Título: O povo paga
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Fonte: Correio Braziliense, 17/01/2011, Opinião, p. 12

O contribuinte vai pagar a maior parte de tudo que foi gasto na campanha eleitoral de 2010, a mais cara da história republicana. Em manobra discretamente engendrada durante a tramitação do Orçamento Geral da União, o Congresso Nacional aprovou inexplicável aumento da verba para a manutenção do Fundo Partidário: 65,6%, acrescentando de uma só vez nada menos do que R$ 105 milhões aos R$ 160 milhões gastos em 2010, quantia que deveria ser mantida este ano. O aumento só perde para os escandalosos 126% que os mesmos parlamentares usaram para reajustar os próprios salários.

Trata-se de verdadeira excrescência se comparado o aumento de verbas ao que vinha sendo praticado nos últimos oito anos. De fato, de 2002 até 2010, o dinheiro público distribuído aos partidos tinha evoluído de R$ 131 milhões para R$ 165 milhões. Nesse período houve até pequena redução entre 2009 (ano de pagar as despesas com as eleições municipais) e 2010 (sem eleição), quando foram economizados R$ 5 milhões do dinheiro recolhido em impostos pela União.

Certos de que não seriam aplaudidos por mais esse golpe no erário para cobrir os custos de suas extravagâncias de campanha, os líderes partidários e a relatora do Orçamento 2011, senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) mantiveram sob sigilo ¿ sabe-se agora ¿ que vinham negociando a manobra desde outubro, isto é, logo depois do primeiro turno. Naquela altura já era notório que os gastos tinham ido muito longe. Terminada a disputa, as informações prestadas à Justiça Eleitoral indicavam que as campanhas dos dois candidatos ao segundo turno terminaram com deficits milionários.

Os contribuintes mais experientes desconfiaram de para quem ia sobrar essa conta. Tinham razão de esperar pelo pior. Os partidos, é claro, não confirmam nem sob tortura que vão gastar o exagerado aumento da ¿ajuda¿ pública para a quitação das dívidas. Não é isso que sugerem os números. A distribuição do Fundo Partidário segue critérios de densidade.

O maior aumento vai para o PT: R$ 16,11 milhões, elevando para R$ 42,85 milhões a participação no fundo. Por acaso, só o aumento cobre 60% da dívida de campanha do partido. O PMDB ganha a segunda maior fatia: R$ R$ 33,09, incluído o aumento de R$12 milhões de aumento. Já o PSDB, que fechou a campanha de seu candidato a presidente da República com dívida R$ 9,6 bilhões, terá verba total de R$ 30,34 milhões, contando com a verba extra de R$ 11,41 milhões.

Como garotos surpreendidos em ato reprovável, os líderes partidários na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (PT-SP) e João Almeida (PSDB-BA), e a própria relatora Slhessarenko, procurados por jornalistas, livraram-se do aperto com o inconsistente e comprometedor argumento de que o aumento foi aprovado por unanimidade. É o mesmo em que se basearam para se autorreajustarem em 126%. E é também o mesmo que não conseguem alcançar para discutir como adultos à luz do dia e aprovar ou negar, em termos republicanos, a oficialização do financiamento público de campanhas. Se o combinado não é caro, o dissimulado é desonesto, desrespeitoso e inaceitável.