Título: Para mercado, BC não confia em seu modelo
Autor: Cristiane Perini Lucchesi
Fonte: Valor Econômico, 28/01/2005, Finanças, p. C3

A ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem deixou o mercado financeiro surpreso por seu tom mais duro do que o esperado. O fato de o Copom ter considerado, em sua reunião de janeiro, subir os juros em 0,75 ponto percentual (subiu 0,5 ponto) espantou os especialistas. Ainda mais considerando-se que já naquela data a inflação projetada para 2005 pelo modelo do próprio BC era de 5,2%, quase idêntica à meta de 5,1% para este ano. Segundo um economista, que preferiu não se identificar, o BC admitiu que não confia no próprio modelo de projeção de inflação futura. "Diante das incertezas sobre como a economia reage à política monetária, por causa da falta de experiência prévia com crescimento sustentado, o BC optou pela visão mais pessimista e cautelosa", avaliou o ex-presidente do BC e sócio da Tendências Consultoria Gustavo Loyola. O risco dessa visão, segundo ele, é de um "desperdício de uso da taxa de juros, com o custo que ele implica para toda a sociedade em termos fiscais e de crescimento". Alguns economistas passaram a insistir que a meta de 5,1% para a inflação de 2005 não é real, mas sim um teto máximo, como o economista-chefe do Banco Modal, Alexandre Póvoa. "Se 5,1% fosse a 'meta real', não faria o menor sentido a prevalência de um discurso tão duro, com o IPCA/2005 projetado em seu modelo (do BC) já gravitando ao redor de 5,2%", disse Póvoa. Luiz Guilherme Piva, economista-chefe da Trevisan, considera que o BC está sofrendo de uma "obsessão econométrica, com uma visão de mundo descolada da realidade". Piva, que foi assessor do Ministério da Fazenda nos três primeiros meses do governo Lula, assessor da bancada do PT na Câmara por quatro anos e chefe do Departamento Econômico da CUT, considera que o BC vive um processo de "encastelamento" em relação à sociedade. Para ele, os impactos negativos dessa postura conservadora demais do BC já se fazem sentir no nível de atividade e de investimento, na taxa de câmbio e no custo da dívida. O governo agiu corretamente ao arrumar a casa e fazer um ajuste logo que assumiu, afirma Piva. Mas, desde 2004, o governo deveria estar aproveitando os bons ventos e promovendo políticas ativas de desenvolvimento, considera. "O governo está caindo em uma armadilha que vai corroer o próprio governo", considera. Alex Agostini, economista da GRC Visão, também critica a postura do BC. "Ratificamos a ausência de indicadores econômicos, domésticos ou provenientes do ambiente externo que autorizem essa postura inflexível da autoridade monetária com relação aos juros", afirma ele, em relatório. Para Agostini, a postura do BC cria "gargalos de financiamento do crescimento econômico", ao impedir o repasse dos ganhos de produtividade no campo e nos setores industriais para o preço dos ativos. A equipe econômica do CSFB discorda: considera necessário continuar o aperto monetário. Em relatório divulgado ontem, nota que o "risco de ingerência política sobre as decisões do Copom pode reduzir a inclinação da estrutura a termo da taxa de juros, diminuindo a eficácia da política monetária". Com isso, diz o CSFB, para alcançar o efeito da inflação inicialmente desejado, o BC precisaria elevar os juros acima do previsto inicialmente.