Título: Brasil quer mudança real no Fundo, diz representante
Autor: Leo , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2007, Finanças, p. C4

Nogueira Batista Júnior: "Europa tem de avaliar se terá presença menor em uma instituição mais legítima, ou mantém o poder numa instituição sem legitimidade" O Brasil rechaçou sugestões para uma reforma modesta na estrutura de poder do Fundo Monetário Internacional e "continua lutando" para aumentar "de forma significativa" a participação dos países em desenvolvimento no comando da instituição, afirmou, ao Valor, o diretor do Brasil no FMI, Paulo Nogueira Batista Júnior. Ele garante que não haverá acordo sobre o tema até a próxima reunião anual do FMI, em meados deste mês; o esforço do Brasil será para garantir que "alguns avanços conceituais" obtidos na discussão sejam incluídos na declaração dos ministros, ao fim da reunião.

O governo brasileiro foi surpreendido, nesta semana pelo vazamento de um documento técnico, preparado pelo governo da África do Sul, com avaliações e propostas sobre a reforma do FMI. O documento indicava uma nova fórmula acionária que, na prática, pouco alteraria o status quo, em que os países da Europa Ocidental têm peso nas decisões da diretoria muito superior à própria importância econômica. Apesar de ter colaborado com estudos do Banco Central para a formulação do documento, o Brasil, aliado à Rússia, à Índia e à Argentina, rejeitou expressamente as conclusões do trabalho, conta Nogueira Batista Júnior.

A rejeição ocorreu em reunião do G-20, o grupo dos principais países industrializados, na quinta-feira da semana passada, de, segundo Nogueira Batista, países como o México e China também fizeram críticas ao estudo, que, no entanto, permanece entre outras "contribuições para discussão", segundo admitiu.

O Brasil tem esperanças de fazer avançar a mudança de peso decisório dos países no FMI a partir do ano que vem, quando assume a gerência-geral do fundo o francês socialista Dominique Strauss-Khan. Durante a campanha pelo cargo, e após ser escolhido para comandar o FMI, Strauss-Khan comprometeu-se em mudar a distribuição de votos no Fundo, de maneira a dar maior representatividade à instituição, com mais poderes e influência conferidos a países emergentes, como Brasil e Índia.

No próximo ano, o Brasil também terá a presidência do G-20 (não confundir com outro G-20, o grupo de países em desenvolvimento que reivindica na Organização Mundial de Comércio mudanças no mercado internacional para produtos agrícolas). O G-20 reúne os países mais poderosos do mundo, também agregados no G-7, mais a Rússia e o grupo dos países emergentes mais industrializados. Esse grupo tem servido de base para as discussões sobre a reforma do Fundo. "Queremos uma reforma que aponte na direção de uma mudança real da instituição", insiste Paulo Nogueira Batista Júnior, que espera aproveitar a presidência brasileira no grupo para dar prioridade à discussão.

O estudo rejeitado pelo Brasil foi revelado pelo jornal britânico "Financial Times" (em reportagem reproduzida pelo Valor há dois dias) e sugeria uma nova fórmula acionária no FMI que proporia um aumento de capital, na instituição, de apenas 12,5%, necessário para acomodar a nova distribuição de ações entre os países-sócios, sem reduzir as cotas atualmente detidas pelos países desenvolvidos.

Para a fórmula indicada no estudo, os técnicos sugeriam uma nova ponderação na distribuição d e ações, que levaria em conta o PIB dos países segundo as cotações de câmbio do mercado, e um fator de correção, segundo o PIB calculado pela paridade de poder de compra. Um cálculo para fazer convergir o PIB segundo preços de mercado e o avaliado segundo a paridade do poder de compra (comparando renda e preços locais) contou com a participação do Banco Central do Brasil, e pode ser aproveitado nas discussões posteriores, entre outros detalhes técnicos do estudo, admite Nogueira Batista.

"O documento não pode ser visto como indicação da posição dos países", afirma, veemente, Paulo Nogueira Batista Júnior. "É um trabalho técnico que não traduz a posição brasileira". As mudanças no FMI enfrentam, porém, uma forte e obstinada resistência por parte dos países europeus, que hoje, segundo acusa Nogueira Batista, têm um peso "anômalo" na estrutura do FMI, onde a Bélgica, por exemplo, tem mais votos do que o Brasil, e a Holanda, mais que a Índia.

"Como disse o próprio Strauss-Khan, a Europa tem de avaliar se terá uma presença menor mas representativa em uma instituição mais legítima, ou mantém o poder numa instituição que não tem legitimidade", diz o brasileiro.