Título: Iniciativa coloca ainda mais pressão sobre as empresas, diz professor
Autor: Assis Moreira De Davos
Fonte: Valor Econômico, 28/01/2005, Internacional/Especial, p. A

Leia a entrevista com o presidente do grupo anticorrupção da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o professor suíço Mark Pieth. Valor: Essa iniciativa anti-corrupção em Davos não é mais relações públicas paras as empresas? Mark Pieth: Essa iniciativa coloca pressão sobre elas. Elas têm de cuidar de sua reputação. Há mudanças no comportamento de empresas. Se esse pacto está na primeira página de jornais é porque reflete a preocupação de executivos com o pagamento de suborno. Veja o que ocorreu com a Statoil, a empresa norueguesa de petróleo: seu presidente admitiu que era necessário pagar US$ 20 milhões ao filho do presidente do Irã para entrar naquele mercado. Em duas semanas, o valor da empresa perdeu US$ 1,5 bilhão e o executivo foi demitido. Os acionistas estão mais cuidadosos. Valor: Como geralmente é vista a situação da corrupção no Brasil? Pieth: O problema não é com as empresas que fazem negócios no exterior, mas com o que se passa dentro do país. No meu instituto na Universidade de Basiléia, somos "facilitadores" de grupos de empresas que discutem como prevenir suborno. Elas podem se confrontar nesse grupo. O assunto é delicado, mas ouvi de vários setores, sobretudo de equipamentos pesados, que em importante Estado no Brasil elas enfrentam dificuldades porque há funcionários que pedem pagamento para o caixa do partido, em troca de contrato. Para a OCDE, isso é corrupção. Valor: Qual o caso especifico? Pieth: É o de uma barragem num importante Estado. O responsável dos contratos cobrou pagamento de alguns milhões de dólares. Havia várias companhias concorrendo e uma pagou. É um caso recente, dos últimos dois anos. Não acuso ninguém, digo apenas que as companhias nos deram exemplos e um deles foi esse da barragem. Valor: A empresa é de que pais? Pieth: Só posso dizer que no grupo há empresas americanas, européias e japonesas, todas muito grandes. As companhias nos dizem que não podem quase fazer negócios no Brasil nessa área porque são expostas a demanda de suborno. E se isso se sabe na polícia ou Justiça na Alemanha, EUA, Japão, Suécia, o executivo pode ir à prisão e a empresa pode ser multada em milhões. Valor: Mas as empresas em países industrializados podiam descontar dos impostos os pagamentos de subornos que faziam. Pieth: Isso não é mais possível. Até há quatro anos isso acontecia, mas não é mais permitido. Hoje, há muitos riscos depois de iniciativas anticorrupção da OCDE. No caso do Brasil, as empresas estão num grande dilema. Elas consideram extremamente difícil trabalhar no Brasil nessa situação, mas não podem deixar de fazer negócios no país pela sua importância econômica. Valor: Como executivos internacionais vêem Lula nessa área? Pieth: Há grandes esperanças de que Lula combata realmente a corrupção. As companhias sabem que isso vai tomar tempo. O problema é que tudo pode mudar rapidamente, como aconteceu no México, que perdeu seu credito nessa área. Valor: O que ocorre no México? Pieth: A atmosfera entre os executivos é que os mexicanos exigem sempre suborno. O governo Fox não cumpriu as promessas anticorrupção. Na Argentina, com a situação econômica, a corrupção está generalizada é uma situação muito negativa. Valor: Como o sr. avalia a atuação do Brasil no grupo anticorrupção na OCDE? Pieth: O Brasil é um dos mais ativos. O problema é a prática interna. Vou ao Brasil em junho para uma grande conferência em Brasília e examinar com o governo federal as medidas de combate a corrupção com o Ministério da Justiça e da Fazenda. Mas estou um pouco decepcionado que os meios empresariais de São Paulo, sobretudo, que não se interessem por essas discussões.