Título: Pimentel condena uso político de denúncia
Autor: Felício, César ; Moreira , Ivana
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2007, Política, p. A8

Pimentel: "A história dos nossos partidos não autoriza convergência. Mas somos eleitos para resolver problemas, não para colocar pedras no caminho uns dos outros"

Às vésperas da decisão do procurador geral da República, Antonio Fernando de Souza, de denunciar ou não o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) e outros políticos mineiros por suposto uso de caixa 2 na eleição de 1998, o PT expõe sua divisão sobre o tema. Em entrevista ao Valor, o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, condena o uso político do assunto. "Não acho que é republicano um comportamento que açula as paixões políticas e os interesses partidários. Pelos mesmos motivos que acho que nossos companheiros denunciados pelo Supremo Tribunal Federal foram submetidos a um verdadeiro massacre da opinião pública, sou contra isso em relação aos adversários", diz, referindo-se à denúncia contra os 40 envolvidos no caso do mensalão recentemente aceita pelo Judiciário.

Uma resolução do Congresso do PT, realizado em São Paulo no começo do mês , pediu "agilidade" ao Ministério Público para tratar do tema. O texto foi apresentado pelos petistas mineiros Gleber Naime, integrante da Executiva Nacional, e pelo representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário em Minas, Rogério Corrêa.

Pimentel - uma das principais expressões eleitorais do PT mineiro, ao lado do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias - diz que não participou da votação da resolução, mas que "se estivesse lá votaria contra". O prefeito esteve na homenagem feita em Minas a Antonio Fernando, que recebeu uma comenda do governador mineiro Aécio Neves (PSDB), cujo nome consta em um documento citado no inquérito da Polícia Federal, onde afirma-se que o tucano teria recebido R$ 110 mil de modo irregular.

Disse na ocasião que o Brasil tem duas ameaças institucionais: a impunidade, em um sentido amplo da expressão, e "outra ameaça tão perigosa quanto a primeira, que vem daquele setor da sociedade brasileira talvez bem intencionado, mas equivocado, que quer que o clamor da opinião pública, amplificado pela liberdade de imprensa, substitua o primado da lei".

Fernando Pimentel é conhecido em Minas pela proximidade com o governador Aécio Neves, de quem se declara amigo. O prefeito é um possível candidato ao governo estadual em um momento em que não há nomes naturais para concorrer dentro da base de Aécio, mas nega uma convergência de interesses com o PSDB no Estado.

"Não pode haver uma convergência. A história dos nossos partidos não autoriza que a gente imagine isso. Mas os governantes são eleitos para resolver os problemas, não para colocar pedras no caminho uns dos outros", afirmou, definindo de modo suave o comportamento do partido como um todo em relação ao governo mineiro. "Pode parecer estranho fora daqui, mas aqui não é tão difícil de compreender. Não tem esse ambiente de disputa sangrenta que existe em muitos lugares. O PT deixou de fazer oposição ao governador? Não. Na Assembléia Estadual faz, de vez em quando tem um certo atrito, um negócio civilizado", diz.

A resolução sobre Azeredo não é o único ponto que Pimentel critica no Congresso recente do PT. O prefeito de Belo Horizonte definiu como "anacrônica" a menção à campanha contra a privatização da Vale do Rio Doce, concluída em 1997, e sinalizou com ênfase que o partido deve se preparar para abrir mão de indicar a cabeça de chapa na eleição de 2010 caso as pesquisas não o favoreçam.

"Se, para manter o projeto que estamos neste momento liderando com o presidente Lula, o PT tiver que abrir mão da cabeça de chapa, caso as pesquisas indicarem que o mais adequado é um nome de outro partido da base aliada, por que não?", indaga o prefeito.

-------------------------------------------------------------------------------- Não acho republicano açular as paixões políticas. Seja contra os companheiros, seja contra os adversários " --------------------------------------------------------------------------------

O prefeito descarta a necessidade de o PT eleger uma grande bancada congressual como um fator para a candidatura própria."Passou esse tempo. Nós tivemos várias campanhas derrotadas para governo estadual por causa disso. Com oito anos na Presidência da República, não vamos atuar como um partido alternativo. Alguém acha mesmo que o PT para eleger uma boa bancada de deputados federais e estaduais precisa lançar um candidato próprio à Presidência? ", questiona.

Fernando Pimentel diz que o presidente Lula terá carta branca para conduzir a sucessão, o que poderá passar pela escolha de um não-petista, um nome de dos partidos da base aliada. "Não apostem numa divisão entre Lula e PT. Quem vai apostar vai perder", vaticina.

O prefeito de BH não vê nenhuma possibilidade de o PT entrar no processo de 2010 em desacordo com Lula. "Pode haver alguma tensão interna aqui e ali e tal. Mas chance de o partido, ao fim, tomar uma decisão que contrarie o movimento do presidente, não há. Não tem a menor chance."

Para Pimentel, a eleição do novo presidente da legenda não é uma questão estratégica para o processo eleitoral de 2010. Ele reconhece que, neste momento, faltam nomes para o cargo dentro do PT paulista mas também nos outros Estados. Em São Paulo, com o desgaste provocado pelas denúncias relacionados ao mensalão, há uma grande dificuldade de achar nomes que possam "liderar o partido sem carregar nenhum tipo de constrangimento, de crítica, de memória negativa".

Fora de São Paulo, os motivos são os outros, mas a dificuldade de encontrar nomes é a mesma. Mineiros como Patrus Ananias e o secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, seriam bons candidados, segundo o prefeito, mas estão com cargos no ministério. Jacques Wagner, outra liderança forte fora de São Paulo, está no governo da Bahia.

"Estamos com um falta de nomes mesmo fora de São Paulo, por motivos diferentes", admite. Segundo ele, ter um presidente politicamente representativo, de porte, pode ajudar muito no processo de 2010. Mas não será essencial. "O PT vai participar da discussão, claro, mas o principal personagem será o presidente Lula", enfatiza.

Para o prefeito de Belo Horizonte, o momento - ainda no rescaldo de uma crise - é de transição para o Partido dos Trabalhadores: de um partido anacrônico, que ainda existe, para um partido mais moderno e contemporâneo. O partido anacrônico faz a defesa da reestatização da Companhia Vale do Rio Doce, por exemplo. Mas o moderno admite outras alianças, acha que o mais importante é preservar o projeto que garanta os interesses da maioria da população brasileira.