Título: Unanimidade na decisão do Copom é bem-vinda
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Fonte: Valor Econômico, 10/09/2007, Opinião, p. A12

Em uma decisão amplamente antecipada pelo mercado financeiro, com corte de apenas 0,25 ponto percentual na taxa básica de juros, para 11,25% ao ano, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central exibiu uma bem-vinda unanimidade entre os seus integrantes, o que não acontecia desde o encontro de março.

Há ocasiões em que o processo decisório é tão ou mais importante do que a decisão em si. O país sofre os efeitos de uma crise internacional de dimensões até agora desconhecidas. Há incertezas relevantes no campo inflacionário, ainda que aparentemente de curto prazo. A coesão do BC é fundamental para tranqüilizar os agentes econômicos. O jornalista Bob Woodward, do "Washington Post", relata em seu livro "Maestro" como em algumas oportunidades o ex-presidente do Federal Reserve, Alan Greenspan, agiu nos bastidores para costurar decisões unânimes do Fomc (na sigla em inglês, Comitê Federal de Mercado Aberto, o equivalente nos EUA ao nosso Copom).

Diferentemente dos Estados Unidos, onde os entendimentos são feitos em encontros informais, a tradição no Brasil é da busca de consensos nas reuniões. Isso não foi impedimento para que, nos três encontros que ocorreram entre abril e julho, o Copom se dividisse. E não há nada de errado com isso, já que o debate é exatamente o que se espera de um órgão colegiado. A divergência dentro do Copom não foi a respeito da direção da política de juros, mas sobre a intensidade. Todos concordavam que havia espaço para mais estímulos monetários. Um grupo de diretores do BC, que saiu vencedor em duas das três reuniões do período, defendia que era possível avançar um pouco mais rápido, com cortes de 0,5 pp. O outro grupo, que saiu vencedor em uma reunião, advogava cortes mais lentos, de 0,25 pp.

A ala mais conservadora alertava que os juros caíram consideravelmente nos últimos dois anos (com a decisão da semana passada, a queda acumulada é de 8,5 pontos percentuais) e que eram incertos os efeitos desses estímulos monetários sobre a atividade econômica e inflação. Por isso, pregavam maior cautela nas decisões. As fileiras menos conservadoras identificavam uma mudança estrutural da economia, que permitiria ao país crescer mais sem acelerar a inflação. Os fortes investimentos e as importações, advogavam esse membros, estariam contribuindo para ao mesmo tempo suprir a demanda interna e para ampliar a capacidade de oferta da economia.

O cenário, porém, se tornou um pouco mais confuso desde agosto. A crise mundial, causada pelo receio de perdas disseminadas no mercado americano de hipotecas de alto risco, suscitou dúvidas sobre em qual patamar a taxa de câmbio irá se estabilizar e, consequentemente, sobre a real contribuição que as importações poderão dar para atender à demanda interna. Além disso, os índices de inflação foram maiores do que o esperado, como o IGP-DI de 1,39% em agosto. Mas o consenso indica que a pressão inflacionária não passa de repique, provocado por choques de oferta, como dos alimentos, que tendem a se reverter mais adiante.

Embora o entendimento fosse de que estamos diante de fenômenos temporários, parte dos analistas econômicos passou a admitir, às vésperas da reunião do Copom, que as incertezas eram motivo suficiente para levar o grupo mais conservador do BC a defender a suspensão nos cortes na taxa básica de juros. Nesse contexto, mostra-se correta a decisão unânime do Copom por um corte de 0,25 ponto, com a indicação de que irá aguardar os próximos acontecimentos, incluindo um possível corte de juros pelo Fed em setembro, para decidir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.

Não havia ambiente para que a ala menos conservadora insistisse na manutenção do ritmo de corte de 0,5 ponto. Se agisse assim, revelaria uma displicente indiferença com o atual quadro de incertezas - as quais, mesmo que se confirmem transitórias, podem ter efeitos permanentes nas expectativas inflacionárias. De outro lado, o apoio dos integrantes mais conservadores do Copom a um corte de 0,25 ponto ajuda a tranqüilizar os agentes econômicos. Dessa forma, sinalizam que vêem o ambiente de incerteza como apenas temporário e reafirmam o entendimento de que há muito espaço para cortes adicionais de juros que façam as taxas vigentes no país convergirem para padrões civilizados.