Título: Bovespa lança ações e vale R$ 16 bi
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Fonte: Valor Econômico, 25/10/2007, Finanças, p. C1

A primeira abertura de capital de uma bolsa da América Latina movimentou um volume recorde de recursos. Ontem à noite, foi definido o preço de venda das ações da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), que saíram a R$ 23 cada, o teto da faixa indicativa proposta pelos bancos, que já havia sido ajustada 30% para cima na terça-feira. A operação, incluindo a venda do lote extra, movimentou R$ 6,625 bilhões - superando de longe a Redecard, até então a maior oferta no país, com volume de R$ 4,6 bilhões.

A Bovespa abre o capital valendo nada menos que R$ 16,22 bilhões. A bolsa, sem fábricas e equipamentos industriais, vale mais que gigantes como Embraer, Aracruz, Klabin e Gol. Nos Estados Unidos, as bolsas abertas já valem mais que o setor automobilístico. Entre as 434 empresas listadas em São Paulo, a Bovespa ficaria entre as 25 maiores. As ações estreiam no pregão amanhã.

Com a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), os números também impressionam. A bolsa de derivativos é avaliada em mais de dez vezes o seu patrimônio, a R$ 13 bilhões - mais que Sadia, TAM ou Gerdau Metalúrgica.

Para os especialistas consultados pelo Valor, tamanha valorização é explicada principalmente por dois fatores. O primeiro é o fato de estas bolsas serem as únicas empresas dos mercados nos quais atuam, ou seja, não têm competidores. Difícil encontrar outra empresa de capital aberto sem concorrentes, com um mercado cativo e em expansão.

O segundo ponto é a perspectiva para a classificação do Brasil como grau de investimento, provavelmente no segundo semestre de 2008. Com o aumento do rating, as projeções apontam que o volume diário de negócios das bolsas dobraria até 2010. Na Bovespa, passaria dos atuais R$ 4,5 bilhões para R$ 9 bilhões. Mantido o ritmo atual de aberturas de capital, a Bovespa chegaria a mais de mil empresas. O lucro da bolsa, agora uma empresa que tem que dar resultados, chegaria a R$ 1 bilhão.

Na BM&F, a quarta maior bolsa de derivativos do mundo, não seria diferente. Com o crescimento da economia brasileira, aumenta a procura por proteção (hedge) para, por exemplo, safras agrícolas e operações de crédito. Com o grau de investimento, a participação dos estrangeiros, hoje de 15%, tende a subir ainda mais. Só no primeiro semestre, os contratos negociados na BM&F cresceram 66%. A média diária chegou a 1,8 milhão de papéis. A clearing de câmbio da bolsa detém 90% do mercado brasileiro destas operações. A de ativos, especializada em títulos públicos, tem 10%.

Com exceção do preço da ação, ainda não há números oficiais da abertura de capital da Bovespa. Mas comenta-se no mercado que as reservas dos investidores foram mais de dez vezes o tamanho da oferta e bateram em US$ 30 bilhões, dos quais 80% são de fundos estrangeiros. Só pessoas físicas no Brasil, foram mais de 25 mil. Anteontem, por causa da forte procura, os bancos coordenadores estavam aceitando os pedidos de reserva enviados por correio eletrônico até às 23h59 da terça-feira, último dia possível para os pequenos investidores comprarem ações, fato inédito no mercado.

As ações da Bovespa saíram a 11 vezes o valor patrimonial. Negócios recentes no mercado brasileiro ficaram na casa de três vezes este valor. Mas os especialistas dizem que algumas bolsas na Europa têm ações negociadas em nada menos que 20 vezes o patrimônio.

A Bovespa tem mais de 70% das operações de ações da América Latina. Quem abriu o capital foi sua controladora, a Bovespa Holding, que vai listar suas ações no Novo Mercado, que exige altas práticas de governança corporativa. Foram vendidos 40% do seu capital.

Os especialistas citam ainda um outro fator para explicar o interesse pelas bolsas. O processo de consolidação que passa o setor mundialmente, com bolsas se fundindo ou se associando, e que agora estaria chegando ao Brasil. Anteontem, a BM&F anunciou uma associação com o CME Group, que controla a maior bolsa de derivativos do mundo, em Chicago. Ontem, a OMX Nordic Exchange, da Suécia, anunciou um acordo para fornecer um novo sistema de negociação e expandir as operações da Bolsa de Valores da Colômbia. No mercado, circulam rumores de que a Bovespa pode ser a próxima a se associar com uma estrangeira.

Na BM&F, os sócios efetivos tentam mais uma cartada para mudar os rumos da operação. Ontem, o advogado Bension Coslovsky, que representa um destes sócios, entregou pedido ao Ministério Público do Estado de São Paulo para que este entre com representação contra a bolsa. A justificativa é que estes sócios terão pesadas perdas no IPO, pois o valor dos seus títulos não foi corrigido.