Título: Crescer é tarefa do novo presidente do BNP
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2007, Finanças, p. C12

Louis Bazire: "Estou pronto a examinar todas as possibilidades para desenvolver nossas atividades" Em janeiro deste ano, o presidente executivo global do BNP Paribas, Baudouin Prot, telefonou ao presidente do banco na Suíça, Louis Bazire, perguntando se gostaria de dirigir a instituição no Brasil. ''Você é também brasileiro, não é?", argumentou Prot, enquanto mencionava o potencial de novos negócios no país.

Bazire conta que não hesitou em trocar o comando do maior banco estrangeiro na Suíça, que é líder global do financiamento de matérias-primas e tem US$ 36 bilhões sob gestão, para ocupar o posto no país onde nasceu e viveu na infância.

Em entrevista ao Valor, o executivo revela que recebeu a missão de expandir as operações no país inclusive por aquisições - no plural. "Estou pronto a examinar todas as possibilidades para desenvolver nossas atividades, por aquisições, projetos novos e crescimento interno", afirmou.

Dizendo-se bastante confiante na economia brasileira, Bazire compara: "Na Europa, quando um banco mostra um crescimento de 5% já é significativo. No Brasil, os bancos têm muito espaço para crescer".

Mas não considera prioritário crescer no varejo abrindo rede de agências no país. Ele admite que isso até possa ocorrer por aquisição, mas não por "greenfield" (novos projetos). "Varejo não é a única maneira de fazer banco no Brasil", argumenta.

O banco se aproxima mais do "varejo especializado", como ele define, com a Cetelem, financeira, e a Cardif, seguradora, e outros projetos que vão ser desenvolvidos. Bernard Mencier, atual presidente, se aposentará mas continuará no banco, com atividades no conselho, acompanhando o desenvolvimento dos negócios.

Louis Bazire, 53 anos, nasceu no Rio, onde viveu até os 12 anos. É filho de um francês de família tradicional que trabalhava no setor farmacêutico, e de uma americana nascida em São Paulo, filha de um dos fundadores da Light. Seu avô, ex-militar americano, foi também assessor da Força Aérea Brasileira (FAB).

Quando a família mudou-se para a França, ele já sofria torcendo pelo Fluminense. Em Paris, fez o diploma de Hautes Etudes Commerciales, o MBA francês. E quando foi convocado a prestar 12 meses de serviço militar, preferiu a opção de 18 na cooperação francesa no estrangeiro. Escolheu o México, e lá se casou com Luisa Batiz, com que tem duas filhas. Em casa, o idioma continua sendo espanhol até hoje. "É por isso que estou falando portunhol. Freqüentei menos o Brasil nos últimos 40 anos, porque a sogra estava no México", diz. Sua irmã é casada com um brasileiro e vive em Paris.

Sua carreira profissional foi toda feita no BNP. No primeiro posto no exterior, como representante adjunto no México, "fiz parte da gente que fez a dívida, dando empréstimo, e depois a renegociou". Participou da dura competição entre bancos estrangeiros para emprestar e para ser líder dos pacotes que garantiam comissão maior.

Só que em 1982, três meses após um empréstimo de US$ 3,5 bilhões, ele viu o México quase quebrado nacionalizar os bancos e abrir renegociação da dívida. ''Dívida externa excessiva é uma droga muito perigosa que deve ser evitada'', constata.

De retorno a Paris, Bazire foi para a inspeção geral, passagem obrigatória para cargos mias altos. Passou a fazer auditoria interna e avaliar dirigentes bem mais experientes, alguns 30 anos mais velhos, em Nova York, Panamá, África. Ele tira da carteira uma cédula de 1 Dalazi, a moeda da Gâmbia, um dos países mais pobres da África, para contar outra lição que aprendeu.

