Título: Autonomia das instituições requer também discrição
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 27/09/2007, Opinião, p. A12

Consta que o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, mostrou indignação com o excesso de publicidade dado ao relatório da Polícia Federal sobre o valerioduto mineiro e classificou o resultado do trabalho de investigação apresentado pela polícia de "opinativo". Ele também teria reagido às declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que disse não acreditar na existência de provas que incriminem o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, no caso do "mensalão" - cuja denúncia foi apresentada pelo procurador-geral ao Supremo Tribunal Federal (STF) e acatada. Souza disse que trabalha sobre fatos concretos, não por suposições.

Até agora, pelo menos aparentemente, não havia ocorrido caso de divergências públicas entre a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal - ao contrário, durante todo o inquérito que deu forma à denúncia apresentada pelo procurador contra os implicados no escândalo do mensalão, a impressão que ambas as instituições passaram à opinião pública foi de mútua colaboração. Parece que o jogo virou. Também mudou o comportamento do procurador-geral que, discreto até a divulgação da também publicizada denúncia contra os "mensaleiros", agora se contrapõe publicamente à PF e a uma mera opinião do presidente da República.

A independência do Ministério Público foi uma das conquistas de uma tenra democracia brasileira na Constituinte de 1988. O MP surgiu como uma instância de controle das instituições públicas no momento em que também se restituíam as prerrogativas do Legislativo e do Judiciário, tornadas meras lembranças durante o período autoritário. À medida em que o MP foi formando quadros e assumindo suas funções, foi vitimado por uma correspondente atração dos procuradores pelos holofotes. Excessos que quase resultaram em banalização da denúncia foram interrompidos por um processo de amadurecimento da instituição, já plenamente inserida e adaptada às suas funções.

A PF, por sua vez, começou a se profissionalizar no governo de FHC. Tornou-se protagonista da democracia que se consolidava por mérito. Ao projetar-se por sua eficiência, foi vitimada também pela síndrome dos holofotes. Não se pode considerar que tenha superado essa deficiência, mas é de se esperar que o tempo atue nessa direção, como ocorreu com o MP.

O Supremo Tribunal Federal (STF), cuja autonomia inexistiu no período militar, restabeleceu suas prerrogativas com quadros ainda tomados do período das trevas. Conforme foi se renovando, e inclusive incorporando como ministros pessoas que haviam sido proscritas pela ditadura, passou a considerar seus poderes ilimitados para corrigir o que considera como anomalia do regime democrático. Nos últimos anos, avocou-se por várias vezes o papel de legislador, que não lhe cabe.

Os escândalos que tomaram o país nos últimos anos não devem ser tomados como uma ameaça à democracia, e, sim, a exposição de subterrâneos antes inalcançáveis. Deve-se à autonomização do MP, à profissionalização da PF e à restituição ao Judiciário de suas prerrogativas o desmascaramento das mazelas do sistema político. A autonomia de cada uma dessas instituições, no entanto, não lhes dá autoridade sobre as demais. A harmonia e o respeito mútuo é fundamental para o funcionamento das instituições democráticas. A exposição pública de divergências, ou a desqualificação de uma instituição pela outra, pouco ajudam na consolidação das liberdades democráticas. Cria-se, isto sim, uma desconfiança do cidadão comum em relação às decisões ou ações de cada uma delas. O procurador-geral, que parece ter esquecido os pecados do MP no período em que se rendeu totalmente aos holofotes, disse que a PF "opinou" em seu relatório sobre o mensalão mineiro. Que decisão tomará o procurador em relação aos envolvidos? E em quem se deve acreditar, no relatório da PF ou na sua denúncia ao STF? E por que um procurador - de quem se espera discrição - deve reagir a uma opinião do presidente da República?

Autonomia requer sangue frio dos dirigentes dessas instituições e entendimento entre elas. O procurador-geral deve se entender com a PF e livrar o brasileiro de dúvidas em relação à real isenção dessas instituições, que não devem ser partidárias ou partidarizadas.

Indique Imprimir Digg del.icio.us Tamanho da Fonte: a- A+ Ver mais notícias em Opinião

Newsletter gratuita Receba grátis as principais notícias por e-mail:

Nome: E-mail: CPF: Por que? * Você receberá informações sobre novidades e campanhas do Valor e de seus parceiros por email e/ou SMS.

Para nos certificarmos que o cadastro do seu e-mail não será realizado por outra pessoa, garantindo assim a integridade da informação. Dessa forma, agimos de acordo com a Política Anti-Spam e asseguramos a seriedade do newsletter.

fechar Dólar (09/11/07 - 16:45) Compra Venda Comercial 1,7440 1,7460 Turismo 1,7200 1,8700 Paralelo 1,9500 2,0500

09/11/07 * 17:02 * 1,746

Euro (12/11/07 - 10:48) Dólar 1,4573 1,4578 Real 2,5410 2,5523 Turismo 2,5200 2,7300

Outros indicadores Selic 11,18 TR 0,0766 TJLP 6,50 CDB 30 11,07 Ouro-g 50,300 IGP-M 1,05 Fonte dos indicadores: CMA

Managed by