Título: Alerta que não chega ao destino
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Fonte: Correio Braziliense, 18/01/2011, Opinião, p. 18

Visão do Correio

O deslizamento de terras na zona serrana fluminense trouxe à tona, mais uma vez, o despreparo das cidades para enfrentar fenômenos excepcionais da natureza. A precariedade só muda de endereço. Tragédias ocorridas em Santa Catarina, São Paulo, Minas, Rio, Alagoas e Pernambuco são exemplos recentes. Apesar da certeza de que o verão traz consigo tempestades alarmantes, os municípios são sempre apanhados de surpresa. Reprisa-se, então, o velho enredo de terror ¿ morros transformados em rios incontroláveis, casas carregadas ribanceiras abaixo, milhares de desabrigados, número crescente de mortos.

Brasília não foge à regra. Embora tenha mapeadas 16 áreas de risco, a cidade não dispõe de sistema de alerta preventivo de temporais formalmente instalado. Na iminência de ocorrência atípica, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) passa a informação à Defesa Civil. É aí que ocorre o gargalo. Os comunicados são encaminhados aos órgãos de comunicação, que os divulgam por rádio, jornal, tevê ou internet. Não há previsão de avisar os principais interessados ¿ as pessoas que serão atingidas pelas enchentes.

Em bom português: o serviço parte da premissa de que os moradores estão conectados à internet ou com os aparelhos ligados nos telejornais 24 horas por dia. O ponto de partida é falso. Significa que homens, mulheres e crianças, que poderiam ter a vida poupada ou contratempos minimizados, estão entregues à própria sorte. Autoridades do GDF afirmam que completar o sistema não constitui prioridade. A urgência reside na remoção das populações das áreas de risco.

Ora, desalojar famílias, embora impositivo e urgente, não é tarefa fácil. Exige, além de tempo e cuidadoso planejamento, a anuência dos moradores. Nem sempre eles aceitam pacificamente a mudança de casa ou de bairro. Há que os convencer. Às vezes há necessidade de recorrer ao Judiciário. Enquanto isso, o calendário avança. Com ele, temporais capazes de vestir de luto não só familiares e amigos das vítimas, mas também a capital do Brasil.

Nascida sob o signo da vanguarda, Brasília teima em ostentar signos do atraso. Um deles é, sem dúvida, a ocupação de áreas de risco e o consequente desrespeito ao meio ambiente. Acrescenta-se, agora, mais um ¿ equipamentos modernos para identificar temporais sem condições de comunicação com os principais interessados. A realidade, por ora, é constrangedora. Chegará o dia em que será trágica.