Título: Fed alerta para extensão da crise
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 11/09/2007, financeiro, p. C1

O presidente do Federal Reserve (Fed, banco central americano), Ben Bernanke, alertou ontem os outros grandes bancos centrais que há probabilidade de as turbulências nos mercados financeiros repercutirem na economia real nos Estados Unidos, com impacto no resto do mundo.

Por sua vez, o presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles, disse que "ninguém sairá imune" em caso de agravamento da crise nos EUA, mas insistiu que a avaliação preponderante entre os banqueiros que se reuniram em Basiléia é a confiança na expansão global.

Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu (BCE), foi quem relatou o aviso do Fed, e acha também que o "período de ouro" da economia global não terminou, inclusive graças aos emergentes. Mas pediu a todos os bancos centrais a "agirem" para evitar o aprofundamento da crise. Um mês de crise nos mercados forçou os bancos centrais a injetarem mais de US$ 400 bilhões de fundos de emergência para os bancos. Diante do sumiço do crédito causar estragos imediatos na expansão econômica, os BCs da Europa, Grã-Bretanha, Canadá, Japão, Austrália e Coréia do Sul voltaram atrás nos planos de aumentar as taxas de juros, na semana passada.

O presidente do BC do México, Guillermo Ortiz, mostrou-se especialmente pessimista. Para ele, parece não ter dúvidas de que, quando os EUA espirram, o resto do mundo pega um resfriado e a América Latina uma gripe. "Há muita esperança de que desta vez haverá impacto menor nos emergentes em decorrência de uma desaceleração dos EUA, mas tenho minhas dúvidas", afirmou.

"Claro que a economia da América Latina vai crescer menos, e dependendo da profundidade (da desaceleração nos EUA), terá problemas pela frente." A chefe dos mercados emergentes do Deutsche Bank, Maria Laura Lanzeni, nota que os emergentes estão sólidos, mostram resistência e não foram a origem da crise. Mas constata que a América Latina, em particular, já está crescendo menos. As estimativas do banco apontam queda do crescimento econômico em todas as grandes economias da região. Somente o México expandirá menos que o Brasil.

Os principais banqueiros centrais se reúnem quase a cada dois meses, para examinar o estado da economia global. Desta vez, a reunião foi especialmente importante por causa da turbulência financeira. O presidente do Fed, Ben Benanke, também apareceu, o que é raro. Chamou a atenção pela calma. Andou lentamente entre os duzentos metros separando o hotel do banco, enquanto outros banqueiros quase corriam.

Quando Trichet, do BCE, entrou na sala de imprensa do BIS para contar as conclusões do encontro, deu um suspiro de resignação. Lembrou que falou há dois, quatro, seis, oito meses sempre sobre a subavaliação de riscos preocupante nas finanças internacionais. Agora, disse que está havendo uma correção, com aumento de spreads, dos riscos, maior volatilidade. E quando o mercado embarca nisso, há comportamento errático e correções exageradas.

A avaliação dos banqueiros centrais é de que a economia mundial continua saudável - pelo menos até o momento. A desaceleração nos EUA convive com emergentes da Ásia crescendo a taxas vigorosas, lideradas pela China e Índia, a economia do Japão com crescimento moderado e a Europa no seu padrão com desempenho positivo. As outras regiões, particularmente a América Latina, estão com crescimento elevado.

Mas os banqueiros insistiram que os BCs têm que redobrar a vigilância, particularmente o Fed, para monitorar os riscos de que os problemas de créditos "subprime", que já atinge outros segmentos dos mercados de crédito, venham a ter impacto maior no processo de intermediação financeira dos EUA, com efeito mais sério na economia americana e conseqüências para o resto do mundo. "Esse não é o cenário mais provável, pela avaliação predominante dos banqueiros, mas que não se pode desconsiderar e todos vão redobrar a vigilância", afirmou Meirelles.

Os banqueiros concluíram que crises anteriores serviram de lições importantes que foram aprendidas e implementadas, sobretudo pelos emergentes. Ao contrário de crises anteriores, desta vez os emergentes não são fonte de instabilidade, e sim de estabilização, afirmou Meirelles.

Todas as atenções estão voltadas para os EUA. Até recentemente, a economia global mostrava-se imune à desaceleração nos EUA e as estimativas de expansão eram de 5%. Agora, as turbulências se propagaram para os consumidores americanos. Os gastos de consumo, 70% da economia do país, cresceram 1,4% no segundo trimestre, menor taxa em um ano.