Título: PT alargou placar pela cassação no Conselho
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 06/09/2007, Política, p. A7

O Conselho de Ética do Senado impôs ontem uma derrota acachapante ao senador Renan Calheiros. Por 11 votos a 4, seus 15 integrantes decidiram recomendar a cassação do mandato do presidente do Senado, por quebra do decoro parlamentar. A Comissão de Constituição e Justiça avalizou juridicamente a decisão. A expectativa de Renan e de seus aliados era a de um placar menos dilatado: 9 a 6, na pior das hipóteses. O PT fez a diferença: pelo menos dois de seus três representantes votaram de maneira contrária à esperada por Renan. No plenário, que deve votar a cassação dia 15, o partido será decisivo para selar a sorte de Renan. A hipótese da renúncia ao cargo só será cogitada pelos aliados se esse for o preço a ser pago para Renan salvar o mandato.

O presidente do Senado e seus aliados contam com o voto secreto, no plenário, para tentar reverter a decisão. No cálculo mais pessimista de Renan, ele contaria ainda agora com o apoio seguro de 42 senadores; na mais otimista, 50. Ele foi eleito para a presidência do Senado com 51 votos. Numa votação em que se prevê uma partidarização maior do que foi a eleição, o PT, com seus 12 senadores, deve se tornar o fiel da balança. Em reunião na véspera da sessão, a líder Ideli Salvati (SC) disse que não havia como determinar um voto à bancada. "Cada um vai votar de acordo com sua consciência".

A liberação da bancada foi entendida por alguns setores como se o governo houvesse abandonado Renan. Por enquanto, o pemedebista continua majoritário no PT, mas senadores do partido já detectaram o enfraquecimento progressivo da posição do presidente do Senado na bancada - o próprio Renan reconhece que o tempo joga contra seus interesses. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuda o aliado com discrição, sem comprometimento público. A nomeação do ex-deputado Robson Tuma, filho do senador Romeu Tuma (DEM-SP), para a Secretaria Nacional de Justiça, é contabilizada nessa categoria. Mas Lula é evasivo em relação ao julgamento.

"Acho que está sendo julgado onde precisa ser julgado, dentro do Congresso Nacional e dentro do Senado", disse o presidente. "Eu acho que as regras que foram estabelecidas pela sociedade brasileira valem ontem, hoje e valem amanhã. Portanto, todos nós estamos subordinados a essas regras que nós mesmos criamos". Questionado se o julgamento de alguma forma atrapalha o governo, Lula insistiu que "é um problema do Congresso Nacional". Segundo o presidente, há uma acusação, "Renan tem mostrado as provas. Essa prova é analisada dentro da Comissão de Ética, dentro da Comissão de Justiça e dentro do plenário e vamos ver a decisão".

Na eventual condenação de Renan, o Planalto perde um aliado exigente, mas em geral dedicado, e é improvável que venha a ter dificuldades com o PMDB maiores que já tem - o partido está acomodado no ministério e no primeiro escalão. O problema para Lula é que, se a oposição for capaz de conseguir os 41 votos necessários para cassar o presidente do Senado, pode se julgar habilitada a também eleger o seu sucessor, seja por intermédio de um de seus representantes ou por meio de um pemedebista de oposição, caso, por exemplo, do senador Jarbas Vasconcelos (PE). Mas senadores que ontem votaram contra Renan, como Renato Casagrande (PSB-ES), dizem que seu voto no Conselho de Ética "é de consciência e nada tem a ver com a disputa base aliada-oposição".

Ao contrário de sessões anteriores, realizadas em clima tenso e com insultos entre os senadores, a reunião decisiva do Conselho de Ética transcorreu tranqüila. Nem mesmo o voto em separado do senador Wellington Salgado (PMDB-MG), com acusações contra dois dos relatores do processo, foi capaz de tumultuar o ambiente. "Se mentira é quebra de decoro, o relatório (dos dois senadores que acataram a denúncia contra Renan) é quebra de decoro da própria relatoria", investiu Salgado. Marisa Serrano (PSDB-MS) e Renato Casagrande (PSB-ES) se limitaram a responder que fizeram um julgamento técnico e que uma questão de consciência não poderia ser encarada como uma "questão de mentira ou de deslealdade".

Na essência, Serrano e Casagrande julgaram que Renan mentiu para o Senado, tanto nas explicações que deu para a origem de recursos para pagar despesas pessoais, quanto sobre seu relacionamento com o lobista de uma grande empreiteira, a quem recorreu para intermediar o pagamento dessas despesas. Em relação ao dinheiro, segundo os relatores, a conta não fechou e Renan tentou se explicar com um empréstimo que não foi declarado ao fisco. Sobre o lobista, um amigo de longa data, segundo Renan, os dois relatores associaram uma emenda parlamentar feita pelo senador à liberação de R$ 15 milhões à empreiteira, por meio de uma medida provisória assinada pelo presidente Lula. A simples relação de Renan com o lobista foi considerada imprópria e suficiente para caracterizar a quebra do decoro. (Colaborou Paulo de Tarso Lyra)