Título: Cresce a influência econômica do Irã no Iraque
Autor: Dareini, Ali Akbar
Fonte: Valor Econômico, 17/09/2007, Internacional, p. A11

Washington vem acusando o Irã de enviar armas e combatentes para ajudar as milícias muçulmanas xiitas do Iraque, que atacam soldados americanos. Comandantes tanto britânicos como americanos qualificaram os combates em regiões do Iraque de "guerra por procuração" contra o Irã. Os iranianos contestam, dizendo não interferir no Iraque e que não estão tentando obter armas atômicas. Mas autoridades iranianas concordam que o país tem um grande papel no Iraque, muito semelhante ao que ocorre por meio do comércio e da ajuda que proporciona ao Afeganistão na sua fronteira oriental, à medida que Teerã busca ampliar sua influência regional.

"O governo e a nação iraquianos são amigos íntimos do Irã", disse Mahmoud Ahmadinejad, o presidente iraniano, em entrevista. "Somos aliados naturais." E, complicando a posição americana, o governo iraquiano, dominado pelos xiitas, tem buscado estreitar laços comerciais e políticos com o Irã, cuja população é predominantemente xiita. Iraque e Irã foram inimigos durante todo o regime de Saddam, inclusive travando uma longa e destrutiva guerra durante a maior parte da década de 80.

Mas, quando o regime sunita de Saddam caiu e a maioria xiita iraquiana assumiu o poder, antigos laços históricos, religiosos e culturais entre xiitas dos dois países voltaram a florescer. Atualmente, a influência do Irã é mais evidente no sul do Iraque, predominantemente xiita. Mas é também sentida nas áreas setentrionais curdas e até mesmo em Bagdá, onde muitos novos projetos de reconstrução - como a melhoria da rede de eletricidade iraquiana - são financiados por investimento iraniano.

"Décadas de guerras e a invasão americana destruíram quase tudo no Iraque. E o Irã está bem preparado para aproveitar essa oportunidade e inundar os mercados iraquianos com produtos e serviços", disse Saeed Leilaz, analista iraniano especializado em economia e política. A exportação de mercadorias para o Iraque rende dinheiro e influência. "Produtos iranianos estão sendo vendidos em toda parte no Iraque. Isso nunca aconteceu antes", afirmou.

O embaixador do Irã em Bagdá, Hasan Kazemi Qomi, disse no mês passado que o comércio Irã-Iraque em 2006 totalizou US$ 2 bilhões - sendo 97% no sentido do Irã para o Iraque. Hossein Tizmaghz, um funcionário do Ministério do Comércio do Irã, diz que o comércio disparará para US$ 10 bilhões em cinco anos. Shalamcheh é um dos três principais pontos da fronteira de 660 km. Na década de 80, era um campo de batalha poeirento onde iranianos e iraquiano combatiam e onde o regime de Saddam usou armas químicas. Hoje, o terminal de exportações é palco de agitação da passagem não só de caminhões, mas também de famílias iranianas que viajam em peregrinação para cidade sagradas iraquianas.

A situação na fronteira é mais complicada no norte do Iraque, de maioria curda. A entrada de mercadorias, como gasolina barata, cresce, mas a atmosfera é tensa. Nas últimas semanas, com regularidade, o Irã disparou fogo de artilharia através da fronteira contra bases usadas por militantes envolvidos em ataques na região curda do Irã. Um emissário iraniano advertiu, no fim de semana passado, que, se os iraquianos não conseguirem fazer cessar as incursões curdas, Teerã poderá reagir militarmente. Há também tensão no sul do Iraque, onde têm ocorrido combates entre grupos xiitas e partidos políticos, alguns dos quais têm vínculos mais estreitos com o Irã. Mas o fluxo de comércio e de peregrinos continua elevado.

Todo mês, mais de 40 mil iranianos visitam importantes locais xiitas no sul do Iraque, como as cidades sagradas de Najaf e Karbala, comprando lembranças religiosas e injetando dinheiro na economia. Muitos passam pela maior cidade do sul do Iraque, Basra, a pouco mais de 30 quilômetros da fronteira. Basra tem muitos centros culturais e religiosos iranianos e suas lojas estão repletas de comida iraniana de alta qualidade e barata, aparelhos de cozinha e materiais de construção. "A influência iraniana é muito grande", diz Ali Abdul Aziz, professor sunita aposentado em Basra. O Irã anunciou que deseja construir um aeroporto em Najaf e promete ajudar na reforma de importantes santuários. Os iranianos também iniciaram obras de uma ferrovia entre o porto iraniano de Khorramshar e Basra, interligando o sistema ferroviário do Irã ao do Iraque.

Teerã assinou contrato de US$ 150 milhões para a construção de uma usina de eletricidade de 300 MW em Bagdá. Outro projeto, de uma linha de transmissão de 400 MW (partindo de Abadan, cidade fronteiriça iraniana, até a cidade iraquiana de Alharasa) deverá entrar em operação em poucos meses. O Irã realiza ainda estudos de viabilidade para a construção de dois oleodutos para transportar petróleo e derivados de Basra para Abadan. "A inimizade acabou", diz o empresário iraniano Bahram Mehrparvar enquanto preenche formulários no terminal de exportações de Shalamcheh, necessários para liberar seu carregamento de tijolos e cimento para o Iraque. "Negócios e comércio substituíram as balas e os morteiros."