Gaulle, quebrando os distritos operários nos arredores de Paris e tirando cadeiras na Assembléia Nacional do Partido Comunista Francês. "Sempre existe o risco, mas aqui no Brasil temos uma Justiça Eleitoral com credibilidade para arbitrar isso", afirmou Fernando Henrique. "O fundamental para fazer uma campanha de opinião pública é divulgar o voto distrital puro. As tecnicalidades serão resolvidas depois", sugeriu.

O argumento fundamental para a defesa da mudança foi a facilidade que o voto distrital proporciona a que se formem maiorias parlamentares. Mas o sistema foi descrito como de aplicabilidade múltipla: barateia as campanhas eleitorais, aproxima o eleitor do seu representante, fortalece partidos, garante a presença no Legislativo de todas as regiões de um Estado ou município.

"Hoje a Câmara virou uma casa de 19 minorias e nenhuma maioria. Estamos em condição de votar qualquer coisa, desde que não tenha importância. Tudo que é consensual na Casa, é inócuo. Não há mais capacidade de deliberar. Sou um beneficiário do sistema atual, porque não fiquei em primeiro lugar em nenhum município, mas tenho de reconhecer que ele está falido", disse o deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS). "O que acabamos de ouvir é muito grave. Este cenário de um Congresso que não delibera mais é o que Wanderley Guilherme dos Santos traçou em seus trabalhos ao se referir ao tempo de João Goulart", afirmou Fernando Henrique, referindo-se ao ex-presidente que terminou deposto em 1964.

Autor do livro "O Cálculo do Conflito", em que comenta a crise de governabilidade do período Goulart, Wanderley Guilherme não concorda com a comparação. "As palavras de Ibsen realmente retratam o quadro que havia no tempo de Jango, onde a formação de maiorias dentro do Congresso só era possível para que propostas fossem vetadas, desencadeando uma série de impasses. O que não concordo é que o cenário atual seja parecido. Tanto no governo de Fernando Henrique, quanto no de Lula, o governo pôde articular maiorias e o Congresso foi capaz de emendar e modificar as propostas que chegaram do Executivo, sobretudo na atual administração", afirmou o cientista político, para quem o voto distrital é uma falsa solução para problemas de governabilidade.

"O voto distrital pode forjar maiorias artificiais, alienando um grupo considerável de eleitores da representação. Ele está sob o fogo cerrado em todos os Países onde existe. No Reino Unido, o governo Tony Blair chegou a instalar uma comissão para discutir a implantação do voto proporcional. Nos Estados Unidos, há casos de distritos onde não há qualquer competição. No Brasil, em certos lugares, a oposição que se apresentasse para competir nos distritos estaria correndo risco de vida", afirmou Wanderley Guilherme.