Título: Temores inflacionários voltam a assombrar os EUA
Autor: Reddy , Sudeep
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2007, Internacional, p. A9

Temores inflacionários espalharam-se pelos mercados financeiros americanos nas últimas semanas, alimentados pelo agressivo corte de juros no mês passado combinado com a contínua queda do valor de imóveis e o espectro de uma recessão. Por enquanto, os números favorecem os que julgam a inflação um risco menor, mas os mais temerosos têm lá seus motivos.

Quando o Federal Reserve (Fed, BC dos EUA) deixou a posição que mantinha até o início de agosto de que a inflação era a maior ameaça à economia e cortou os juros em meio ponto porcentual em setembro, alguns investidores acharam que isso iria provocar a inflação. O rendimento de títulos de dívida subiu. Indicadores de inflação baseados no mercado indicavam receios de pressão inflacionária. Commodities como petróleo e ouro subiram. O dólar caiu. Sexta-feira, o anúncio de que salários estão 4,1% mais altos que há um ano jogou pôs lenha na fogueira.

"O Fed adotou uma política altamente monetária arriscada", diz Peter Schiff, presidente da Euro Pacific Capital, uma corretora de Connecticut especializada em investimentos estrangeiros. "A inflação vai ficar bem pior."

Mas os índices de inflação têm arrefecido nos últimos meses. Entre eles, o preferido pelo Fed, que é o índice de preço para gastos pessoais com consumo, subiu 1,8% em agosto comparado com um ano antes, dentro da margem de 1% a 2% que alguns diretores do Fed consideram confortável e a menor taxa desde 2004. A alta foi a mesma no assim chamado núcleo da inflação, que exclui alimentos, energia e combustíveis. O maior componente nos índices de inflação - gastos com moradia, como aluguel - está em queda devido ao declínio do mercado imobiliário.

Se a economia dos EUA enfraquecer, as empresas podem ter dificuldade para aumentar preços. Já a queda do desemprego pode ressuscitar reivindicações salariais. "Temos crescido menos do que o usual já há mais de um ano, e isso provavelmente abriu algumas frestas na economia", diz Richard Berner, economista-chefe para os EUA do Morgan Stanley.

Mas alguns investidores continuam a temer a possibilidade de que a queda do dólar, acelerada pelo corte de juros, alimente os preços. E a alta do petróleo - que dói mais no bolso dos americanos quando o dólar cai - pode aumentar o preço das matérias-primas, levando a altas no varejo.

Ainda assim, um recente estudo do Fed concluiu que produtores de outros países tendem a reduzir seus preços - mantendo-os constantes em dólar - quando suas moedas locais sobem. Isso alivia a perda de fatia de mercado dos produtores e protege os consumidores americanos contra a alta dos preços de produtos importados causada pela queda do dólar.

Uma grande preocupação entre banqueiros centrais são as expectativas do público quanto à inflação. Se empresas e consumidores crêem que as autoridades vão fazer o necessário para evitar a inflação, ficarão mais propensos a manter preços e salários quietos - mesmo se o petróleo subir ou outra ameaça inflacionária aparecer. "Credibilidade é algo que é extremamente difícil de construir e extremamente fácil de perder", diz Stephen Cecchetti, professor da Brandeis University. "A única maneira de construí-la é manter a inflação baixa quando diz que o vai fazer". Conseqüentemente, uma alta das expectativas de inflação poderia levar o Fed a adiar novos cortes de juro.

"Uma âncora para expectativas inflacionárias no médio e longo prazos é ainda mais importante em tempos de volatilidade do mercado financeiro e de crescente incerteza", disse na semana passada o presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet.

Dois indicadores de inflação bastante usados nos EUA, um baseado em pesquisas com consumidores e outro em movimentos do mercado, dão poucos motivos de preocupação. A pesquisa de confiança do consumidor da Universidade de Michigan mostra expectativas de inflação de longo prazo - cinco anos - em 2,9%, abaixo do recente pico de 3,2%. E a diferença entre o rendimento de Títulos do Tesouro convencionais e os corrigidos pela inflação, indexados pelo IPC, subiu um pouco depois de o Fed cortar as taxas, mas caiu de novo. Na sexta-feira, o rendimento de títulos de renda fixa subiram de novo por causa de temores inflacionários despertados com o relatório de emprego. Então, a grande dúvida agora nos mercados é: se a economia não está tão ruim quanto o Fed temia, será que o Fed agirá rápido o suficiente para evitar uma inflação mais alta?

Na crise de 1998, o Fed fez uma série de cortes de juros que ajudou a evitar uma recessão. A economia prosperou, mas acabou se enfraquecendo com a queda do setor tecnológico. "O Fed demorou um pouco para afrouxar e depois houve um certo superaquecimento", diz Stephen Stanley, economista-chefe do RBS Greenwich Capital.

Donald Kohn, vice-presidente do Fed, disse na sexta que a fraqueza da economia no curto prazo deve aumentar a concorrência nos mercados e reduzir pressões de alta de preço. Mas também que o Fed "conseguiria compensar o corte nas taxas de fundos federais - se ficar claro que foi maior do que precisava - em tempo de preservar a estabilidade de preços".