Título: Crédito externo fica mais escasso
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 10/09/2007, Finanças, p. C1

A crise de liquidez nos Estados Unidos e Europa acabou com o excesso de linhas de crédito à exportação antes disponível no mercado para o Brasil. Já os recursos externos para capital de giro se tornaram realmente escassos. Ao mesmo tempo, a demanda pelo crédito externo para comércio exterior cresceu, apesar do aumento dos prêmios de risco cobrados das empresas. Para bancos pequenos até chegou a faltar linha de curto prazo à exportação - Adiantamento sobre Contrato de Câmbio (ACC) e Adiantamento sobre Cambiais Entregues (ACE) - durante toda a fase mais aguda da crise, em meados de agosto.

"As linhas externas estão mais escassas; não há mais aquela oferta abundante", diz o diretor do Bradesco, José Guilherme Lembi de Faria. "O financiamento ao comércio exterior voltou a ser mais barato do que tomar recursos em reais e, por isso, a demanda cresceu por parte das empresas", completa Fernando Beda, diretor do Itaú BBA. Com demanda maior e oferta menor, não há mais sobra de linhas no mercado. "O dólar e o cupom cambial subiram, criando diversas oportunidades pontuais de arbitragem", explica Ernesto Meyer, coordenador de financiamento para aquisições e operações sindicalizadas para a América Latina do BNP Paribas.

O cupom cambial é o rendimento para investimentos em dólar no mercado interno brasileiro. Se ele está mais alto do que o custo de captação da empresa no exterior, compensa tomar o dinheiro por meio de crédito à exportação e aplicar no mercado interno, ganhando a diferença nos juros e sem correr risco cambial, nas chamadas operações de arbitragem.

O cupom cambial, que vinha em níveis sempre abaixo de 6,5% ao ano antes da crise, chegou a bater no auge do pânico em agosto nos 9% para os contratos de vencimento em julho de 2012. A Libor (taxa de juros no mercado entre bancos de Londres) de um ano estava a 5,16% ao ano no mesmo período. A Libor de mais longo prazo estava ainda mais baixa. Mesmo se o prêmio de risco de crédito pago pelas empresas brasileiras tivesse dobrado e passado de 65 pontos básicos antes da crise para 130 pontos para cinco anos, a diferença ainda seria de 2,54%. Ou seja, a empresa tomaria recursos a Libor mais 1,30 ponto básico, ou 6,46%, e ganharia 9% aplicando os recursos no mercado interno. Ganharia também receita de exportação vendendo seu dólar quando a cotação foi parar nos R$ 2,0940.

É verdade que desde então o cupom cambial caiu, ficando mais perto dos 6,75% ou 7% ao ano. Mas, ainda não voltou aos níveis pré-crise. Já a Libor subiu, justamente por causa do aperto no crédito internacional. A Libor de um ano passou de 5,16% em meados de agosto para 5,28%. A diferença entre o custo de captação das empresas no exterior e o cupom cambial se reduziu, mas continua a existir, mesmo considerando-se a CPMF e outros custos fiscais. Mesmo para quem não quer arbitrar e precisa efetivamente dos recursos, ainda está mais barato tomar linha de crédito à exportação do que recursos no mercado interno. Não é à toa que a demanda aumentou.

A oferta, no entanto, não acompanhou. Bancos estrangeiros cautelosos com a crise de liquidez nos Estados Unidos e Europa resolveram adotar mais parcimônia na concessão de crédito. As linhas para capital de giro externas ainda estão bastante escassas, com maior seletividade nas ofertas. As linhas para exportação, que foram seriamente limitadas no auge da crise, voltaram, mas sem as sobras anteriores.

Em meados de agosto, bancos chegaram a estabelecer limites de US$ 10 milhões para o crédito à exportação por clientes, mesmo os de primeira linha, e ofereceram prazos de no máximo seis meses. Outros estrangeiros mais cautelosos simplesmente deixaram de participar do mercado e não ofertavam linhas. Mas, agora, o mercado voltou à normalidade, com mais disponibilidade de recursos à exportação.

"Os bancos centrais da Europa e Estados Unidos deram respostas rápidas e injetaram liquidez no mercado", diz o diretor de comércio exterior do Banco do Brasil, Nilo Panazzolo. "Mas, a volatilidade no câmbio deve persistir por mais um tempo no mercado", acredita ele. O diretor do Bradesco concorda. "A volatilidade vai perdurar por mais algumas semanas", diz Lembi de Faria. Segundo ele, há um movimento de fuga para a qualidade e de seletividade no crédito que não vai acabar tão já.

O aumento nos prêmios de risco cobrados dos tomadores parece que veio para ficar. Em relação a níveis anteriores, uma empresa de primeira linha paga prêmios de risco de 5 a 10 pontos básicos mais altos para prazos de vencimento em um ano quando se trata do financiamento ao comércio anterior. Nas linhas para capital de giro, o aumento chegou a 20 pontos básicos.