Título: Gol cobra R$ 184 milhões da VarigLog
Autor: Campass, Roberta
Fonte: Valor Econômico, 29/10/2007, Empresas, p. B2

Nem tudo é um céu azul cravejado de estrelas alaranjadas na história da aquisição da Varig pela Gol. Ao mesmo tempo em que apresentou na semana passada a nova identidade visual da tradicional empresa que comprou em abril, a Gol tenta cobrar dos antigos donos da Varig, a VarigLog, uma conta de R$ 184 milhões.

A existência da cobrança foi apurada pelo Valor. Questionada sobre o assunto na semana passada, uma alta fonte da Gol disse que o assunto se trata de um "acerto de pagamentos". A fonte negou-se a detalhar o motivo da cobrança alegando não poder ferir a cláusula de confidencialidade do contrato de compra estabelecido com a VarigLog. Não endossou o valor de R$ 184 milhões, mas também não contestou a informação.

Procurada, a VarigLog informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não comentaria o assunto. Segundo o Valor apurou, a empresa contesta a cobrança apresentada pela Gol. Pessoas próximas ao caso afirmam que as duas companhias estão tentando chegar a um acordo. Uma auditoria nas contas da Varig está prevista para levantar quais são, exatamente, os créditos e débitos entre as empresas.

Há sete meses, a Gol apresentou a aquisição como absolutamente blindada contra a herança de passivos da Varig. Não está claro se foram encontrados passivos inesperados desde então.

À época da aquisição, a Gol considerou que estava pagando um preço justo pela Varig. Com a cobrança, na prática, ela tenta reduzir o valor do negócio, que foi acertado em US$ 320 milhões - divididos entre o pagamento de US$ 98 milhões em dinheiro, R$ 100 milhões em assunção de debêntures mais a transferência de 6,05 milhões de ações preferenciais (PN) da Gol Linha Aéreas, a empresa de capital aberto.

Como garantia pela cobrança de R$ 184 milhões, a Gol tentou bloquear, por duas vezes, direta e indiretamente, os 4,5 milhões de ações PN que foram dadas à VarigLog. Não teve sucesso.

Esses papéis valem R$ 205,9 milhões, conforme a cotação de sexta-feira (R$ 45,76 por ação), mas, apesar de estarem em nome da VarigLog, se encontram custodiados no Banco Itaú. O contrato de compra e venda da Varig definia que as ações seriam liberadas em lotes, de tempos em tempos. Até agora, das 6,05 milhões de ações previstas como pagamento, a VarigLog só pôde acessar 1,5 milhão, sendo que deste total já vendeu cerca de 600 mil papéis.

Um dos agravantes do caso é que os 4,5 milhões de ações que a Gol tentou bloquear como garantia já estão bloqueados em juízo por causa de uma outra disputa, esta entre os sócios da Va- rigLog. O fundo americano MatlinPatterson, que detém 60% do capital total da VarigLog (20% das ordinárias), cobra supostas dívidas de US$ 186 milhões da própria VarigLog, por meio de ações judiciais. Na prática, o alvo da cobrança do MatlinPatterson são os três sócios brasileiros da VarigLog, Marco Antonio Audi, Luiz Eduardo Gallo e Marcos Haftel. Foi com esses acionistas que o fundo conseguiu formar a holding Volo do Brasil e adquirir, primeiro, a VarigLog e, mais tarde, a própria Varig. Como investidor estrangeiro, o MatlinPatterson não poderia ter mais de 20% das ações ordinárias de uma empresa aérea brasileira.

Como resultado de uma das ações que moveu, o fundo americano conseguiu bloquear os 4,5 milhões de ações da Gol que estão custodiadas.

Embora não tenha nenhuma relação direta com esse processo judicial, a Gol tentou impedir que o Matlin bloqueasse as ações. A companhia aérea chegou a entrar com uma petição para denunciar execução fraudulenta e pedir segredo de Justiça em relação à ação. A juíza do caso, Lucila Toledo Pedroso de Barros Menezes Gomes, negou o pedido, alegando no despacho que a Gol não era parte no processo de execução.

Após ter vendido uma pequena parte dos papéis, a VarigLog é oficialmente detentora de 5,44 milhões de ações PN da Gol. Elas representam quase 9% dos papéis que estão em circulação no mercado.

Recentemente, a Gol Linhas Aéreas, controlada pela família Constantino, confirmou que estuda o fechamento do seu capital, o que implicaria na tentativa de recompra de todos os papéis em circulação.

Desde que comprou a Varig, em abril deste ano, a Gol vem fazendo investimentos vultosos na empresa, especialmente para que ela retome os vôos internacionais. Até dezembro, a Varig reinicia a operação em cinco rotas para cidades da América Latina e Europa. Essas despesas somadas à queda nas taxas de ocupação do grupo resultaram, no segundo trimestre, num prejuízo de R$ 35,4 milhões, o primeiro desde que a Gol Linhas Aéreas abriu o capital em 2004. A compra da Varig foi um movimento ousado da Gol que alavancou a possibilidade de ela assumir a liderança do mercado aéreo, hoje nas mãos da TAM. Os principais atrativos do negócio foram os direitos às rotas internacionais e os slots detidos pela Varig em Congonhas.