Título: Goiás inscreve devedores no Serasa
Autor: Cristo , Alessandro
Fonte: Valor Econômico, 08/10/2007, Legislação, p. E1

À semelhança da Fazenda Nacional, que no dia 15 deste mês divulgará as regras para o envio dos nomes dos devedores do fisco no Serasa, as procuradorias dos Estados também estão em vias de implantar a medida e inscrever seus devedores em cadastros privados de proteção ao crédito. O primeiro Estado do país a aplicar a medida é Goiás, que já enviou 520 nomes de devedores ao Serasa. A experiência de Goiás pode dar indícios do que deve ocorrer quando a inscrição de devedores em cadastros chegar ao fisco federal e aos demais estaduais: a Justiça goiana já concedeu liminares suspendendo as inscrições, ou seja, obrigando o Serasa a baixar anotações, e abriu precedentes para novas demandas.

O advogado Leandro Martinho Leite, do escritório Leite, Martinho Advogados, foi um dos que obteve uma liminar em favor de um contribuinte com filial em Goiás e que obrigou o Serasa a excluir dos seus cadastros o nome do devedor. O juiz Fernão Borba Franco, da 14ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, concedeu a liminar devido ao fato de o débito ainda estar em discussão judicial, aguardando decisão sobre sua exigibilidade. Para o advogado, a Serasa é uma empresa de proteção ao crédito comercial e financeiro, e não tributário. "A inscrição de contribuintes no Serasa é uma forma de cobrança indireta do fisco, com o intuito de pressionar e coagir o devedor. É uma pressão ilegal", diz. Leite afirma que, para evitarem a negativação, os contribuintes podem entrar com mandados de segurança preventivos enquanto o débito ainda estiver sendo discutido na esfera administrativa.

Segundo o advogado Flávio de Haro Sanches, do escritório Veirano Advogados, a medida do fisco fere o artigo 198 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê o sigilo das informações dos contribuintes. Para ele, o serviço de proteção ao crédito poderia ser comunicado apenas no caso de ação judicial, mas não quando ainda couber contestação do débito na dívida ativa, como ocorre em Goiás. "Com essa atitude, o governo se expõe a sucumbências de ações indenizatórias, além de processos civis por perdas e danos", afirma.

A Secretaria da Fazenda de Goiás, no entanto, não receia possíveis processos movidos pelos contribuintes. O gerente executivo de receita e crédito do órgão, Sinomil Soares da Rocha, afirma que a medida foi amadurecida durante mais de três anos e fundamentada em estudos de jurisprudência. Além disso, o próprio CTN, em seu artigo 198, garantiria à Fazenda pública o direito de divulgar informações da dívida ativa, o que é ratificado pelo código tributário goiano. "Não é o caso de constrangimento porque o crédito tributário é um dado público", diz. De acordo com Rocha, a Fazenda goiana já fez 520 inscrições de contribuintes no Serasa, das quais 100 foram questionadas judicialmente e, destas ações, apenas cinco liminares foram concedidas para baixa de registro no órgão. Segundo ele, a medida gerou um aumento de R$ 60 milhões na carteira de parcelamento entre abril e agosto desse ano.

De acordo com o advogado Rogério Mollica, do escritório Demarest & Almeida Advogados, o meio legal de cobrança de créditos tributários pelo fisco é a execução fiscal. "A negativação de um contribuinte junto aos serviços de proteção ao crédito poderia ser aceitável somente se ele não pudesse ser localizado em nenhuma hipótese", afirma. Arthur Salibe, advogado do Pinheiro Neto e membro da comissão de assuntos tributários da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), esclarece que a negativação junto ao Serasa nega a vigência da Lei nº 6.830, de 1980, que disciplina a execução judicial para a cobrança da dívida ativa. Este foi o entendimento do juiz substituto Pedro Paulo de Oliveira, da Vara de Fazendas Públicas da Comarca de Anápolis, em Goiás, que concedeu uma liminar obrigando a Serasa a excluir a inscrição de um contribuinte em 26 de junho.

A Procuradoria Geral do Estado de São Paulo estuda firmar com o Serasa, a partir de 2008, um convênio semelhante ao celebrado pela Fazenda goiana. Segundo o procurador geral-fiscal Clayton Eduardo Prado, a medida não teria a mesma resistência sofrida pelo protesto de contribuintes em cartório no Judiciário. "O Serasa é um atalho, sobretudo para débitos anti-econômicos, de valores abaixo dos que compensariam executar judicialmente", explica. Segundo o procurador, o protesto de devedores em cartório está suspenso desde abril, para que os sistemas do órgão possam ser dedicados ao programa de parcelamento incentivado (PPI), que está em andamento. Outras procuradorias também estudam a possibilidade de convênio com órgãos de proteção ao crédito, como as do Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Paraíba.