Título: MP 232 dificulta devolução e compensação de impostos
Autor: Marta Watanabe
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2005, Brasil, p. A3

Ao restringir os poderes dos Conselhos de Contribuintes, a Medida Provisória (MP) nº 232/2004 tirou das empresas a oportunidade de levar importantes questões tributárias a um órgão que vem dando muitas decisões favoráveis aos contribuintes. A MP estabelece que os conselhos não devem mais analisar pedidos de restituição ou de compensação de tributos, em que as companhias descontam das cobranças a vencer os impostos e contribuições pagos no passado. Esses processos terão o julgamento somente em primeira instância, esfera na qual apenas 2% das decisões são favoráveis às empresas. As discussões sobre restituição e compensação costumavam ser avaliadas em segunda instância, que são os Conselhos de Contribuintes, órgão no qual as empresas ganham em pelo menos metade dos casos. Não são poucas as empresas que solicitaram ou discutem a compensação ou restituição de tributos federais. Entre elas estão Natura, Petroquímica União e Copesul.

Membro do Primeiro Conselho de Contribuintes até 2003, o tributarista Edison Fernandes, do escritório Fernandes, Figueiredo Advogados, diz que os processos de restituição e compensação são significativos para as empresas. "Seguindo a nova regra, apenas 15% dos processos que acompanho serão analisados pelo conselho", diz ele. "As empresas deixarão de ter muitos de seus processos analisados por um órgão mais técnico, que é o Conselho", diz Roberto Quiroga, do Mattos Filho Advogados. Os tributaristas explicam que há muitas cobranças que já foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal (STF) há dez anos mas só recentemente as empresas compensaram o que foi pago a mais. Ou porque optaram por usar os valores somente agora ou porque alguns detalhes sobre a cobrança estavam sendo questionados em processos que só chegaram ao fim recentemente. De uma forma ou de outra, são processos representativos. A Natura, por exemplo, compensou somente no ano passado o Programa de Integração Social (PIS) pago com base em dois decretos-leis - de nº 2.445/1988 e 2.449/1988 - que valeram entre 1988 e 1995. São R$ 11,9 milhões que ficam sujeitos a processo administrativo e representam mais de um quinto dos R$ 48,7 milhões que a empresa tem provisionados para questões tributárias, de acordo com o último balanço consolidado divulgado pela empresa. A fabricante de cosméticos possui ainda 14 processos de compensação ainda não homologados pela Receita Federal relativos à compensação de R$ 3,08 milhões de um antigo tributo, o Imposto sobre Lucro Líquido (ILL). O imposto foi considerado inconstitucional para todos os contribuintes por meio de Resolução do Senado em 1996, mas a Natura compensou o tributo apenas em 2000. A empresa resolveu não provisionar o valor por acreditar que o êxito da discussão é possível. Procurada, a Natura diz que a MP nº 232/2004 contribui para o esvaziamento do Conselho, já que o órgão não analisará mais processos de compensação e restituição de tributos federais. A Natura diz que possui diversos processos de compensação e restituição de tributos federais que certamente seriam analisados pelo Conselho de Contribuintes. A empresa mantém as expectativas de sucesso nas discussões administrativas mencionadas no balanço, mas informa que os processos poderão demorar mais tempo do que o previsto inicialmente. A companhia informa ainda que procurará o direito à restituição ou à compensação no Judiciário caso a decisão de primeira instância não lhe seja favorável. Com R$ 26,45 milhões em provisão para questões fiscais no balanço consolidado de setembro, a Petroquímica União (PQU) possui uma discussão sobre compensação de PIS semelhante à da Natura. A petroquímica compensou os valores recolhidos entre 1988 e 1995 durante o primeiro semestre de 2002. A discussão significa R$ 11,33 milhões já provisionados, com valores atualizados pela Selic. A companhia preferiu não se manifestar em relação aos efeitos da MP nº 232/2004. A Copesul (Companhia Petroquímica do Sul) registra em seus balanços consolidados de setembro uma expectativa de restituição a longo prazo do Imposto sobre Lucro Líquido. A empresa gaúcha informa que recolheu o tributo de 1989 a 1991 e, em 2001, ingressou com pedido de restituição do imposto junto à Receita Federal. A solicitação vale R$ 47,7 milhões e representa quase metade dos R$ 108,94 milhões de tributos que a companhia informa que deverá recuperar a longo prazo. Procurada, a empresa não retornou. O advogado Edison Fernandes lembra que mesmo nos casos em que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que os tributos cobrados numa determinada época eram inconstitucionais - como é o caso do PIS dos decretos-leis e do ILL -, os processos administrativos discutem detalhes importantes. São questões de prazo para compensar ou restituir, de definição de base de cálculo e de correção que podem fazer grandes diferenças. "São discussões que podem determinar se o resultado da discussão será débito ou crédito para a empresa." "A MP restringe o acesso ao Conselho de Contribuintes e fará com que as empresas procurem o Judiciário", diz Cláudio Vaz, presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp). A expectativa dele é que a previsão possa ser negociada em fevereiro, quando a MP nº 232/2004 deve ser discutida no Congresso. "Como essa questão não afeta a arrecadação tributária imediata, a expectativa é que ela seja negociada mais facilmente do que as demais previsões da MP."