Título: Fragmentação do Legislativo leva à judicialização da política, diz pesquisador
Autor: Agostine, Cristiane ; Caio Junqueira
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2007, Política, p. A8

A falta de entendimento entre os parlamentares e os partidos no Congresso Nacional é tamanha que as questões políticas mais polêmicas só conseguem ser resolvidas com a interferência do Judiciário. Essa é a análise do professor e pesquisador Luiz Werneck Vianna, do Iuperj , sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) relativa à fidelidade partidária.

Nos três Poderes, o Legislativo foi ultrapassado tanto pelo Executivo quanto pelo Judiciário, observa Vianna. Diante da dificuldade de deputados e senadores em conquistar consenso sobre assuntos relevantes, como a reforma política, são os magistrados que acabam ganhando força. E nas oportunidades em que foi provocado pelos partidos políticos, o Judiciário deu sua resposta. Foi assim na consulta sobre a regra de verticalização, da cláusula de barreira e sobre a possibilidade de uma minoria no Congresso abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito. "A judicialização da política é um processo absolutamente instalado entre nós e, a essa altura, irreversível" , diz Vianna, pesquisador da relação entre os poderes republicanos e do funcionamento do Poder Judiciário no Brasil, entre outras linhas de pesquisa. Luiz Werneck Vianna é autor do livro "Judicialização da Política e das Relações Sociais no Brasil", entre outros títulos.

A judicialização da politica é um processo mundial, explica Vianna, mas no Brasil existem singularidades. A principal é a forte fragmentação política.

Para Vianna, o Judiciário tem ganhado força não só sobre as negociações políticas, mas também em questões do cotidiano. Para tudo o brasileiro apela ao Poder Judiciário, já que não consegue amparo nos políticos. "O Brasil hoje é um laboratório singular de processos de maior presença do Judiciário na vida política e na vida social. Nas questões diárias, como planos de saúde, direitos do consumidor, os juizados especiais, está cada vez mais presente", afirma. "Os processos têm avançado em função da fraqueza do sistema de representação política."

Apesar de cada vez mais presente em questões políticas, o Supremo cumpriu seu papel ao dar a última palavra sobre o tema da fidelidade partidária, entende o professor. "Essa é uma matéria constitucional e cabe ao STF julgar". Entretanto, Vianna ressalva que temas da reforma política só chegam às mãos dos magistrados por conta das deficiências no Congresso. "O Legislativo devia estar mais robusto. Não podia estar tão dividido nem se deixar envolver em todas as manobras que o Executivo faz para cooptar seus quadros. É essencial ter partidos fortes".

Já na avaliação de Marcus Faro de Castro, o professor de Direito da Universidade de Brasília, o fortalecimento dos partidos políticos pode ser uma medida arriscada para a democracia na medida em que coloca intermediários entre representantes e representados. "Não acho muito coerente dar maior papel ao partido sobre o controle do mandato. Não sei se isso é muito coerente com a representação democrática. O mandato é muito mais do povo e do eleitor do que do partido. Se há algo necessário no país é o reforço da representatividade dos eleitores", afirmou.

Para embasar sua avaliação, Faro menciona o filósofo francês Montesquieu (1689-1755). "Em seus textos sobre a monarquia, ele insistia que os corpos intermediários eram uma característica da monarquia e que em uma democracia o fortalecimento desses corpos seria pouco recomendável."

Segundo Faro, quando o eleitor médio vota ele privilegia o candidato em relação ao partido. Por isso, deveria haver uma preocupação maior sobre o poder que as organizações adquirem. "Muito poder pode frustrar a representação democrática", diz. "A função do parlamentar é representar o eleitor e dar poder a uma organização para interferir nessa representação suscita cuidado."

O professor recomenda uma posição intermediária entre a liberdade total dos parlamentares em mudar de legenda e o impedimento de mudança. "O melhor seria pensar em critérios apreciados pelo próprio Congresso", defende. "Eventualmente até mesmo uma emenda ou uma lei, que contemplem esses critérios".