Título: Regulamentação de Basiléia 2 deve baixar custos para os bancos
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 17/09/2007, Finanças, p. C2

O Banco Central vai exigir menos capitais próprios dos bancos para cobrir riscos de perdas nos empréstimos de varejo, como crédito pessoal e cheque especial. A medida, que entra em vigor em julho de 2008, tende a aliviar os custos dos bancos e, em tese, ganhos podem ser repassados aos clientes, na forma de juros mais baixos.

A nova regra faz parte da implantação no Brasil do chamado Acordo da Basiléia 2, um entendimento internacional que visa a dar maior solidez ao sistema financeiro. O princípio básico desse acordo é que os bancos tenham um volume mínimo de capital próprio para cobrir perdas inesperadas nas operações. Assim, os bancos manteriam uma espécie de "colchão", protegendo contra perdas o dinheiro depositados pelos clientes.

Pela regra hoje vigente, as operações de varejo eram tratadas como qualquer outra operação de crédito. A regra geral é que, para cada R$ 100 em operações de crédito, os bancos tenham R$ 11 em capital próprio para cobrir eventuais perdas. Nas operações de varejo, passará a ser exigido 25% menos capital - ou seja, R$ 8,25.

"Nas operações de varejo, em que são feitas muitos empréstimos de pequeno valor, os bancos diversificam mais os riscos", afirma Fabiana Melo, consultora do BC que coordena o projeto de implantação da Basiléia 2 no país. São consideradas operações de varejo os empréstimos até R$ 400 mil feitos a pessoas físicas ou pequenas empresas (faturamento anual de até R$ 2,4 milhões). Enquadram-se nesse critério cerca de 90% dos contratos de empréstimos bancários, que representam 46% das carteiras de crédito do sistema financeiro.

A nova regra editada pelo BC muda também as exigências de capital nos financiamentos imobiliários. Nesse caso, os efeitos são ambíguos. Dependendo da situação, pode aumentar, diminuir ou deixar inalterada a exigência de capital. Se um banco financiar 50% do valor de um imóvel com garantia de alienação fiduciária ou de hipoteca, a exigência de capital será 30% menor do que na regra atual. Se financiar entre 50% e 80%, nada muda. Mas, se o financiamento superar 80%, o capital exigido será o dobro do atual. A regra vale tanto para a financiamentos para a compra de imóveis quanto empréstimos para qualquer outra finalidade com imóveis como garantia.

A tendência é que o efeito líquido seja negativo para o sistema financeiro, exigindo mais capital. Os bancos vêm disputando de forma acirrada o mercado de crédito imobiliário, oferecendo empréstimos que cobrem até 100% do imóvel.

Outra medida que tende a afetar negativamente os clientes bancários é a que exige capital para cobrir risco das operações de cheque especial. Os bancos, pela regra atual, estão obrigados a manter capital próprio apenas para cobrir riscos de empréstimos efetivamente contratados pelos clientes no cheque especial. Na nova regra, o banco terá que ter capital próprio se simplesmente fechar contrato com os clientes colocando um limite de crédito à disposição.

O chefe do Departamento de Normas do BC, Amaro Gomes, afirma que, no geral, o impacto das novas regras será neutro. "Individualmente, poderá aumentar a exigência de capital de uma ou outra instituição, mas o efeito no geral é neutro".

Os bancos queriam redução ainda mais ampla nos capitais exigidos, de cerca de 30%. O chamado índice da Basiléia, fator central no cálculo das exigências de capital, é de 11% no Brasil. Em países desenvolvidos é de 8%. Os bancos queriam isonomia para competir com bancos estrangeiros em um ambiente de integração dos mercados mundiais. O BC, porém, manteve os 11%, percentual adotado por outros países emergentes, devido ao maior risco de crédito.

O BC editou na sexta-feira um conjunto de nove circulares que regulamenta o acordo da Basiléia no país - todas entram em vigor em julho de 2008, com exceção de uma regra que trata da exigência de capital para riscos em operações cambiais. Uma das novidades da nova regulamentação é que será exigido capital para cobrir o risco de oscilação de preços de ações e de "commodities". O impacto das medidas na exigências de capital, porém, tende a ser limitado. As ações mantidas pelos bancos para negociação em mercado correspondem a apenas 0,3% dos ativos do sistema; os investimentos em "commodities", a apenas 0,03% dos ativos.

Antes, havia apenas exigência de capital para a cobertura de riscos de taxas de juros e de câmbio. No caso do risco de juros, foi ampliada a exigência de capital. Antes a regra englobava apenas as operações prefixadas. Com a nova regulamentação, passará a contemplar também risco nas operações com cupons cambial, de índice de preços e de juros. Também foram feitos aperfeiçoamentos na fórmula de cálculo dos riscos de juros prefixados, incorporando prazos mais longos.

Na exigência de capital para a exposição cambial, a circular fez um ajuste fino numa regra que havia sido editada em maio passado. Na ocasião, o BC passou a exigir capital próprio para o chamado risco jurisdicional no cambio. Isto é, se a matriz em uma país fazia uma operação com a filial em outro país, o risco cambial tinha que ser considerado, exigindo mais capital. Uma das circulares editadas na sexta-feira cria uma regra de transição para uma situação muito especial - ficam de fora dos cálculos de exigência de capital, até 31 de dezembro, os recursos captados no exterior que são repassados entre instituições de um mesmo conglomerado para realização de operações de crédito.

Gomes disse que, até dezembro, serão definidos os critérios de exigência de capital para risco operacional, ou seja, para cobrir perdas em eventos como roubos, falhas de equipamentos ou pessoas, ações judiciais, entre outros. Os regulamentos editados na sexta-feira permitiram que os bancos usem modelos internos de análise de risco para o cálculo da exigência de capital nos investimentos que os bancos pretendem manter até o vencimento.