"Vi que nosso banco lá, com operações simples, era muito rentável. É que o BNP era o único controlado pelo setor privado e, como 80% da população era analfabeta, nossos funcionários escreviam nos carnês os depósitos e retiradas, e os depositantes tinham segurança de não serem enganados. Pode-se fazer estudos financeiros por anos, mas aí é que se compreende a que ponto a base da relação bancária é a confiança".

Até hoje, ele carrega na carteira também uma cédula de Patacas, moeda de Macau, e de um dólar americano por superstição familiar. ''Minha mãe dizia que um dólar sempre pode salvar sua vida", comenta rindo.

O percurso profissional o levou entre 1987-91 à Espanha, quando o país abria sua economia depois de entrar na União Européia. O BNP comprou um banco com 50 agências e resolveu abrir mais 30 rapidamente. "Tínhamos tanta pressa para abrir filial que não dava tempo nem de instalar linha telefone. Os funcionários se comunicavam com walkie talkie".

Foi diretor em seguida na Bélgica, e de retorno a Paris foi para a inspeção de mercado de capitais, para desenvolver um modelo de controle interno de riscos a pedido do então presidente Michel Pebereau, hoje o chairman do banco. Nesse período, aconteceu o desastre do britânico Barings Bank, quando um jovem funcionário em Cingapura especulou e perdeu US$ 1 bilhão em operações nas quais escondeu o prejuízo por falta de controle interno. O banco acabou quebrando e sendo vendido por 1 libra esterlina para o ING, da Holanda.

Bazire conta como construiu o modelo interno de risco de mercado, para controle diário. E admite que há ''traders'' que quando perdem dinheiro, jogam o dobro como num cassino. "Isso pode acontecer em todos os bancos, e o trader é demitido na hora. Numa sala de trading, é preciso disciplina de ferro", afirma.

O executivo foi promovido depois para cargo de direção de recursos humanos do BNP. Coincidiu com recrutamento de especialistas de novos instrumentos financeiros. Ele lembra da contratação de uma equipe de analistas de produtos derivativos nos EUA, onde a fórmula de calcular os bonus que eles receberiam "exigia doutorado em finanças, de tão complicada". "Na época, culturalmente não era fácil na França se aceitar pagar milhões de dólares por essas pessoas. Hoje, isso é banal".

Nos últimos quatro anos, Bazire presidiu o BNP Paribas na Suíça, principal mercado global para financiamento de matérias-primas - mais da metade do petróleo mundial é negociado em Genebra - e também da gestão de fortuna.

Ele fez a fusão com outros bancos adquiridos no mercado local. E julga que os resultados foram excelentes no período, beneficiados pela conjuntura econômica. O banco é líder no negócio de matérias-primas com movimento de US$ 2 bilhões por dia com transferências e cartas de crédito, abocanhando cerca de 60% desse setor globalmente.

Também na competição com mais de 100 bancos de gestão de fortuna em Genebra, o BNP Paribas reforçou sua presença. O volume das comissões subiu 25% no período. O lucro ano passado foi acima de US$ 400 milhões.

Agora o desafio é o Brasil. ''A economia está bem, a questão agora é acelerar o crescimento'', estima. Com as turbulências atuais nos mercados financeiros globais, prevê que os spreads nos mercados de dívidas vão aumentar, com efeito também no Brasil.

Mas acha que o país está mais protegido de choques, inclusive porque os instrumentos financeiros no país estão mais em linha com a economia real do que os complexos instrumentos nos países desenvolvidos.

''Não é preciso ter 40 anos de estudo de finanças para ver que havia um excesso perigoso nos créditos de subprime. E quando se sai do razoável, o mercado castiga'', diz. Ele acha que os reguladores vão adotar medidas, mas a acha que o mercado é o melhor controle.

Indagado se lamenta partir de Genebra, uma das cidades com melhor qualidade de vida do planeta, onde vai a pé de casa para o trabalho em dez minutos, Louis Bazire não hesita. Diz que que os inconvenientes serão compensados pela possibilidade de passar fins de semana no Rio de Janeiro ''e tomar caipirinha em Ipanema, onde nasci''.