Título: Conselho será campo de batalha
Autor: Thiago Vitale Jayme
Fonte: Valor Econômico, 27/01/2005, Legislação & Tributos, p. E1

O controle externo do Poder Judiciário nem nasceu e já tem que lutar contra adversários com o objetivo de sepultá-lo. O dispositivo foi aprovado pelo Congresso Nacional à revelia da maioria dos juízes do país, por força e influência do governo federal e dos presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal. Promulgada a reforma do Judiciário, as cortes de todas as regiões se movimentam para organizar e indicar nomes para compor o poderoso novo órgão. De um lado, o objetivo de parte considerável dos candidatos ao conselho é justamente o de impedir sua atuação como fiscalizador externo dos tribunais. De outro, a missão dos defensores do controle externo será evitar sua implosão por parte dos próprios integrantes do órgão. A primeira composição do conselho é fundamental. Será dessa turma a responsabilidade de regulamentá-lo. Se a maioria dos 15 integrantes do órgão forem resistentes ao controle externo, há meios de podá-lo por restrições regimentais. "A primeira composição é importante, pois ela dará a definição e mostrará qual será o perfil do Conselho Nacional de Justiça", diz Jobim. O Supremo indicará um ministro da corte, além de um desembargador e um juiz federais para o conselho. Ao STJ caberá nomear um de seus membros e mais um desembargador e um juiz estaduais. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) indicará um ministro da corte e mais um juiz de um Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e um juiz de primeira instância. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) terá dois assentos e o procurador-geral da República nomeará dois procuradores. Por fim, o Congresso escolherá duas pessoas. Até agora, apenas dois nomes foram escolhidos oficialmente para compor o conselho. O presidente do TST, ministro Vantuil Abdala, foi nomeado pelos colegas. O segundo nome indicado foi o de Antônio de Pádua Ribeiro, escolhido pelos ministros do STJ. O magistrado ocupará um cargo-chave dentro do conselho: será seu corregedor-geral. A indicação de Pádua Ribeiro já configura a primeira resistência ao controle externo dentro do conselho. Em artigos e palestras publicadas no livro "Reflexões Jurídicas", o ministro do STJ revela sua posição veemente contra essa atribuição do novo órgão. "Há remédios em que se utiliza veneno na sua fabricação. A questão é de dosagem. Em pequena quantidade, o veneno cura. Em quantidade inadequada, intoxica e até mesmo mata. O controle externo constitui remédio com excesso de veneno para o Judiciário. Ao invés de aperfeiçoá-lo, poderá matá-lo", escreveu Pádua. Procurado pelo Valor, o ministro manteve o mesmo posicionamento. "Sempre fui contra e repeti isso diversas vezes, e não tenho constrangimento em participar do conselho com integrantes estrangeiros ao Judiciário, mas não vou violentar os meus princípios", diz Pádua. Ele sempre foi favorável à criação do conselho, mas pelo seu modelo ideal os integrantes sairiam de dentro do Poder Judiciário. "O conselho foi criado para aperfeiçoar o Judiciário. A Justiça deve ser independente e não deve sofrer injunção", completa. O posicionamento desagrada e preocupa o governo federal, que não gostou da indicação de Pádua. Igual sentimento têm juristas favoráveis ao controle externo. Alguns deles, ouvidos pela reportagem, questionaram se Pádua, com posicionamento contrário à composição do conselho, não deveria ter recusado a indicação. O ministro, porém, defende com igual veemência o poder de punição do conselho. Perguntado se será contra o trabalho dos integrantes indicados pelo conselho, Pádua recuou. "Não posso ser contra, porque nem sei quem serão essas pessoas, só com o funcionamento do conselho teremos uma idéia de como ele funcionará." Três Tribunais Regionais Federais (TRFs) enviaram ao STJ listas com nomes de candidatos para compor o conselho, a pedido de Vidigal. O TRF da 1ª Região indicou cinco desembargadores - Jirair Menguerian, Mário César Ribeiro, Antônio Catão Alves, Carlos Mathias e Luciano Tolentino Amaral - e cinco juízes federais - Reynaldo Soares da Fonseca, Mônica Pacheco de Medeiros, Ricardo Machado Rabelo, Euler de Almeida Silva e Novély Vilanova Reis. As escolhas foram feitas por votação e os vencedores foram Menguerian e Soares da Fonseca. O TRF da 2ª Região indicou os desembargadores Paulo Barata, Julieta Lunz, Alberto Nogueira, Frederico Gueiros e Paulo Espírito Santo. O critério de escolha foi a antigüidade no tribunal. Carreira Alvim e Tânia Heine preferiram não se candidatar. O TRF da 4ª Região não fez votação. Indicou todos os sete desembargadores que manifestaram interesse em participar do conselho: Vladimir Passos de Freitas, Marga Inge Barth Tessler, Maria Lúcia Luz Leiria, Vilson Darós, Élcio Pinheiro de Castro, Amaury Chaves de Athayde e Álvaro Eduardo Junqueira. A resistência ao controle externo não é apenas de Pádua. Frederico Gueiros, indicado pelo TRF da 2ª Região, trabalhará para enfraquecer o controle externo. "Quero participar, sobretudo nessa fase inicial, para evitar que se forme um conselho politizado", diz. "Não entendo que seja um conselho criado para fazer o controle externo: ele não pode e não deve ser assim." O desembargador afirma querer trabalhar para "dar um rumo certo" ao órgão. Carlos Mathias, indicado pelo TRF da 1ª Região, evitou se posicionar sobre o controle externo. "O conselho já está criado, a etapa de debates sobre ele já passou", diz. E completou: "O conselho ainda é uma incógnita, vai ter que dizer a que veio, e acho que ele só deverá se ater a grandes temas".