Título: Processamento de soja em ritmo lento
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 31/01/2005, Agronégocios, p. B10

O atraso da entrada da safra precoce de soja no Centro-Oeste e a menor disposição dos produtores em fixar preços estão fazendo algumas esmagadoras retomarem o processamento num ritmo mais lento nesta temporada se comparado com 2004, um ano de cotações atipicamente elevadas. A Caramuru, por exemplo, voltará a esmagar no dia 11 de fevereiro em Itumbiara (GO), 15 dias mais tarde do que o previsto. "Já era para estar voltando, mas a safra precoce atrasou, e os produtores estão retendo mais do que em outros anos", afirma César Borges, vice-presidente da Caramuru. Segundo ele, no fim de 2003, um percentual de 2% da soja recebida pela Caramuru ainda tinha preços a fixar. No fim do ano passado, esse percentual ficou em 7%. "Isso confirma que os produtores preferiram reter um pouco mais do que em 2003". O motivo é o forte recuo dos preços da soja a partir do segundo semestre de 2004. Para se ter uma idéia, a cotação no disponível em Rio Verde (GO) está hoje em R$ 28/saca contra mais de R$ 40 no mesmo período de 2004. Em Rondonópolis (MT), a situação se repete, segundo a Agência Rural. O diretor comercial da Comigo, José Walter Vilela, acrescenta que quando os preços da soja começaram a cair, em 2004, o produtor parou de vender à espera de recuperação. Com a instabilidade do mercado, diz, as indústrias também preferiram não fixar preços, o que também contribuiu para a comercialização mais lenta. Vilela explica que a entrada mais tardia da soja precoce se deve ao atraso, de cerca de 20 dias, do plantio em Goiás e no Mato Grosso por conta da falta de chuvas. Além disso, a chuva também vem atrasando a colheita. "A safra ainda está 'pingando' no Mato Grosso", comenta Renato Sayeg, da Tetras. Após a parada para manutenção, a Comigo voltará a esmagar em sua fábrica de 1 mil toneladas diárias na próxima semana. Conforme Vilela, o normal seria voltar "um pouco antes". A retomada do esmagamento na outra unidade, de 2,5 mil toneladas/dia, deve ocorrer entre 10 e 15 de fevereiro e vai depender da colheita. Para analistas e fontes ligadas à indústria, a morosidade atual é normal, mas chama a atenção por conta do comportamento do processamento em 2004, quando as cotações em Chicago e no Brasil estimularam operações quase contínuas das fábricas. As mesmas fontes lembram que esta é uma época do ano em que as unidades rodam com safra velha, já que as variedades precoces normalmente não garantem fluxo economicamente vantajoso às empresas. Raciocínio que vale para o Centro-Oeste, já que no Sul a colheita é mais tardia. Mesmo assim, analistas observam que o ritmo está mais lento que o normal. E a explicação é simples: preços baixos e custos elevados. "Os produtores estão esperando os preços melhorar para vender, e as indústrias aguardam engrenar a colheita da safra nova [2004/05] para ir às compras", diz Seneri Paludo, da Agência Rural. Fonte ligada a uma grande processadora afirma que os preços atuais preocupam os agricultores em função da elevação dos custos de produção. Só os insumos tiveram aumento médio de 40% da safra passada para cá, observa. Mas, mesmo com certa letargia, os negócios começaram a sair e fábricas do Centro-Oeste estão operando, ainda que não a todo o vapor. "Há negócios principalmente no Sudeste e no Sul, onde tem soja da safra velha [2003/04]", afirma Flávio França Júnior, da Safras & Mercado. Em seus cálculos, os estoques de passagem da safra 2003/04, que serão medidos no fim do ano comercial das indústrias, em 31 de janeiro, devem apontar para mais de 2 milhões de toneladas. Há quem diga que, somados os estoques de indústrias, cooperativas e produtores, o volume superará 3 milhões. Especialistas ressaltam que o baixo nível de contratos de venda antecipada firmados para 2004/05 ajuda a travar o mercado. Em recente entrevista ao Valor, César Borges, também vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), afirmou que, até a primeira quinzena de janeiro, os contratos antecipados - "contratos de soja verde" - representavam entre 10% e 20% da safra, ante entre 40% e 50% na mesma época do ciclo 2003/04. A conjuntura colabora, ainda, para segurar o ritmo de registros de exportação do complexo soja. Conforme a Abiove, até o último dia 15 os registros de soja em grão somavam 1,503 milhão de toneladas, ou 6,7% do total estimado pela entidade a ser embarcado pelo país entre fevereiro de 2005 e janeiro de 2006. Em 15 de janeiro de 2004, o percentual chegava a 37,1% do total previsto para entre fevereiro de 2004 e este mês. Um dos motivos para este quadro é o câmbio, segundo o setor.