Título: Captações externas despencam
Autor: Lucchesi ,Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2007, Finanças, p. C1

A crise de liquidez no mercado internacional reduziu as captações externas de empresas, bancos e governo brasileiros a US$ 2,215 bilhões no terceiro trimestre deste ano, o menor valor desde os últimos três meses de 2002, em plena crise eleitoral, segundo o Valor Data. São considerados os títulos de renda fixa e os empréstimos externos sindicalizados (com a participação de mais de um banco). As operações bilaterais não estão incluídas no levantamento.

Diferentemente do que aconteceu em 2002, no entanto, as linhas de crédito bancário externo continuaram disponíveis ao país no terceiro trimestre, com exceção de um ou dois dias de maior tensão no mercado em meados de agosto. Mas, os prêmios de risco cobrados subiram. O risco-Brasil medido pelo contrato de derivativo de crédito (CDS) de vencimento em cinco anos, que chegou a 61,4 pontos básicos antes da crise, no dia 19 de junho, subiu para 154,50 pontos básicos em 16 de agosto. Com o corte de 0,5 ponto percentual nos juros básicos americanos pelo Fed, banco central dos Estados Unidos, para 4,75% ao ano, no dia 18 de setembro, o risco-Brasil veio caindo para chegar a 83,1 pontos ontem.

Os maiores emissores brasileiros, quase todos com sobra de caixa, evitaram aceitar a elevação de custos e preferiram ficar fora dos mercados à espera de maior estabilidade. A Usiminas adiou operação de US$ 250 milhões para investimento. A Cyrela e o Banco Schahin suspenderam captações. O Tesouro não lançou títulos no exterior no trimestre.

A paradeira aconteceu depois de um primeiro semestre excepcionalmente forte em captações brasileiras no exterior, quando empresas e o Tesouro aproveitaram a queda no risco-Brasil para níveis nunca antes vistos e anteciparam rolagem de dívida. O primeiro semestre foi tão forte que, apesar na queda do terceiro trimestre, o total no ano até setembro foi a US$ 21,563 bilhões, 12% mais do que os US$ 19,224 bilhões dos nove primeiros meses de 2006.

"Os bancos internacionais passaram a pagar mais em suas captações e quiseram repassar esse aumento de custo para os tomadores brasileiros", diz Alexandre Leonel de Rezende, diretor do banco de investimentos e corporate do ING. "Diante disso, as empresas com sobra de caixa evitaram captar", diz.

As operações de empréstimo externo que se mantiveram no mercado estão fechando normalmente, como as da Imcopa, Banco Fibra e Quatro Marcos, no total de US$ 415 milhões. A Gerdau, que foi pega pela crise bem no meio da aquisição da americana Chaparral, logo após tomar US$ 4,6 bilhões, desistiu de rolar o empréstimo-ponte no mercado americano. Teve de pagar prêmios de risco maiores, de 1,25% sobre a Libor, taxa interbancária de Londres, para o prazo de seis anos em operação vinculada à exportação. Mas, está conseguindo atrair forte demanda dos bancos para participação no empréstimo de US$ 2,7 bilhões distribuído neste momento pelos líderes ABN AMRO, JPMorgan e HSBC.

"O mercado continua buscando ativos de qualidade", diz João Teixeira, vice-presidente executivo do ABN AMRO. "Mas, o cenário ainda não é de céu de brigadeiro", diz. O WestLB do Brasil acaba de dar garantia firme para operação de empréstimo de US$ 775 milhões para uma aquisição, revela Angélica Wiegand, chefe da área de finanças estruturadas e corporativas. "A disposição de emprestar para o Brasil é grande, pois o país está saudável economicamente e foi pouco atingido pela crise", afirma. "A cautela persiste, porém."

As operações de lançamento de títulos foram as que mais sofreram com o contágio da crise de crédito. O mercado de capitais permaneceu fechado para países emergentes em agosto e na maior parte de setembro. Após o corte de nos juros americanos, o mercado reabriu. O Grupo Rede conseguiu lançar perpétuos (sem vencimento final) de US$ 175 milhões e a GP Investimentos colocou US$ 40 milhões em perpétuos.

Segundo o "Financial Times", os emissores de maior risco de crédito ("high-yield") nos EUA também paralisaram o lançamento de empréstimos e títulos no terceiro trimestre, com o total captado no mais baixo nível desde 2002. Apenas US$ 9 bilhões em bônus foram vendidos. No mercado de empréstimos de "high-yield" , foram vendidos US$ 9,4 bilhões na semana passada tomados para a aquisição da First Data pelo fundo de private equity KKR. Os bancos aceitaram perdas - o preço foi de 96% a 97% do valor de face -, além de manterem US$ 5 bilhão nos seus balanços. Em compensação, os emissores grau de investimento dos EUA - que têm o selo de investimento não-especulativo - emitiram em setembro o recorde de US$ 94,2 bilhões em eurobônus, de acordo com a Thomson Financial. A razão: o mercado de curto, dos commercial papers, continua conturbado.