Título: Escassez de trigo aquece demanda por mandioca
Autor: Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 12/09/2007, Agronegócios, p. B14

A escassez de trigo no mercado internacional, provocada pela quebra de safra em importantes produtores, como Canadá, Austrália e Europa, está estimulando as vendas de amido de mandioca, substituto direto do cereal nos alimentos. No Brasil, as fecularias planejam expansões e estão arrendando terras, com contrato fechado com agricultores, para garantir matéria-prima e ampliar a industrialização do tubérculo.

Com a forte demanda doméstica e externa, afirmam especialistas ouvidos pelo Valor, a cultura, normalmente pouco badalada, ganhou importância. A expectativa é que dez novas unidades de processamento entrem em operação em 2008, com investimentos totais estimados em R$ 80 milhões, segundo Ivo Pierin Júnior, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Amido de Mandioca (Abam).

Com a maior procura, os preços do produto estão em alta desde o ano passado. A tonelada da mandioca está cotada em cerca de R$ 140, 85% acima de igual período do ano passado. A fécula (ou amido) segue o mesmo movimento e hoje é negociada a R$ 800, com valorização de 38% em 12 meses, segundo pesquisa do Centro de Pesquisas Avançadas em Economia Aplicada (Cepea).

No mercado internacional, a valorização da fécula atinge de 112% na bolsa de Bangoc (Tailândia). Embora não lidere a produção mundial, a Tailândia é o maior negociador de mandioca e derivados em escala industrial. Atualmente, a tonelada da fécula na bolsa tailandesa está em US$ 340. "Mas os preços para 2008 apontam entre US$ 380 e US$ 400 a tonelada", observa Fábio Isaias Felipe, pesquisador do Cepea, um dos poucos analistas deste segmento no país.

"As indústrias estão arrendando terras e sublocando-as para os produtores plantarem mandioca. Essa é uma maneira que encontramos para ter a garantia do produto", afirma Pierin, que também é proprietário da Podium Alimentos, em Tamboara, noroeste do Paraná.

A expansão de terras para o plantio de mandioca ocorre em um momento em que terras brasileiras são disputadas pela cana-de-açúcar. No Paraná não é diferente. Além da concorrência com a cana, a mandioca também briga por espaço com os grãos. "Estamos pagando mais caro pelas terras arrendadas", confirma João Eduardo Pasquini, presidente da Amido Pasquini, de Nova Esperança (PR).

Dados do IBGE mostram que o plantio de mandioca ocupou 1,938 milhão de hectares em 2007, aumento de 2% sobre o ano passado (1,901 milhão de hectares).

"O etanol mexeu com todos os mercados. Não há área agrícola que não seja disputada para expansão", diz Pasquini. O desequilíbrio entre a oferta e de demanda do trigo trouxe novos ventos para a área de fécula, que nos últimos anos busca alternativas para expandir seus negócios no país. As exportações avançam. Em junho, os embarques de fécula subiram 75% em relação ao mesmo mês de 2006 e alcançaram 1.031 toneladas. Em julho foram 1.053 toneladas, mesmo nível de julho do ano passado.

O atual movimento de expansão do segmento começou a ser ensaiado em 20006, em virtude do projeto de lei (nº 4.679/01) que obriga a mistura de amido de mandioca em produtos de panificação. Depois de inúmeras emendas e críticas, sobretudo dos moinhos de trigo, as fecularias estão fazendo a adição do amido da mandioca em produtos comprados pelo governo e que são distribuídos na merenda escolar, diz Pierin. Isso gera uma demanda de cerca de 200 mil toneladas de fécula no mercado interno. Originalmente, o projeto previa a adição de 10% em toda a farinha de trigo.

Produtor de mandioca há 30 anos, Jair Ricken ecoa a euforia do ramo. "Os preços pagos pela mandioca têm compensado os investimentos". O custo de produção está em torno de R$ 100 por tonelada. Ricken planta em uma área de quase 200 hectares. Ricken também sublocou uma área arrendada pela Amidos Yamakawa, de Amaporã (PR).

Para atender à demanda, a Amido Yamakawa está dobrando sua área plantada com mandioca e firmando parceria com produtores, que inclui Ricken, para ter a garantia do produto. Olga Yamakawa, diretora da fecularia, diz que deverá expandir a atual capacidade de produção da indústria de 450 toneladas/dia para 600. Neste ano, a área plantada com mandioca na empresa está em 800 alqueires (1936 hectares), o dobro de 2006.