Título: Meirelles admite risco de recessão em grau moderado nos EUA
Autor: Valor Online, Azelma Rodrigues
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2007, Finanças, p. C2

Ruy Maron / Valor Meirelles: "Não existe nenhum país do mundo que possa sair imune" Pela primeira vez desde o início das turbulências no mercado financeiro internacional, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, admitiu que o Banco Central considera que "existe, sim, um certo risco da economia americana entrar em recessão" que , se ocorrer, deverá ser "em grau moderado", mas afetará a economia global tanto em 2007 quanto em 2008, produzindo efeitos também no Brasil. "Não existe nenhum país do mundo que possa ser imune" a uma crise dessas, assinalou Meirelles, em pronunciamento na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, ontem.

Meirelles adiantou aos senadores que a queda sistemática da taxa básica de juros, até agora, está reduzindo de forma substancial o peso dos juros nominais apropriados pela dívida pública líquida.

Os indicadores relativos a agosto, que serão divulgados hoje pelo BC, mostram que em 12 meses até agosto o peso dos juros correspondeu a 6,2% do PIB, com queda de 0,25 ponto percentual em relação aos 6,45% do PIB em igual intervalo até julho. Segundo o BC, a proporção dos juros da dívida sobre o PIB era de 7,71% em 2002, subiu para 8,54% em 2003, caiu para 6,61% em 2004, subiu novamente para 7,32% em 2005, reiniciou o processo de redução para 6,89% do PIB em 2006 e, em 2007, nos 12 meses terminados em agosto, baixou para 6,20% do PIB, o que ainda é um patamar bastante elevado.

O presidente do BC esteve por quase quatro horas na CAE e inaugurou o que pretende que seja uma nova rotina, de prestar contas ao Senado a cada trimestre. O tema que dominou sua exposição de ontem foi a crise nos mercados e seus desdobramentos na economia internacional.

Para ele, há ainda muitas incertezas quanto à evolução da crise. Não se conhece o nível de contaminação dos bancos europeus e possíveis efeitos futuros sobre a economia real européia. É preciso esperar os vencimentos de alguns contratos de financiamento das hipotecas de alto risco que lastreiam a securitização, origem da crise dos subprime nos Estados Unidos. "Há informações ainda não totalmente conhecidas" , disse Meirelles sobre a possibilidade de " problemas mais sérios nos canais de crédito americano".

Segundo ele, a diretoria do BC trabalha, "desde o início da crise", em junho, com a probabilidade de uma desaceleração na economia americana. Meirelles empregou os dois termos, recessão e desaceleração. Disse que os países que direcionam grande parte de suas exportações para os EUA deverão ser os mais afetados. Questionado sobre a posição do Brasil, que tem nos EUA seu maior comprador externo, ele ressaltou que a diversificação do comércio exterior já reduziu para 17% a pauta de exportação brasileira aos EUA, enquanto a União Européia ainda vende aos americanos mais de 25% do total.

Ele não quis arriscar um prognóstico sobre os prejuízos que uma recessão americana poderão impor ao Brasil. Segundo Meirelles, o Brasil vai entrar em 2008 "com uma dinâmica positiva na economia", crescendo com base no aumento do consumo interno, no aumento da renda e do crédito. Há uma situação fiscal de equilíbrio e, hoje, o país está mais preparado para enfrentar turbulências externas e deverá receber o selo de grau de investmento em um ou dois anos.

Apesar da queda da taxa básica de juros, Meirelles admitiu que a redução dos juros ao consumidor não tem ocorrido na mesma proporção. "A economia ainda não sentiu toda a trajetória de redução da Selic", afirmou, alegando que boa parte dessa lentidão se deve à diversificação de clientela bancária, com a expansão do crédito de 21% em 2002 para 33% do PIB em agosto deste ano. Debaixo de críticas contra as tarifas bancárias - cujos preços são elevados "pela gulodice e roubalheira" dos bancos, na visão do senador Valter Pereira (PMDB-MS) -, Meirelles reiterou que "a transparência e a concorrência" podem amenizar esse problema, mas o BC prefere que as tarifas não sejam tabeladas.

Segundo ele, está em estudo um sistema de padronização de nomenclatura das tarifas bancárias, para maior transparência aos clientes. O presidente da CAE, senador Aloizio Mercadante (PT-SP), informou que convocou a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) para explicar a discrepância entre juro bancário e tarifas em relação à Selic.

Meirelles recebeu elogios de vários senadores, como Jefferson Peres (PDT-AM), que chamou o BC de "guardião pit bull" da moeda. Ele disse ao senador que "todos querem juros e depósitos compulsórios mais baixos", mas a autoridade monetária está compromissada com o controle da inflação. Portanto, o compulsório de 45% dos depósitos à vista dos bancos recolhidos ao Banco Central sem remuneração continua como está.