Título: Brasília pode ser o Rio amanhã
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 14/01/2011, Opinião, p. 16

A tragédia que se abate na serra fluminense parece cenário distante do Distrito Federal. Na capital dos brasileiros, a chuva é bem-vinda e ansiosamente esperada depois de longas e regulares estiagens. A água ressuscita o verde, lava a poeira e umedece o ar. Sinais de alerta, porém, acendem-se aqui e ali. Ruas se alagam, residências despencam na periferia, erosões ameaçam moradias e vidas.

Levantamento da Secretaria de Defesa Civil identificou 26 áreas de risco no Distrito Federal. São espaços sujeitos a inundações e desabamentos. Entre eles, 12 representam perigo iminente para as pessoas que lá vivem. Na Vila Rabello II, por exemplo, o quintal de muitas casas se confunde com a ribanceira. A situação é tão precária que uma tempestade pode carregar barracos e moradores.

A urbanização acelerada e o crescimento desordenado respondem pela semente alarmante que germinou no Planalto Central. O asfalto e o calçamento expulsam a vegetação e encurralam a água que, sem vazão, avança por ruas, calçadas e prédios. Assentados em barrancos ou próximos às margens de rios e lagos, brasilienses põem em risco o meio ambiente e a própria sobrevivência. O lixo, sem tratamento e coleta adequados, acumula-se em bocas de lobo e leito de rios.

Apesar do diagnóstico e dos anúncios de deterioração acelerada do quadro, nenhuma providência efetiva é levada avante. Resultado: a situação se agrava. Novos moradores instalam-se nas áreas precárias. Multiplicam-se os problemas. Vale lembrar que o meio ambiente não é coração de mãe. E, como se vê no Rio, em São Paulo e em outras unidades da Federação, nele nem sempre cabe mais um.

Brasília tem 50 anos. Ao contrário das cidades quatrocentonas, que se desenvolveram na ignorância dos riscos do crescimento desordenado, a capital brasileira avançou em época de pleno conhecimento da ciência ambiental. Os governos que se sucedem no Distrito Federal não têm desculpas por terem se descuidado da ocupação correta do solo. Se negligenciam as providências necessárias à conservação da qualidade de vida na cidade patrimônio, devem responder pela omissão.

Fechar os olhos para o inchaço do Plano Piloto, o desrespeito ao projeto urbanístico da cidade, o descaso com o lixo e a explosão demográfica é semear tragédias. Brasília não precisará esperar 450 anos para se tornar palco de horrores como Petrópolis, Teresópolis ou Nova Friburgo. O futuro virá bem antes.