Título: Com turbulências de todo tipo, o petróleo sobe
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/10/2007, Opinião, p. A14

As cotações do petróleo estão em alta, à busca de um novo patamar. A marca dos US$ 100 o barril, antes considerada catastrófica, hoje parece não apenas possível, mas algo a ser atingido em breve. Até agora, a economia mundial mostrou-se excepcionalmente resistente à elevação dos preços da commodity e a incógnita é se isso continuará sendo assim por muito tempo. Previsões neste campo são altamente inseguras, especialmente porque dependem do barril de pólvora político do Oriente Médio. A médio prazo, é possível estimar que as cotações pelo menos não têm fortes motivos para quedas significativas - ao contrário, a demanda se equilibra com a produção, o que abre espaço para turbulências a qualquer fato novo.

Há vários fatores empurrando as cotações para cima. O mais imediato deles é o agravamento das tensões no Iraque. O Parlamento turco aprovou a invasão do norte do Iraque para punir as expedições do PKK, a guerrilha curda que tem feito várias vítimas entre militares em incursões no território turco. A invasão pode não ocorrer, e, se ocorrer, ser limitada e breve, mas a simples ameaça se soma às más notícias que diariamente vêm do Iraque. O risco maior é a interrupção da produção do norte, a região mais rica em óleo do Iraque e que está nas mãos dos curdos, aliados dos EUA e participantes do governo iraquiano. O PKK atiça o conflito a partir de uma zona que é uma das mais estáveis dentro do conflagrado território iraquiano - apesar dos atentados e provocações da Al Qaeda.

Uma invasão turca acelerará o processo de balcanização do país e colocará ainda mais longe a possibilidade de o Iraque voltar ao nível de produção de petróleo anterior à queda do ditador Saddam Hussein, da ordem de 2,5 milhões de barris diários. Mais que isso, seria um revés forte para a diplomacia americana para a região, que fracassou abertamente em suas promessas de estabilizar o Iraque e sequer conseguiu colocar de pé algo parecido com um Estado.

O ritmo altista das cotações não depende apenas dos imprevisíveis lances da política no Oriente Médio. O tumulto nos mercados financeiros provocado pela crise do subprime deslocou recursos à procura de rentabilidade maior para o mercado de petróleo, onde os especuladores mantiveram, nos últimos anos, uma presença importante. Especuladores não teriam poder suficiente para sustentar cotações altas se não contassem com um equilíbrio altamente precário entre produção e oferta, que se manifesta há pelo menos três anos no mercado do petróleo. A persistência de preços altos indica, segundo vários analistas, o esgotamento do ciclo histórico do petróleo, com reservas cadentes e a sina de que seu papel como combustível está a caminho de se tornar secundário no espaço de uma geração.

Enquanto a economia mundial se mantiver aquecida, as cotações do petróleo repetirão o ciclo atual: as cotações, após um pico de alta, recuarão a um nível superior ao do recuo anterior. A forte demanda dos países emergentes, com a China e Índia à frente, sustenta também uma pressão altista em praticamente todas as commodities.

Há limites para que a alta do petróleo produza inflação, recessão ou uma combinação dos dois. Não está descartada a possibilidade de que, às voltas com um arrefecimento do mercado imobiliário residencial, a economia americana reduza um pouco mais seu crescimento (previsão de 1,9% para 2007) se o novo patamar das cotações do petróleo for repassado aos consumidores. Isto, entretanto, não é certo. As grandes empresas petrolíferas, apesar de terem seus custos de produção majorados, têm nos preços atuais margens fantásticas de ganhos, suficientes para sustentarem lucros esquálidos na distribuição, reduzindo um pouco o potencial inflacionário de um repasse integral.

Ao mesmo tempo, a desaceleração da economia dos EUA, que consomem um quarto da gasolina do planeta, é um dos fatores baixistas em curso. O aumento da produção do cartel da Opep a partir de novembro ajuda nesse sentido, mas é impossível, somado todos os fatores, contar com um petróleo mais barato no curto prazo.