Título: CAE votará mudanças na Lei de Licitações
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2007, Política, p. A9

Os senadores que integram a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) podem votar hoje o parecer sobre o polêmico projeto que muda a Lei de Licitações e obriga o uso dos pregões na escolha de fornecedores para obras de até R$ 3,4 milhões. A exigência seria válida nos casos onde o critério do menor preço é decisivo. O pregão é uma modalidade mais simplificada de licitação onde os fornecedores participam de um leilão às avessas, oferecendo lances sucessivos e menores.

Há muita resistência a essas mudanças. De um lado, o governo acredita que os pregões vão ampliar a concorrência e baixar preços. No projeto enviado pelo Executivo ao Congresso - integrou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - essa modalidade de licitação estava prevista para as contratações de até R$ 51 milhões. Suplicy acabou acatando a redução do limite porque não havia consenso na CAE em torno da proposta do Executivo.

Mas do outro lado estão os que alertam para o aumento dos riscos para o poder público. Marçal Justen Filho, advogado, professor e especialista em licitações, prevê, apesar das boas intenções, "resultados catastróficos". Ele explica seu temor argumentando que generalizar o uso dos pregões pode garantir preços menores, mas, por outro lado, se desprezaria a qualidade. "O pregão é inviável para licitações mais complexas. Quem conhece o assunto sabe que vai ser um caos e a legislação terá de voltar aos padrões atuais. O pregão dificulta a verificação da capacidade do fornecedor e da qualidade do bem ou serviço oferecido", adverte.

Opinião diferente tem o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna. Ele afirma que o texto enviado pelo governo foi "aperfeiçoado" no Congresso. Contestando os argumentos de Justen Filho, diz que a ampliação da concorrência é um grande avanço, o que garante preços menores nas licitações.

O secretário cita um estudo europeu que revela chances reduzidas de formação de cartel ou acordo entre concorrentes quando há mais de sete participantes nesses processos públicos de contratação. "No âmbito federal, os pregões têm média de 12 participantes", informa.

As críticas à generalização dos pregões não são as únicas. O advogado afirma que o país perde uma grande oportunidade de aperfeiçoar as normas sobre contratos administrativos, no sentido de reduzir os privilégios estatais. Como exemplo, cita o direito de o poder público pagar em até 30 dias depois de receber o objeto licitado. "Na prática, os empresários ficariam muito felizes se recebessem em 30 dias porque, infelizmente, o atraso nos pagamentos é muito maior", lamenta. Justen Filho conclui que esse privilégio do contratante acaba voltando-se contra ele quando os fornecedores elevam seus preços para compensar o risco que correm.

Santanna contesta essa crítica afirmando que o mercado sabe muito bem quem é mau pagador. Na opinião dele, a modalidade pregão é adequada para os processos onde prevalece o critério do menor preço. Prova disso, diz, é o fato de o Tribunal de Contas da União (TCU) utilizar largamente os pregões. Mas ele alerta que contrato prejudicial à administração pública é conseqüência da má qualidade do edital.

Pressionada por essas polêmicas, a CAE pode votar hoje o parecer do senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Além da obrigatoriedade do pregão em contratos de até R$ 3,4 milhões, há a possibilidade da inversão de fases, quando as propostas de preços são reveladas antes da qualificação dos fornecedores.

Justen Filho critica o que chama de "insistência" na inversão de fases. Explica que a Lei 8.666/93 prevê, na modalidade pregão, a apresentação simultânea de dois envelopes. O primeiro a ser aberto é o que tem documentos sobre a capacidade do fornecedor. O outro apresenta a proposta econômico-financeira. Na sua avaliação, o que ocorre nas inversões é uma inclinação da administração pública em tolerar problemas sobre a capacidade do licitante quando a proposta comercial é atraente.

No projeto, a administração pública também poderia decidir quando as fases seriam invertidas. Mas o advogado argumenta que esse artifício deveria ser reservado a casos excepcionais. Ele alerta que é inviável aplicar esse mecanismo na contratação de obras e softwares, por exemplo. Justen Filho admite a inversão de fases nos pregões cujos objetos podem ser fornecidos sem verificar a qualificação do licitante. Cita o caso hipotético da compra de aviões. Como os poucos fabricantes em todo o mundo são grandes empresas de alta tecnologia e alcance global, o poder público poderia, em tese, abrir as propostas comerciais em primeiro lugar.

"A Lei de Licitações precisa ser aperfeiçoada, principalmente quando trata de obras e serviços de engenharia. Há muitas barreiras que impedem a participação de pequenas e médias empresas", reconhece o advogado.

O parecer de Suplicy também prevê um limite de 50% para o peso da técnica nos editais que exigem a composição entre técnica e preço. Outro ponto importante da proposta é a exigência de garantias quando o fornecedor reduz sensivelmente seu preço. Para evitar "aventureiros" ou "inexperientes" em licitações, seria exigida garantia nos casos onde o fornecedor aceita preço menor que 85% do valor previsto no edital. Essa garantia seria de 4% a 10% do valor do contrato.