Título: FSM quer autonomia financeira em 2006
Autor: Daniela Chiaretti
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2005, Internacional, p. A7

Encerrada a quinta edição do Fórum Social Mundial (FSM), os organizadores se preparam para realizar os próximos encontros fora do Brasil e sem o suporte financeiro do governo federal, que neste ano bancou quase 50% dos custos. Segundo diretor geral do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e integrante do conselho internacional do fórum, Cândido Grzybowski, em 2006 o evento buscará a autosuficiência financeira com uma campanha para arrecadar doações dos participantes, que só neste ano passaram de 150 mil pessoas em Porto Alegre. Em julho, também poderá ocorrer um encontro entre o FSM e o Fórum Econômico Mundial, na França. A seguir, os principais pontos da entrevista que Grzybowski concedeu ao Valor. Valor: O governo federal foi o maior doador individual da quinta edição do FSM e pelo menos nos próximos dois anos o evento será realizado fora do Brasil. Como substituir essa fonte de recursos? Cândido Grzybowski: O orçamento deste ano deve fechar em R$ 17,5 milhões e o governo (Ministério do Turismo, Petrobras, Eletrobrás, Correios, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) entrará com R$ 8,5 milhões. Agora estamos discutindo uma campanha para pedir contribuições de um dia de trabalho aos participantes do fórum. Temos 400 mil endereços eletrônicos de todo o mundo. Valor: Quanto seria possível arrecadar? Grzybowski: Se 100 mil pessoas colaborassem, arrecadaríamos US$ 6,5 milhões. Seria a nossa autonomia. Não depender de mais ninguém já seria politicamente um feito em si. Valor: O FSM de 2006 já será financiado desta maneira? Grzybowski: Acho que dá para implementar para 2006. A primeira sugestão para se fazer isto veio dos americanos na reunião do conselho internacional em Miami, em 2003. Agora vamos tocar. A proposta terá de ser aprovada pelo conselho, em abril e maio, e lá por outubro ou novembro devemos lançar a campanha. E temos ainda outras fontes, como igrejas e ONGs. Valor: Neste ano, mais de uma dezena de ministros do governo do PT participou do FSM. Não foi excessivo para um evento que pretende ser autônomo? Grzybowski: Talvez, mas mais pelo modo como estamos acostumados a ver as coisas. Mantivemos nossa total autonomia. Todas as atividades que tiveram a participação de ministros foram iniciativas nossas. Os ministros foram convidados. Valor: O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sugeriu um encontro entre as cúpulas do FSM e do Fórum Econômico Mundial para discutir ações concretas contra a pobreza. É possível? Grzybowski: Existe uma negociação em andamento, mediada pelo ministro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Jacques Wagner, e a associação que reúne conselhos semelhantes de 60 países. Seria um debate entre pessoas envolvidas com os dois fóruns, porque pelo menos no FSM não existe uma cúpula. A data tentativa é 9 de julho, na França, antes de uma visita que o presidente Lula deverá fazer àquele país. Valor: Esta foi a melhor edição do FSM? Quais os desafios agora? Grzybowski: Indiscutivelmente este foi o melhor fórum. Agora o desafio é ir para áreas onde ele não está bem implantado. O mundo árabe é o desafio. O modelo criado para 2006, de no mínimo três fóruns regionais simultâneos, é um desafio monumental. No horizonte, tem ainda a Ásia profunda. Temos que ir à China, senão é um fracasso. A universalização do fórum é fundamental. Valor: Que países são candidatos para 2006? Grzybowski: Até agora só temos o Marrocos e uma discussão sobre a Venezuela. As candidaturas estão abertas até o fim de março. Nos dias 31 de março e 1º e 2 de abril o conselho internacional vai se reunir na Holanda para decidir. A idéia também é ter atividades simultâneas nos fóruns, por videoconferência, no mínimo uma vez por dia. Valor: Em 2007 o FSM voltará a ser unificado, na África. Esse revezamento entre um evento único e encontros regionais será mantido? Grzybowski: Isto está em aberto. Resolvemos até 2007. Na África, o fórum poderá ser no Quênia, por exemplo. Valor: E em 2008, pode voltar para Porto Alegre? Grzybowski: Também está em aberto. Isto está na agenda da reunião na Holanda. Não sei se teremos uma decisão já, mas poderemos voltar para cá em 2008. Valor: A saída do FSM de Porto Alegre tem a ver com a derrota do PT na eleição municipal? Grzybowski: Não tem absolutamente nada a ver, porque não estava em questão ficar aqui em 2006. Estávamos discutindo o que fazer adiante, se o fórum seria realizado de dois em dois anos, mas isto criaria um vazio. Valor: Mas a mudança na prefeitura atrapalhou? Grzybowski: Do ponto de vista prático atrapalhou um pouco porque tínhamos o engajamento militante de funcionários na preparação do fórum. Mas é natural que na mudança de governo as máquinas se desorganizem um pouco.