Título: Governo e oposição armam-se para batalha da CPMF no Senado
Autor: Ulhôa , Raquel
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2007, Política, p. A5

Em fase preparatória para receber no Senado a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que prorroga a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) até 2011, governo e oposição buscam soluções para conflitos internos que ameaçam as respectivas estratégias.

Para o governo, o fundamental é superar a obstrução das votações pela oposição, em protesto à permanência de Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência da Casa. Uma segunda semana seguida sem votação - desde a absolvição de Renan no julgamento do dia 12 - agravaria o ambiente político.

Para a base aliada, outro grave efeito da crise Renan é o confronto entre PT e PMDB, tornado claro na semana passada. Pemedebistas acusam Aloizio Mercadante (PT-SP) de atuar para enfraquecer Renan. O petista defende o afastamento de Renan do cargo. Na bancada do PT, é crescente a insatisfação com a resistência de Renan em se afastar, mesmo colocando em risco o interesse do governo.

DEM e PSDB, por sua vez, têm os próprios desafios a vencer para firmar uma tática de enfrentamento ao governo. A oposição teve importante vitória ao impedir, por dois dias seguidos, votação da indicação de Luiz Antonio Pagot para diretor-geral do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (DNIT). Mas a coesão é frágil.

Essa fragilidade sugere que o governo acabe aprovando a CPMF, desde que seja competente na articulação. As chances crescem se o Planalto concordar com a redução da alíquota de 0,38% para 0,20%, como defendem setores do PSDB. Não será fácil garantir 49 votos favoráveis (mínimo para aprovar uma emenda constitucional).

Na negociação, o governo tentará levar senadores da oposição para partidos da base. Os líderes querem participação direta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na articulação. A oposição teme a reedição do "mensalão" no Senado.

Para não perder os recursos da CPMF (R$ 39 bilhões em 2008), pode ser vital tirar senadores da oposição. Com 17 senadores, o DEM é o mais assediado. O partido fechou questão e decidiu exigir dos seus filiados que votem contra a CPMF, sob o risco de expulsão. Isso significa que o Palácio do Planalto não deverá contar com os votos dos senadores democratas que costumam votar com o governo.

Seis senadores do DEM, vivendo conflitos com o partido nos Estados, negociam com outras siglas - Edison Lobão (MA), Romeu Tuma (SP), César Borges (BA), Adelmir Santana (DF), Jayme Campos (MT) e Demóstenes Torres (GO) -, a maioria deles com o PR . Por enquanto, não confirmam a mudança.

César Borges pode trocar de sigla sem sair da oposição. A cúpula nacional do PSDB tenta contornar resistências do diretório baiano à sua entrada.

O DEM do Senado torce para que os três deputados da sigla que desrespeitaram a decisão partidária e votaram favoravelmente à CPMF na Câmara - Bispo Rodovalho (DF), Lael Varela (MG) e Edmar Moreira (MG) - sejam expulsos. Serviria para inibir senadores tentados a repetir o comportamento.

Sozinha, a base aliada não reúne os 49 votos necessários à aprovação de PEC. Somando PMDB (19 senadores), PT (12), PTB (6), PR (3), PSB (3), PC do B (1), PRB (1) e o PP (1), os partidos do governo têm 46 votos. Mas há dissidentes. Só no PMDB, podem chegar a cinco. No caso da CPMF, governistas acreditam contar apenas com 41 votos certos a favor da prorrogação. Precisam conquistar pelo menos oito votos na oposição.

Os governistas esperam votos no PSDB -que não fechou questão-, por causa de suposta pressão dos governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG). No entanto, tucanos dizem que a atuação dos governadores a favor da CPMF não é real. A idéia de compartilhamento com Estados e municípios foi descartada, pelo desgaste que causaria e porque ficaria mais difícil extinguir a cobrança no futuro.

Segundo tucanos, apenas Serra teria interesse em manter a contribuição, pela perspectiva de suceder Lula em 2010. Quanto a Aécio, sua suposta defesa da contribuição seria para preservar bom relacionamento com o Planalto.

Ao contrário do Democratas, o PSDB não fechou questão sobre a CPMF. A orientação partidária é pela rejeição, mas senadores tucanos preferem negociar a redução da alíquota. Apesar das posições diferentes, DEM e PSDB buscam estratégia para votarem unidos no Senado.

A parceria é delicada. No DEM, há queixas quanto ao papel secundário na aliança. Um exemplo ocorreu na semana passada. Dois senadores do DEM do Mato Grosso - Jonas Pinheiro e Jayme Campos - foram liberados pelo líder, José Agripino (RN), a votar a indicação de Pagot, do Estado deles. Ficaram irritados porque o líder não liberou seus colegas a segui-los.

Prevaleceu a articulação do PSDB contra Pagot, comandada pelo ex-senador tucano Antero Paes de Barros (MT), adversário de Pinheiro e Campos. A justificativa para não votar foi a obstrução em protesto a Renan.

Nesta semana, o governo colocará de novo a indicação de Pagot em votação. Precisa reunir 41 votantes e conseguir maioria simples dos votos a favor da indicação. Na quarta e na quinta passadas esse quórum não foi obtido por falta de mobilização da base governista.

Para contornar a rebelião contra Renan e tentar retomar as votações, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), reúne-se com os líderes partidários na terça-feira, sem a presença do presidente do Senado.

A oposição condiciona o fim da obstrução total à votação de três propostas: emenda constitucional acabando com o voto secreto, um projeto de resolução abolindo as sessões secretas e outro que exige afastamento imediato de integrante da Mesa Diretora ou dirigente de comissão que sofrer processo por quebra de decoro.

O governo rejeita o terceiro ponto e defende que o voto secreto seja mantido em alguns casos. Havendo negociação, os dois lados saem ganhando. Menos Renan, alijado da conversa.

O presidente do Senado foi absolvido no julgamento da primeira representação (uso de lobista em pagamentos pessoais), mas responde a outras três (beneficiar a cervejaria Schincariol, uso de "laranja" em compra de rádios e desvio de recursos públicos em ministérios comandados pelo PMDB). O ambiente político está tão deteriorado no Senado, que aliados seus dizem que ele seria cassado se novo julgamento ocorresse nesse momento.