Título: Chinesa Chery inicia produção pré-série
Autor: Rocha, Janes
Fonte: Valor Econômico, 11/09/2007, Empresas, p. B1

A montadora chinesa Chery pretende desembarcar seus primeiros automóveis nos mercados brasileiro e argentino no início de 2009. Será o primeiro carro chinês fabricado e vendido no Mercosul onde até agora só chegam importados daquele país. O veículo, chamado Tiggo, um utilitário 4x4, está em testes na fábrica da Chery em Montevidéu, Uruguai, conforme explicou ao Valor o diretor de Relações Institucionais da Chery Mercosul, Oscar Ramos.

"Neste momento estamos produzindo apenas algumas unidades de pré-série, que se utiliza para testar o desenvolvimento do modelo, dos fornecedores e do movimento da produção. Mas a produção propriamente dita começa a partir de dezembro deste ano ou janeiro de 2008", disse Ramos, um uruguaio que morou e trabalhou no Brasil nos anos 70 como consultor.

A Chery Mercosul é uma subsidiária da Chery Automobiles Co., a maior montadora de controle provincial da China. É uma sociedade de 51% a 49% com o grupo argentino Socma, do empresário Franco Macri, que por sua vez divide a participação na mesma proporção com o grupo uruguaio Oferol. Os argentinos e uruguaios ficaram com a responsabilidade de financiar o empreendimento - cujo investimento está estimado em US$ 100 milhões - e pela comercialização dos carros nas redes de concessionárias.

A Chery tem a gestão e a parte operacional. Os chineses se instalaram no Uruguai dentro das regras do regime automotivo do Mercosul, que tem condições especiais de incentivo ao comércio de veículos entre os quatro países do bloco (Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai) e barreiras aos estrangeiros extra-bloco. Mas o alvo são os mercados brasileiro e argentino, como o diretor do projeto Mercosul da Chery, Yin Tongyue, já havia antecipado ao Valor em novembro de 2006, e agora confirmado por Ramos. "Os primeiros carros serão exportados em 2009", disse o executivo.

Enquanto o mercado de automóveis brasileiro é de 2 milhões de unidades e o Argentino, de 500 mil, o Uruguai tem uma frota de apenas 16 mil, 60% dos quais são importados do Brasil. Carga tributária e custos de mão-de-obra mais baixos explicam o interesse dos chineses em produzir localmente para exportação.

A Chery está ocupando parte de uma fábrica instalada no município de Canelones, encostado na capital uruguaia - 16 km do centro por uma das estrada que levam ao aeroporto. Esta planta pertence aos grupos Macri e Oferol e foi onde, por 15 anos, a empresa do ramo automotivo dos Macri, a Sevel, fabricou sob licença os automóveis da marca Fiat que eram vendidos na Argentina e no Uruguai.

Em 1997, Macri perdeu a concessão da marca italiana, que decidiu centralizar sua produção na fábrica de Betim, em Minas Gerais. Agora, a Fiat decidiu voltar a produzir na Argentina, em sociedade com a indiana Tata Motors, mas para isso vai utilizar sua própria fábrica, em Córdoba.

De 1998 a 2002, a unidade passou a fabricar carros modelo Peugeot-Citröen em um acordo fechado com o Oferol. Com a crise que levou as economias dos dois países à lona, a Peugeot encerrou o contrato e deixou o Uruguai. Segundo Ramos, durante todos estes anos, a planta de Canelones - que tem capacidade para produzir 10 mil automóveis - foi mantida praticamente fechada (fazia alguns blindados e triciclos), à espera de um melhor momento para a retomada. A oportunidade apareceu no ano passado, com a Chery. Se o projeto funcionar, a Chery Mercosul já tem pronto uma segunda etapa, em que a produção poderá chegar aos 25 mil automóveis e empregar 1.200 pessoas.

O projeto prevê a fabricação de cinco mil Tiggo no primeiro ano (2008), sete mil no segundo e 12 mil no terceiro. O terreno abriga um complexo de galpões, com aparência de mal conservado. A não ser por uma terça parte do edifício que está ocupada e iluminada, o resto da planta parece abandonado, não há placas de identificação, nem iluminação.

A pintura branca desgastada e suja na maior parte, tem duas listas amarelas e azuis, cores que se vê nos prédios das concessionárias Fiat. Uma grande placa foi retirada mas ficou sua estrutura. Ramos disse que em cerca de dez dias, começam os trabalhos de limpeza, repintura da fachada e colocação de uma placa. A idéia é fazer uma grande festa de inauguração no fim do ano, para a qual será convidado o presidente Tabaré Vazquez e todos os seus ministros.

Os chineses terão de cumprir com um conteúdo local, conforme as regras do Mercosul, mínimo de 60% em três anos, comprando peças e partes na região. No entanto, até agora não fecharam contrato de fornecimento com nenhuma indústria uruguaia de autopeças, garantiu Sebastián Giraldes, secretário executivo da Câmara de Autopeças do país, que reúne 30 empresas. "Já tivemos contatos mas até agora não contrataram ninguém".

Da programação de contratar 400 funcionários, 20% já foram cumpridos. Marcelo Abdala, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos do Uruguai, disse que há um acordo, assinado com a Oferol em 2003, de que as novas contratações deveriam priorizar os 200 demitidos da Peugeot-Citroën naquela época, que não estivessem recolocados no mercado de trabalho.

A chegada da Chery trouxe a perspectiva de uma ressurreição da indústria automobilística no Uruguay, depois de ter praticamente sumido com a crise de 2002, deixando ociosa uma estrutura instalada nos anos 60 e 70 para produzir até 50 mil carros. Segundo a imprensa local, além dos chineses, uma empresa uruguaia, a Nordex, mantém negociação com a Ford da Argentina para voltar a produzir veículos no país e algumas companhias japonesas procuraram o ministro da Economia, Danilo Astori, para dizer que têm intenção de se instalar. Mas por enquanto não há nada concreto.