Título: Empresas assinam pacto inédito contra corrupção
Autor: Assis Moreira De Davos
Fonte: Valor Econômico, 28/01/2005, Internacional/Especial, p. A

Executivos de 60 multinacionais dos setores de construção, mineração e petróleo vão assinar hoje em Davos o primeiro pacto global de "tolerância zero" contra o pagamento de suborno para obter negócios. Duas empresas brasileiras, Petrobras e grupo Ipiranga, foram convidadas a aderir. A Petrobras confirmou ontem à noite que assinará o acordo. A Ipiranga deve submeter o projeto a seu conselho de administração. Ao mesmo tempo, o Brasil foi apontado como um dos lugares onde multinacionais são levadas a essa prática. O presidente do grupo sobre corrupção da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o professor suíço Mark Pieth, um dos articuladores da iniciativa de Davos, comentou ao Valor caso de uma grande companhia que teria pago milhões de dólares de suborno a um alto funcionário para vender turbinas e linhas elétricas destinadas a uma barragem construída por um governo estadual no país. Ele diz ter ouvido de empresas americanas, européias e japonesas de vários setores, sobretudo de equipamentos pesados, casos de cobrança de "contribuição para a caixa do partido" no Brasil, deixando seus dirigentes "num grande dilema". Pieth disse que "para a OCDE, isso é corrupção". Jerome Brooks, diretor da organização Transparência International, que monitora e faz uma classificação de corrupção nos países, disse que no Brasil "há muita corrupção", mas que confia no governo Lula para combater essa praga nos negócios. Ele citou estimativas de custos de mais de US$ 200 bilhões por ano causados globalmente por corrupção, dos quais US$ 20 bilhões seria o montante embolsado por políticos. Também presente no Fórum Econômico Mundial, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Luiz Fernando Furlan, disse que nunca ouviu nenhuma denúncia sobre corrupção no Brasil para obter contratos, "nem de quem tem intimidade para comentar isso comigo". Mas ele insistiu que o governo tem em andamento várias medidas para melhorar os controles e "fechar ralos" contra fraude mas também desperdício e ineficiência, que resultariam em três anos em economia entre R$ 40 bilhões e R$ 50 bilhões. Ontem à noite, 60 grandes empresas já tinham se comprometido em assinar hoje o pacto contra suborno. Elas representam mais de US$ 300 bilhões em receita anual. Grandes companhias normalmente alegam que têm estritas proibições contra subornos para obter vantagens nos contratos. No entanto, nem o Fórum Econômico Mundial está livre dessa prática. No final do ano passado, a entidade teve que demitir seu executivo principal, o ex-presidente da Costa Rica Jose Maria Figueres, que reconheceu ter recebido mais de US$ 900 mil da empresa francesa Alcatel. Segundo ele, o pagamento foi para consultoria, paralelamente ao seu trabalho no Fórum. O projeto começou há três anos. Os organizadores se concentraram em três setores: construção, energia e indústrias de mineração, porque elas freqüentemente operam nos países em desenvolvimento e supostamente estão mais envolvidas em problemas de corrupção. Assinar o acordo representa um claro benefício de relações públicas para as empresas. Mas também coloca mais em jogo suas reputações - pelo menos é o que esperam os organizadores da iniciativa. A Transparência Internacional diz que vai esperar "objetiva certificação" do que as companhias estão fazendo na realidade. De outro lado, toda a publicação dada ao acontecimento coloca já alguma pressão contra essas práticas. Importante tambem são as empresas que estão fora. É o caso das grandes do petróleo, como Exxon e ChevronTexaco. Elas acham que já têm suficientes regras contra corrupção. Para Mark Pieth, no Brasil o problema não é com as empresas brasileiras que fazem negócios no exterior, mas sim "passivo", de casos dentro do país onde multinacionais seriam cobradas a pagar para "caixas" de partidos políticos em troca de contratos. Pieth disse que descobriu casos envolvendo empresas no Brasil quando se preparava para uma visita em novembro ao país. Ele reuniu em seu instituto na Universidade de Basiléia, na Suíça, várias empresas que normalmente se sentam em volta da mesa para discutir problemas de corrupção nos negócios em várias partes do mundo. O professor contou que, numa reunião, todas as sete companhias revelaram que foram cobradas para dar suborno por um específico contrato num importante Estado brasileiro - uma delas confirmou que pagou milhões de dólares. O professor irá em junho ao Brasil, onde examinará com os ministérios da Justiça e da Fazenda avanços contra a corrupção no Brasil. Ele disse que na OCDE o governo brasileiro é ativo no grupo de trabalho contra corrupção transnacional. Mas que muito precisa ser feito nas práticas domésticas.