Título: Cade julgará fusão e aquisição de banco
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 30/08/2007, Finanças, p. C7

Os bancos estão obrigados desde ontem pela Justiça a encaminhar as suas fusões e aquisições para julgamento no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília confirmou que cabe ao Cade a análise de processos de concentração econômica no Sistema Financeiro Nacional. A decisão foi tomada no julgamento da compra do banco BCN pelo Bradesco e fará com que o órgão antitruste inicie processos de cobrança de multas contra todos os bancos que não submeteram as suas fusões e aquisições para julgamento nos últimos cinco anos.

O procurador-geral do Cade, Arthur Badin, afirmou que o TRF confirmou a competência do Cade para julgar fusões de bancos e, com isso, o órgão antitruste irá entrar com processos contra bancos que deixaram de apresentar as suas fusões e aquisições desde abril de 2001, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinou parecer dizendo que cabe ao Banco Central, e não ao Cade, o julgamento de fusões entre os bancos.

"Agora, o Cade vai começar a multar os bancos que não apresentarem as suas operações", advertiu Badin.

As multas variam de R$ 6 mil a R$ 6 milhões. O valor aumenta dependendo do faturamento do banco. Como os bancos faturam bilhões de reais no Brasil, a expectativa é que o Cade peça multas mais próximas de R$ 6 milhões por cada operação de fusão ou de aquisição que não foi notificada nos últimos anos. Badin explicou que não é possível cobrar para além de cinco anos, pois este é o prazo de prescrição para essas ações.

O caso chegou ao TRF porque o Bradesco não notificou a compra do BCN ao Cade, que recorreu à Justiça. O Bradesco alegou ao TRF que a competência para regular o setor é do Banco Central, conforme estabelece a Lei do Sistema Financeiro (nº 4.595, de 1964). Ainda segundo o Bradesco, o parecer do ex-presidente FHC confirmou essa tese. Logo, seria o BC, e não o Cade quem analisaria as fusões e aquisições no setor.

Já o órgão antitruste argumentou que o BC possui duas funções de regulação no Sistema Financeiro Nacional. Primeiro, há a função de "regulação prudencial" pela se faz a proteção dos depositantes dos bancos. E, num segundo plano, há a "regulação sistêmica", pela qual o BC garante a estabilidade do sistema financeiro. "É possível que variáveis concorrenciais sejam usadas nas regulações prudencial e sistêmica", disse Arthur Badin.

Por isso, continuou ele, a Lei 4.595 atribui ao BC competências em matéria concorrencial. "Mas isso não significa que ela exclua a competência do Cade, no que tange à defesa da concorrência, nos casos em que não houver risco prudencial ou sistêmico", concluiu o procurador.

A relatora do processo, desembargadora Selene Maria de Almeida, foi a favor do Bradesco, quando a votação teve início, há duas semanas. Mas, o desembargador Fagundes de Deus pediu vista do processo e ontem levou um voto favorável ao Cade. O desembargador João Batista Moreira concluiu que o Bradesco deveria ter notificado o Cade sobre a compra do BCN e, com isso, fechou o julgamento em dois votos a um a favor do órgão antitruste.

Badin ressaltou que a decisão reafirma a independência do Cade frente ao Poder Executivo, pois indica que não é necessário os conselheiros seguirem o parecer do presidente da República. Assim, que o então presidente FHC assinou o parecer, o presidente do Cade na época, João Grandino Rodas, passou a segui-lo sob a alegação de que tratava-se de um parecer normativo do presidente da República.

Rodas deixou o Cade em meados de 2004 e a sua sucessora, a atual presidente do órgão antitruste, Elizabeth Farina, teve outra orientação. Farina passou a defender o julgamento de fusões bancárias pelo Cade. Agora, a posição de Farina foi confirmada pelo TRF.

A decisão do TRF surge no momento em que o Congresso discute um projeto de lei com novas regras para o julgamento de fusões bancárias. Pelo projeto, caberá ao Cade analisar fusões bancárias que não implicarem em "risco sistêmico" aos bancos.

Ou seja, o Cade julgará as fusões consideradas simples, nas quais não há o risco de os depositantes iniciarem uma corrida para sacarem o seu dinheiro do banco. E o BC ficará com processos mais complexos, em que há este "risco sistêmico". O texto é discutido desde o início do primeiro mandato do presidente Lula e até hoje não foi votado.