Título: Brasil contra-ataca e vai à Ásia vender sapatos
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2007, Brasil, p. A3

Alessandro Teixeira: calçadistas têm de ir em busca de nichos de mercado Se não pode vencer o concorrente, venda seus produtos para eles, recomenda o presidente da Agência de Promoção de Exportações (Apex), Alessandro Teixeira, ao falar da China para os empresários do setor de calçados. Nem precisava: eles estão decididos a explorar o mercado asiático e já começaram a pesquisar as condições para a venda de sapatos de luxo à crescente classe média e aos ricos chineses. Neste domingo, partirá do Brasil, para a China e Japão, uma missão de 15 empresários brasileiros, que esperam firmar contratos de venda aos asiáticos.

"Há um enorme mercado crescendo na Ásia para sapatos femininos com preços entre US$ 40 a US$ 50", diz o consultor da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados) Ênio Klein. "Acostumamos a pensar na China apenas como competidor, mas, nos últimos cinco anos, ela ultrapassou os Estados Unidos como maior importador mundial de calçados."

Os calçadistas irão visitar os quatro maiores centros consumidores da China - Hong Kong, Pequim, Xangai e Guangzhu - para sondar o mercado de calçados sofisticados. O setor de inteligência comercial da Abicalçados coletou dados sobre os mercados da China continental, menos conhecidos, e vê espaço para ocupar prateleiras hoje repletas de sapatos dos Estados Unidos, Itália e Espanha.

"É uma mudança de paradigma, vamos exportar os sapatos por via aérea, por causa dos prazos das coleções de luxo", diz Klein. "O setor de calçados tem de sair da posição defensiva e buscar maior agressividade na exploração de nichos de mercado", reforça Alessandro Teixeira, da Apex.

Um pequeno número de empresários já descobriu o caminho, e o Brasil não está fora do mercado chinês de calçados, para onde foram enviados, este ano, pouco mais de 58 mil pares de sapatos, o que garantiu a modesta receita de US$ 926 mil em exportações ao país. O valor representa menos de 0,2% do que o Brasil vendeu ao seu maior comprador, os Estados Unidos. A quantia pode aumentar exponencialmente, acredita Klein, com a participação dos produtores brasileiros nas grandes feiras regionais realizadas na China, como as que a missão acompanhará.

"Temos a experiência do Japão, para onde nossas vendas estão indo muito bem ", comenta Klein, ao explicar que a China é parte de uma ofensiva que se dirige a todos os grandes mercados asiáticos, como Indonésia, Filipinas e Taiwan. O Japão já é o 25º maior consumidor de calçados brasileiros, com importações de quase US$ 5 milhões em 2007, até agosto.

A campanha da Apex pela participação nas feiras e maior agressividade na busca de compradores na China é uma mudança significativa em relação ao incipiente comércio de calçados brasileiros no país. Até agora, os fabricantes nacionais repetiam a tradição da indústria calçadista em mercados novos, de atender à demanda emergente, mais que buscar clientes novos.

Foi o caso da Bordallo, com sua marca Anatomic Gel, cujo representante em Londres foi abordado por um importador amigo com negócios na China. O interesse no sapato, com forro de couro de carneiro e sola de um tipo especial de borracha, rendeu à Bordallo um cliente disposto a pagar até US$ 260 pelo par do calçado. "O pessoal que tem poder aquisitivo maior não usa os produtos deles, importa tudo", diz o presidente da Bordallo, José Rosa Giacometti.

Ele diz que recebia pedidos de pequenos lotes, de até 300 pares por mês, volume que saltou para 2,5 mil. "Se continuar da maneira como está, estamos pensando em montar um distribuidor para o mercado local", diz Giacometti, que informa ter registrado na China a marca Anatomic Gel. O pagamento pelas vendas costuma ser à vista, diz ele, que se queixa apenas do hábito chinês de dividir os pedidos por muitos modelos em pequenas quantidades, o que torna mais difícil a produção. "Por enquanto, vendemos a eles o mesmo que colocamos no mercado interno, mas se aumentar a demanda, podemos pensar em modelos dirigidos àquele mercado", comenta.

Os empresários que viajarão à China no domingo são uma espécie de "missão exploratória", segundo Ênio Klein, da Abicalçados. "Na volta, pretendemos fazer um relatório e divulgar por todo o setor, para termos uma participação massiva no ano que vem", diz ele, que dividiu o grupo para participar da feira de calçados em Pequim, uma das maiores da China, pesquisar centros de venda em Xangai e Guangzhu e negociar em Hong Kong. Uma parte dos empresários irá também ao Japão, para uma feira, em Tóquio.

Entre os estudos coletados pela Abicalçados há diagnósticos do mercado de atacado e varejo nas grandes cidades chinesas e até análises sobre o comportamento dos consumidores locais, que se diferenciam significativamente, de acordo com a região. O consumidor de Pequim, por exemplo, é fascinado por marcas e conforto e presta pouca atenção ao preço quando encontra um produto que o satisfaz, enquanto os consumidores de Xangai têm restrições a produtos muito caros, embora dêem franca preferência a bens importados. As marcas dos Estados Unidos, Itália e Espanha dominam as faixas mais sofisticadas do mercado de calçados. Os chineses têm, em média, 4,2 pares de calçados cada e gastam quase 2% de sua renda per capita com a compra de sapatos. O consumo vem aumentando e se dirigindo para as faixas mais altas do mercado, aponta o estudo, da organização Chinashoeexpo.