Título: Empresas vão exportar menos para reduzir perdas
Autor: Landim ,Brasil ; Bueno ,Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 21/11/2007, Brasil, p. A6

Sergio Baccaro Junior, da West Coast: parte da produção será transferida para outros países em 2008 Os exportadores de produtos manufaturados argumentam que chegaram ao limite. A estratégia adotada por muitas empresas para enfrentar a contínua valorização do real combinou reajuste do preço em dólar, aquisição de insumos importados, ajuste de custos e até demissões. Com o dólar a R$ 1,80, contudo, a solução encontrada por diferentes setores é reduzir as vendas para outros países ou produzir fora do Brasil.

A Máquinas Ferdinand Vaders (Feva), especializada em equipamentos para fabricação de embalagens, deve vender quatro a cinco unidades fora do país este ano, informa o gerente de exportação, Geraldo Constantino. No pico das exportações, a empresa embarcou 25 máquinas por ano. Para compensar a valorização cambial, a empresa reajustou em 50% o preço de suas máquinas e demitiu 30% dos funcionários. "Não tenho mais onde apertar os custos", diz Constantino. "É impossível competir com as máquinas da Argentina, onde o dólar está a 3,10 pesos".

Segundo o executivo, a Feva investiu no mercado externo nos últimos anos e dirigia 70% da produção para o exterior, percentual hoje em 30%. Constantino conta que a empresa, com sede em Cotia (SP), está se recuperando e voltou a contratar, devido ao aquecimento do mercado interno. Ele estima, porém, que o volume de produção só estará normalizado no primeiro trimestre de 2008.

A West Coast, fabricante de calçados masculinos com sede em Ivoti (RS), vai iniciar, até janeiro, a produção em fábricas terceirizadas na Argentina, Índia e Guatemala. Serão cerca de 25 mil pares por mês, destinados inicialmente aos respectivos mercados. A operação havia sido anunciada em julho e, conforme o gerente de marketing, Sérgio Baccaro Júnior, ainda não é possível prever evolução dos volumes fabricados no exterior. "Está muito difícil montar estratégias até para o médio prazo", diz.

A empresa se defendeu das oscilações cambiais com operações de "hedge" que cobrem todo o exercício de 2007. Segundo Baccaro Júnior, a proteção permitiu a manutenção dos preços e do nível de produção na faixa de 180 mil pares por mês, sendo 30% destinados ao mercado externo, apesar da oscilação do câmbio. A West Coast tem 350 empregados e como a produção que será transferida para o exterior já é terceirizada no Rio Grande do Sul, não haverá demissões.

Após uma série de negociações, a Cerâmica Vila Rica, de Andradas (SP), que exporta pratos, xícaras e travessas, conseguiu reajustar em 5% seus produtos. "Com a recente valorização do real, já perdemos esse percentual", diz Danilo Marcon, diretor-comercial da empresa. Ele afirma que pretende reduzir em pelo menos 20% as vendas da empresa para o exterior em 2008.

"Não estou renovando contratos. Prefiro transferir essa produção para o mercado interno", diz. Marcon foi surpreendido pelo dólar a R$ 1,80. No fim de 2006, calculou a venda para um cliente na Rússia com o dólar acima de R$ 2,0. Ele reclama que, apesar de importado, o gás que utiliza para manter acesos os fornos da empresa (e que vem da Bolívia) subiu de preço.

Para o vice-presidente da Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB), José Augusto de Castro, o dólar a R$ 1,80 surpreendeu muitos setores. "Nem o mais pessimista dos analista de comércio exterior previa isso", diz. Ele afirma que esse nível de câmbio afeta a expectativa das empresas, que se voltam para o mercado interno.

De acordo com Domingos Rigoni, presidente da Movelar, fabricante de móveis, a empresa promoveu dois reajustes de preços em fevereiro e em junho, mas eles não foram suficientes para compensar o câmbio. Ele planejava aumentar em 30% as exportações e agora já estima uma queda de 20% em relação a 2006.

A Montana, fabricante de máquinas, tratores e implementos agrícolas com sede em São José dos Pinhais (PR), pretendia que as exportações representassem 35% do faturamento de 2007, mas está reduzindo essa meta. A gerente de negócios internacionais, Edla Pavan, conta que renegociou as vendas que não foram entregues. Por dois motivos: queda do dólar e aquecimento do mercado interno.

Segundo ela, 7% dos contratos tinham hedge com bancos e para o restante a intenção é conseguir reajuste de 8% ou adiar o embarque para os meses de dezembro, janeiro e fevereiro, quando a demanda interna cai. Até agora a estratégia deu certo com um cliente da Venezuela, que comprou US$ 600 mil e aceitou o reajuste.

Para o semestre, a Montana esperava trabalhando com dólar a R$ 1,90 e os produtos foram reajustados de 15% a 25%. "Minha maior justificativa é a desvalorização, mas não é todo cliente que aceita mais aumentos", diz Edla. Em 2005 e 2006, a empresa teve queda de 50% nas vendas domésticas devido à crise na agricultura. Por isso, buscou mercado em outros países.

A empresa, por questões estratégicas, quer manter os clientes conquistados. Mas a gerente informa que cada contrato está sendo analisado e em alguns casos vale a pena perder vendas, principalmente se a quebra do contrato não envolve multas. Outra estratégia é a busca de mais fornecedores externos - eles representam 12% dos componentes usados e a meta é chegar a 17%.

O dólar cada vez mais baixo também preocupa empresários do setor joalheiro que estão vendo suas margens de rentabilidade serem engolidas. A jóia tem seu preço atrelado às cotações internacionais, em dólar, das principais matérias primas: ouro e pedras preciosas. "A mercadoria que você compra hoje tem um preço menor quando você consegue vendê-la para o consumidor final", diz Raimundo Vianna, presidente da Ajomig, a associação de fabricantes de jóias de Minas Gerais.

O câmbio, diz ele, ainda não prejudicou os negócios externos das dez indústrias mineiras que exportam. Mas as empresas perderam rentabilidade e a receita de exportações tem um impacto cada vez menor no faturamento.