Título: Petrobras não cumpriu metas de expansão
Autor: Góes, Francisco; Magalhães, Heloísa
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2007, Brasil, p. A4

Em 2007, a Petrobras entregou ao mercado um volume médio de gás natural de origem nacional inferior ao do ano passado e também não cumpriu as metas fixadas por ela mesma para a produção do insumo no país. Analistas ouvidos pelo Valor consideram que se a estatal conseguisse cumprir os cronogramas de produção a situação atual entre oferta e demanda do insumo seria mais confortável.

De janeiro a setembro, o volume de gás natural nacional disponível ao mercado foi de 26,6 milhões de metros cúbicos por dia, volume 3,4% menor do que os 27,5 milhões de metros cúbicos/dia disponibilizados no mesmo período do ano passado, segundo a Agência Nacional do Petróleo (ANP). O número também é inferior à entrega de gás natural prevista no plano estratégico da Petrobras 2007-2011, no qual a empresa projetava um volume de 34,1 milhões de metros cúbicos/dia para 2007.

Na revisão do plano estratégico para o período 2008-2012, este número não aparece. Mas segundo Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), o volume de gás natural nacional disponível de janeiro a setembro deste ano é cerca de 12,5% inferior aos 30,4 milhões metros cúbicos/dia previstos pela Petrobras para 2007, segundo apresentação feita pela estatal em abril sobre os desafios da área de exploração e produção no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

"A Petrobras tem um problema na área de exploração e produção pois nunca cumpriu os cronogramas de disponibilizar o gás no volume prometido. Ela promete e não cumpre", diz uma fonte graduada próxima da estatal. O não cumprimento da meta é explicada pelo aquecimento da indústria de petróleo e gás natural. Com o petróleo em alta, perto de US$ 100 por barril, as empresas aceleram o desenvolvimento de novos campos de produção. O resultado é a dificuldade em contratar serviços e equipamentos para novos projetos, que ficam mais caros.

Entre os analistas, há quem considere ainda que a preocupação com a autosuficiência na produção de petróleo deixou o aumento na produção de gás em segundo plano. O diretor de exploração e produção da Petrobras, Guilherme Estrella, disse ao Valor, por meio de sua assessoria de imprensa, que em setembro e outubro foram entregues 27,5 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia. Ele reconheceu que a empresa enfrentou problemas operacionais em grandes plataformas produtoras de gás, como P-43, P-48 e P-50.

Segundo Estrella, os problemas na P-43 foram resolvidos, enquanto na P-48 e P-50, a plataforma símbolo da autosuficiência, todas as questões pendentes estarão equacionadas até o fim deste mês. Ele acrescentou que já estão em produção ou fase final de instalação os projetos de produção de Manati, Golfinho, módulo dois, Peroá-Cangoa, fase dois, e das plataformas P-52 e P-54, no campo de Roncador, na Bacia de Campos (RJ).

Estrella também previu que a conclusão da infra-estrutura do gasoduto Cacimbas-Vitória-Cabiúnas, prevista até dezembro, vai permitir aumento na entrega de gás natural. Entre os analistas, porém, há consenso de que o Brasil vive uma crise de energia no setor elétrico e na área de gás que não se resolverá logo. A preocupação é como atender a demanda por gás nos mercados comercial e industrial dada a necessidade de "reservar" o insumo para a geração de energia nas usinas térmicas.

Observadores do setor de gás natural avaliam, ainda, que fica cada vez mais difícil acreditar no cumprimento das metas do Plano de Aceleração da Produção de Gás (Plangás), lançado em 2006 e que previa ampliar a produção no Sudeste para 49,4 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia já em 2008. "Se chegar a 35 milhões de metros cúbicos/dia já vai dar um fôlego", disse um analista.

"Ao invés de tirar gás da indústria, o governo devia assumir que houve um erro de planejamento (no modelo do setor elétrico), o que tem um custo, e despachar térmicas a óleo combustível", disse Marco Aurélio Tavares, sócio-diretor da consultora Gás Energy. Para ele, é preciso uma legislação que permita a entrada de novos players e a abertura efetiva do mercado de gás, hoje na mão da Petrobras. Desta forma reduziriam-se os riscos de problemas de oferta pelo fato de a Petrobras ter deixado de cumprir as metas previstas.

Tavares disse que a oferta atual de gás natural no país, da ordem de 50 milhões de metros cúbicos/dia, considerando o gás nacional vendido pela Petrobras mais importações do gás boliviano, representa uma escala razoável para atrair novos ofertantes para o mercado. O problema, segundo ele, é que a Lei do Gás, a ser enviada ao Senado nos próximos dias, não estimula investimentos de novas empresas no setor.

Pires, da CBIE, avalia que o corte de gás feito na semana passada à CEG, CEG Rio e Comgás é uma atitude preventiva na véspera do início do período de chuvas. Segundo ele, se não chover o suficiente pode-se chegar a abril em situação complicada nos reservatórios para uso da água pela geração hídrica. "O racionamento de gás foi provocado pelo medo de não ter energia elétrica mais à frente", afirmou.

Faltou, por outro lado, segundo ele, planejamento no setor de gás porque o consumo vem crescendo desde 2003, estimulado pelo governo que congelou preços e criou um programa de massificação de uso do insumo. A solução para o problema passa, segundo ele, pelo aumento do preço do gás como forma de conter a demanda. Sylvie D'Apote, diretora associada da área de gás da Cambridge Energy Research Associates (Cera) para a América do Sul, avalia que a curto prazo há pouco o que fazer pelo lado da demanda de gás natural. Pode-se fazer aumento de preço ou limitar os volumes de gás vendidos. "Vamos ter que rezar por chuva." (Colaborou Vera Saavedra Durão)