Título: Fidelidade imposta pode enfraquecer partidos, diz especialista
Autor: Felício , César
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2007, Política, p. A8

Os partidos poderão ficar mais frágeis, e não mais fortes, caso o Supremo Tribunal Federal acate a tese de que os parlamentares que trocaram de partido desde a eleição devem perder seus mandatos. O efeito paradoxal é apontado pelo cientista político Jairo Nicolau, diretor de ensino do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). E a razão é a falta de simetria que a nova regra teria. A troca de partido continuaria livre para as lideranças políticas que estão sem mandato eletivo.

"Isto pode levar a correntes políticas regionais se dividirem. Uma parte permaneceria em um partido, para preservar os mandatos, e a outra migraria. E assim os partidos correm o risco de se fragmentarem em facções que seriam comandadas de fora", disse Nicolau.

Outra questão a ser aberta com uma decisão dura do STF sobre o tema diz respeito à substituição dos titulares. "Um suplente que trocou de partido não teria direito a assumir a cadeira? Mas como ele seria punido se a troca aconteceu sem que ele tivesse o mandato eleitoral?", indagou.

Segundo Nicolau, não há exemplos internacionais de países que adotam a fidelidade partidária de modo tão rígido. "Nos sistemas partidários consolidados, os parlamentares não trocam de partido porque isso está fora do cálculo político, e não porque é proibido", afirmou.

Para o cientista político, a tese de que o mandato proporcional é do partido, e não do eleito, não se sustenta com o formato da eleição parlamentar existente no Brasil. "O modelo do voto proporcional com lista aberta, por um lado, e a possibilidade de coligações partidárias, por outro, esvaziam a importância do partido no momento de o eleitor fazer sua escolha", disse.

A fluidez de alianças também tiraria o peso dos partidos. "Aqui no Rio, por exemplo, o prefeito César Maia (DEM) retirou seu apoio ao candidato tucano à presidência, Geraldo Alckmin, no segundo turno de 2006 quando este recebeu o apoio do ex-governador Anthony Garotinho (PMDB). Agora o prefeito está fazendo um acordo eleitoral com Garotinho. Diante disso, como condenar quem sai de um grupamento político para o outro?", indaga.

Segundo Nicolau, uma decisão favorável do STF ao pedido do PSDB, DEM e PPS para reaverem seus mandatos irá reforçar a tendência do Judiciário de legislar sobre o tema eleitoral, atropelando o Legislativo.

"Diante do silêncio do Congresso Nacional sobre o tema, o Judiciário opera. Isso aconteceu recentemente com a verticalização das coligações, com as restrições a showmícios e outros atos de propaganda na campanha eleitoral e ao derrubar a cláusula de barreira. O problema é que termina antes errando do que acertando", opinou.

No caso da regra da verticalização, lembra Nicolau, os partidos evitaram estabelecer coligações nacionais para ficarem com alianças livres nos Estados, o que reduziu o número de candidatos na eleição presidencial. "A regra da verticalização regionalizou as questões nacionais nas eleições em que vigorou", disse. A regra existiu nas eleições de 2002 e 2006.