Título: CMN tira recursos da habitação
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 28/01/2005, Finanças, p. C8

O Conselho Monetário Nacional (CMN) atendeu ontem o pedido dos bancos privados e reduziu o volume de recursos captados na caderneta de poupança que deverá ser obrigatoriamente aplicado em financiamentos habitacionais. Em vez dos R$ 12,8 bilhões previstos, os bancos estarão obrigados a aplicar, em princípio, cerca de R$ 3,9 bilhões em 2005. Também foram flexibilizadas as regras para incentivar os bancos a financiar imóveis mais baratos, com juros a partir de 9% ao ano, abaixo do teto vigente de 12% ao ano. O CMN aprovou uma série de propostas que, conforme antecipado anteontem pelo Valor, haviam sido encaminhadas ao Ministério da Fazenda pela Associação Brasileira das Entidade de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) e pela Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC). O diretor de Normas do Banco Central, Sérgio Darcy, disse que o governo decidiu aceitar as sugestões porque, além dos bancos, elas eram apoiadas pela indústria da construção civil, uma das principais interessadas no aumento da oferta de crédito. O receio é que, com excesso de recursos, os bancos emprestassem mal, elevando a inadimplência. No ano passado, o volume de recursos disponíveis para novos financiamentos chegou a R$ 3 bilhões, e os bancos conseguiram aplicá-los integralmente. Mas haveria um forte aumento no volume disponível em virtude de modificações aprovadas pelo próprio CMN no início de 2004 - quando ainda havia dúvidas sobre o processo de retomada da atividade econômica -, para aquecer o setor de construção civil. A regra em questão é a que determina que 65% dos saldos médios captados pelos bancos em cadernetas de poupança devem ser aplicados em financiamentos habitacionais. Essa regra, porém, permite que, em vez de fazer empréstimos, os bancos computem como aplicações em habitação os créditos detidos contra o Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS). Mais recentemente, os bancos venderam esses créditos para instituições que quebraram na a crise bancária do Plano Real (os papéis foram usados como garantia para empréstimos do Programa de Reestruturação e Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional - Proer). Mas, mesmo sem deter esses papéis, o bancos tiveram autorização para contabilizá-los como se fossem financiamentos habitacionais. Por isso, essa exceção ficou conhecida como "FCVS virtual". Desde fins de 2001 o CMN vem reduzindo essa brecha. Primeiro, determinou que, mensalmente, 1% desse FCVS virtual fosse substituído por crédito imobiliário de fato; no início de 2004, elevou o percentual a 2%. Os bancos calculam que, com essa mudança na regra, os recursos disponíveis para novos financiamentos em 2005 chegariam a R$ 12,8 bilhões. Já o BC calcula que os recursos ficariam entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões. As diferenças entre as projeções ocorrem porque os bancos e o BC trabalham com cenários diferentes para o aumento das captações em cadernetas. O consenso formado entre bancos e a indústria de construção, porém, é que em 2005 haveria demanda para, no máximo, R$ 3,9 bilhões - o que representaria um acréscimo de 30% sobre os recursos aplicados em 2004. O CMN acolheu esses cálculos e decidiu mudar provisoriamente a regra - até março, quando haverá nova análise. A cada mês, os bancos deverão conceder em novos empréstimos 30% a mais do que o emprestado no mês correspondente de 2004. Só fica dispensado desta obrigação quem estiver sobreaplicado na regra que determina que 65% do dinheiro da caderneta deve ir para habitação - caso da Caixa Econômica Federal. Paralelamente à redução de recursos, o CMN aprovou ainda o aumento dos tetos do financiamento. Agora, o valor máximo de avaliação do imóvel é de R$ 350 mil, acima dos R$ 300 mil até então vigentes. E o valor financiado pode chegar a R$ 245 mil; antes, o limite era R$ 150 mil. Um outro conjunto de medidas tem o objetivo de incentivar empréstimos para aquisição de imóveis de menor valor, com juros mais baixos. Foi criada uma tabela, segundo a qual, quanto menores os valores dos imóveis financiados e menores os juros, maior o peso do empréstimos no cálculo da exigibilidade de aplicação em habitação de 65% dos recursos da caderneta. Exemplo: se o valor do imóvel é de R$ 10 mil, e juros cobrados forem de 9% ao ano mais a taxa referencial (TR), o banco poderá computar três vezes o valor emprestado para fins de cumprimento da exigibilidade. Um financiamento de imóvel que valha R$ 150 mil ou mais, com juros em 12% ao ano acrescido da TR (taxa máxima admitida), seria computado com o peso um. Entre uma situação e outra, há várias taxas (9%, 10%, 11% e 12%) e faixas de valores de imóveis, e cada combinação terá um peso próprio, entre 1 e 3. "É um incentivo muito forte para os bancos financiarem as faixas de renda mais baixas", acredita Darcy. Dentro do pacote de modificações, foi elevado - de 1 para 1,2 - o peso que os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) recebem no cálculo das aplicações obrigatórias em habitação. Outra medida foi permitir que os bancos incluam em suas exigibilidades os empréstimos a empresas que construam moradias para seus funcionários. Foi autorizado ainda que os bancos canalizem recursos da caderneta de poupança para projetos de saneamento. Por enquanto, há duas possibilidades: os financiamentos para concessionárias privadas do setor de saneamento, com juros máximos de 12% ao ano; e o financiamento de estudos de viabilidade e modelagem de projetos de saneamento ambiental nos municípios com mais de 100 mil habitantes. O valor máximo das operações é de R$ 750 mil, ou 0,35% da receita líquida do município.