Título: Incerteza jurídica inibe troca partidária
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 10/09/2007, Política, p. A10

A ameaça de sanções legais refreia a troca de partidos às vésperas do fim do prazo legal de filiação para quem quer disputar as eleições municipais de 2008. Pela regulamentação divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a data limite é 5 de outubro. Ao contrário do que ocorreu em 2003, quando 36 deputados federais trocaram de partido entre junho e agosto daquele ano com vistas às eleições seguintes, desta vez houve apenas nove trocas no período.

Desde março deste ano, o TSE firmou entendimento de que o mandato parlamentar pertence ao partido, e não ao deputado, o que abre espaço para que os parlamentares que tenham trocado de partido sejam cassados. PSDB, PPS e DEM imediatamente entraram com pedidos no Supremo Tribunal Federal (STF) para punir seus infiéis e empossar o suplente. Os ministros Celso de Melo e Eros Grau negaram as liminares, mas o mérito da decisão do TSE ainda será julgado.

Precedentes recentes, como o estabelecimento da verticalização das coligações e a eliminação da cláusula de barreira, fazem com que a possibilidade de a Justiça Eleitoral mais uma vez inovar no setor seja vista como concreta.

"Como o Congresso não tem tido nos últimos anos capacidade decisória para legislar sobre eleições, o Judiciário está cada vez mais assumindo este papel", afirmou o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), um dos coordenadores tucanos das negociações para a eleição de 2008. Mesmo com poucas chances de aprovação neste mês, o projeto da Câmara que restringe o prazo para trocas de sigla pode reforçar esta tendência para a eleição de 2010. "Se o projeto for aprovado, a troca estará cada vez mais coibida. Há uma tendência clara neste sentido", disse o presidente nacional do PMDB, Michel Temer (SP).

Neste ano, as mudanças partidárias de maior impacto para a eleição de 2008 passaram longe da Câmara dos Deputados ou do Senado e ocorreram há alguns meses. Dois prefeitos de capital trocaram de partido: O PTB em Alagoas ficou pequeno para abrigar o ex-presidente e senador Fernando Collor, o prefeito de Maceió, Cícero Almeida, e seu padrinho político, o empresário João Lyra. Cícero e Lyra procuraram demarcar seus próprios grupos partidários. Cícero abandonou o PTB e ingressou no PP, no começo do ano. A vice-prefeita Lourdinha Lyra, filha de João Lyra, foi para o DEM.

João Henrique, em Salvador, deixou o PDT, onde mantinha uma incômoda aliança com os tucanos, para se aproximar do novo eixo de poder baiano, formado pelo governador Jaques Wagner (PT) e pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB). O prefeito manobrou sem sucesso para entrar no PT e terminou no PMDB, ainda no primeiro semestre.

Nas últimas semanas, os movimentos de maior impacto foram de personalidades sem mandato eletivo. Ainda na Bahia, o radialista Raimundo Varela, sempre cotado para disputar a eleição municipal em Salvador, migrou do micropartido PTC para o PRB, um nanico com potencial, já que conta com o respaldo da Igreja Universal e do vice-presidente José Alencar. Varela poderá disputar o espólio carlista com o candidato do DEM, onde a indicação é disputada pelos deputados ACM Neto e José Carlos Aleluia.

A reta final de filiações também deve mudar o quadro eleitoral em Manaus, onde o ex-governador Amazonino Mendes - um veterano em trocas partidárias - saiu do DEM e deve ingressar no PTB nos próximos dias. Amazonino perdeu a eleição de 2006 para o governo estadual e de 2004 para a prefeitura da capital.

Nos Estados do Sul e do Sudeste, o rol de novidades é ainda mais estreito. Em Curitiba, o reitor da Universidade Federal do Paraná, Carlos Moreira Júnior, tentará conseguir, com o apoio do governador paranaense Roberto Requião, a candidatura para a Prefeitura de Curitiba pelo PMDB. O cenário é adverso para o neo-pemedebista: o partido tem adversários fortes, como o prefeito Beto Richa (PSDB) e Gleise Hoffmann (PT) e alternativas internas mais populares, como o ex-prefeito Rafael Grecca.

Em São Paulo, sem espaço no DEM - monopolizado pelo prefeito Gilberto Kassab - o senador Romeu Tuma ameaça sair da sigla para ingressar no PRB, mas o movimento poderia colocar em jogo a sua reeleição ao Senado em 2010 para concorrer com chances muito escassas à prefeitura.

O próprio senador não esconde sua insatisfação dentro da sigla e entre os aliados diretos de Kassab dentro do DEM paulista, a expectativa é que a saída se consume. A garantia de uma vaga para renovar o mandato parlamentar é a concessão máxima que o grupo do prefeito se dispõe a fazer. Há algumas semanas, esteve com o ex-governador paulista e possível candidato à prefeitura pelo PSDB, Geraldo Alckmin, para discutir seu futuro partidário. Sua proximidade com a esfera governista, contudo, poderá aumentar após a nomeação do filho, o ex-deputado estadual e delegado Romeu Tuma Júnior, do PMDB, para a Secretaria Nacional de Justiça.