Título: Carro adapta-se aos hábitos dos emergentes
Autor: Olmos , Marli
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2007, Empresas, p. B7

Le Coz, diretor de segurança da Renault: "para fazer o carro certo é preciso estudar a história dos acidentes de cada país" O médico e engenheiro francês Jean-Yves Le Coz gosta de aplicar no seu trabalho o que observa nas viagens de lazer. Ele passou o verão europeu do ano passado na Suécia e este ano foi para a Romênia. A comparação de comportamentos no trânsito dos dois países o ajudou a reforçar uma tese: nos países em que a cultura do automóvel está mais arraigada, como a Europa Ocidental, os motoristas sabem dividir com os outros o espaço das estradas e ruas muito mais do que nos países emergentes.

A conclusão de Le Coz pode parecer familiar para o brasileiro, acostumado com o comportamento pouco cordial dos motoristas dos centros urbanos. Mas surge como um dado importante num momento em que todas as atenções dos fabricantes de veículos se voltam para os países emergentes, regiões que registram hoje os maiores índices de crescimento de vendas do mundo.

Este engenheiro francês é diretor mundial da área de programas de segurança da Renault, que decidiu, como forma de resolver a nova inquietação, expandir as bases de pesquisa de segurança além das fronteiras da França, onde a montadora mantém o chamado "techno center', uma espécie de laboratório de estudos sobre segurança veicular.

Os dois primeiros novos centros de estudos de segurança da montadora já estão prontos, na Romênia e Coréia do Sul. Brasil e Índia receberão os próximos dois. Le Coz diz que a idéia é estudar o que ele chama de "acidentologia" de cada região. "Se queremos definir, desenhar o carro certo para o país certo, temos que conhecer a história dos acidentes de cada um", diz.

Em cada nova base, a Renault pretende ter um time responsável pela análise das características dos acidentes locais. "Os países da América do Sul podem apresentar semelhanças, mas seus problemas não são comuns aos da China ou Índia", afirma.

Antes de ingressar na área de segurança na Renault, há 17 anos, Le Coz trabalhava como médico especialista em reabilitação, o que lhe garante quase uma vida dedicada à prevenção de acidentes e cuidado com o ser humano.

Le Coz lembra que as estradas do planeta revelam personagens distintos. "É preciso saber lidar com espaços em que circulam carros, pedestres, animais ou bicicletas; por isso o que serve na França ou Alemanha não é efetivo nos países emergentes", completa.

A subsidiária brasileira da Volvo , reconhecida no mercado mundial como uma das montadoras que mais investem em segurança, tem uma equipe dedicada ao estudo dos acidentes locais. Criado em 2005, esse time conta com o apoio da polícia e órgãos de trânsito para se deslocar até o local do acidente com caminhões, principalmente quando um da marca está envolvido.

Cada informação coletada é transmitida à equipe da matriz, na Suécia. "Nossos produtos são globais e precisam atender todos os mercados; por isso não se pode ter uma visão limitada ao que acontece na Europa", diz Cristiano Blume, responsável pela área de planejamento estratégico da Volvo no Brasil.

Ao longo das investigações, a Volvo do Brasil notou a repetição de um fenômeno que expôs um perfil de acidente nas estradas tipicamente brasileiro: em determinados percursos começaram a surgir mais acidentes nos trechos de rodovias em bom estado do que nas esburacadas. Blume explica que isso acontece porque o caminhoneiro dirige com mais velocidade nas estradas boas para compensar o tempo perdido nos trechos de pavimento ruim.

Alguns dispositivos, como o sistema de controle de estabilidade, já são comuns na Europa, mas quase nem são conhecidos pela maioria dos motoristas brasileiros. Os custos de boa parte dos equipamentos de segurança é que distancia o consumidor dos países emergentes do que o motorista do Primeiro Mundo já conhece.

Mas há casos em que o que já foi inventado na Europa pode fazer sucesso no Brasil. A Volvo se prepara para lançar no próximo ano caminhões que sairão de fábrica com o chamado alco-lock, um bafômetro instalado dentro da cabine. Se o motorista estiver com um nível de álcool no sangue alto o veículo não dá partida. Blume diz que os frotistas brasileiros já demonstraram interesse pelo equipamento.

A Volkswagen foi a primeira montadora a realizar testes de impacto, chamados crash-tests, na América Latina. Inaugurado em 1971, o centro de segurança veicular da montadora alemã opera com a chamada segurança passiva, que cuida da proteção dos ocupantes após o acidente. Os testes de impacto são realizados para atender às normas de segurança do Brasil e dos países para onde a Volkswagen exporta seus veículos.