Título: Oposição faz trégua para aprovar emenda que acaba com o voto secreto
Autor: Ulhôa, Raquel ; Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2007, Política, p. A7

A oposição do Senado decidiu suspender temporariamente a obstrução das votações - adotada em protesto ao presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL) - em troca do compromisso do governo para que o plenário vote, na sessão de hoje, projeto de resolução abolindo as sessões secretas em todas as decisões da Casa. Também faz parte do acordo iniciar a tramitação da proposta de emenda constitucional (PEC) que elimina o voto secreto.

O principal interesse da oposição é acabar com o sigilo das sessões e do voto nas decisões sobre cassação de mandato de parlamentar. Vetado pelos líderes do DEM e do PSDB, Renan não participou dos entendimentos, costurados pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).

Os líderes José Agripino (DEM-RN) e Arthur Virgílio (PSDB-AM), porém, não colocaram restrição à possibilidade de Renan presidir a Ordem do Dia de hoje. "O que nos interessa é o fim da sessão secreta", disse Virgílio. Com isto, o acordo pode representar uma vitória para o presidente do Senado, que em muitos meses conseguirá presidir uma sessão normal de votações. Renan Calheiros, porém, sofreu uma derrota ontem no Supremo Tribunal Federal.

A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, do STF, indeferiu, ontem, pedido do senador Almeida Lima (PMDB-SE) para a realização de voto secreto nas sessões do Conselho de Ética do Senado. Lima é aliado político do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que foi absolvido pelo plenário da Casa no dia 12, mas ainda enfrenta outras representações pela perda de seu mandato por suposta quebra de decoro parlamentar. Na votação da primeira representação no Conselho de Ética, a sessão foi aberta e a conclusão foi pela cassação de Renan. Já no plenário do Senado, a sessão foi fechada e Renan foi absolvido. Por isso, Almeida Lima queria que as próximas sessões do Conselho sejam fechadas, evitando novos desgastes ao presidente do Senado.

A ministra Cármen Lúcia explicou que o Regimento Interno do Senado e a resolução que criou o Conselho de Ética (nº 2, de 1993) não tratam da forma de votação no Conselho. Segundo ela, há previsão expressa apenas para a votação no plenário do Senado. Como não há previsão para a forma de votação no Conselho, Cármen Lúcia concluiu que deve ser dada publicidade às suas decisões.

Para destrancar a pauta, segundo o acordo de ontem, está prevista a votação de cinco medidas provisórias e um projeto de lei da Câmara que estão sobrestando a Ordem do Dia.

Um terceiro item incluído pelos líderes da oposição e aceito por Jucá é que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) comece a discutir hoje o projeto de resolução determinando imediato afastamento do cargo de integrante da Mesa Diretora e de dirigente de comissão permanente que for alvo de representação por quebra de decoro.

As três propostas foram transformadas em bandeiras da oposição como medidas para melhorar a imagem do Senado, em crise desde o início dos processos por quebra de decoro contra Renan.

Ele já foi julgado - e absolvido - no primeiro (uso de lobista de empreiteira em pagamentos pessoais), mas responde a outros três (atuação junto ao governo para perdão de dívidas da cervejaria Schincariol, compra de rádios e jornal em Alagoas por meio de "laranjas" e desvio de recursos em ministérios comandados pelo PMDB).

No entanto, nenhuma das três propostas da oposição poderá ser aplicada aos julgamentos de Renan. A única com chances de rápida votação é a que acaba com as sessões secretas, mas aliados do presidente do Senado recorrem ao princípio do Direito pelo qual nenhuma lei pode retroagir para prejudicar.

Duas delas - uso de "laranjas" na compra de emissoras de comunicação e esquema de arrecadação ilegal em ministérios do PMDB - ainda estão sem relatores. O presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, Leomar Quintanilha (PMDB-TO), estuda a possibilidade de reuni-los em um só processo. Aliados de Renan defendem que os dois processos sejam entregues a Almeida Lima (PMDB-SE), um dos três relatores do primeiro caso e o único a defender o arquivamento.

Hoje, o Conselho de Ética tem reunião marcada para discussão do caso Schincariol. O relator, João Pedro (PT-AM), confirmou que pedirá sobrestamento (paralisação) do processo até que o conselho de ética da Câmara conclua investigação sobre suposta participação do deputado Olavo Calheiros (PMDB-AL), irmão de Renan, no mesmo esquema.

"Sobrestar não é arquivar. É aguardar os desdobramentos e retomar os trabalhos a qualquer momento que os indícios apontarem o envolvimento de Renan", disse o relator.

Inicialmente, sua tendência era pelo arquivamento da representação, por falta de provas. Essa representação foi proposta pelo P-SOL, assim como a primeira, referente aos pagamentos a Mônica Veloso, com quem Renan tem uma filha fora do casamento. No primeiro caso, o pemedebista foi absolvido por 40 votos contra a cassação, 35 a favor e seis abstenções.

Renan negou ontem qualquer resistência ao fato de os líderes estarem negociando a pauta de votações sem sua presença. "Por acaso sou líder? Temos de buscar o entendimento", afirmou.

Mas Jucá, aliado de Renan, evitou a realização de uma reunião formal com líderes partidários para evitar a imagem que representaria o enfraquecimento do pemedebista como presidente da Casa. Além de obstruir a pauta, líderes do DEM e do PSDB decidiram não participar de reunião de líderes presidida por Renan, em protesto à sua permanência na Presidência do Senado. Essa pressão deve continuar, segundo eles, apesar da trégua temporária.