Título: IPO: 2º tempo
Autor: Cotias , Adriana
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2007, EU & Investimento, p. D1

Com uma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês) que pode ultrapassar o R$ 1 bilhão, a SulAmérica esquenta a temporada de fim de ano de lançamentos no mercado de capitais brasileiro. Será a 50ª empresa a vender papéis em 2007 e o prazo de reservas começa hoje. E, a depender do que está para sair do forno - são 34 operações em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) -, os investidores vão encontrar alternativas nos mais variados setores: do varejo à indústria farmacêutica, de logística a alimentos, passando por bancos, seguros e saúde. Só que, depois dos desdobramentos da crise imobiliária americana e a correção por que passou a bolsa, a tendência é de os candidatos a minoritários exigirem descontos extras para assumir o risco de uma empresa novata.

A fabricante de painéis de madeira Satipel foi a primeira a testar o mercado desde o engessamento de liquidez de meados de agosto - quando os bancos centrais americano e europeu passaram a injetar caminhões de dinheiro nos sistemas financeiros. A empresa levantou R$ 398 milhões, mas seus papéis saíram no piso da faixa sugerida, a R$ 13,00. No primeiro dia de negociações na Bovespa, na sexta-feira, caíram 4,54%. A formação de preços ocorreu um dia depois de o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) ter surpreendido com um corte de 0,50 ponto percentual na taxa básica dos Estados Unidos. Isso quer dizer que a companhia pegou os investidores em plena euforia, mas nem por isso eles toparam pagar mais do que o mínimo.

"As emissões não vão parar pois o mercado brasileiro está mais consolidado, mas o que se nota é que já houve uma mudança no nível dos múltiplos, que não tem relação com a qualidade dos ativos", diz o gerente da diretoria de Mercado de Capitais do Banco do Brasil, Luiz Henrique Mascarenhas Correa Silva. Além disso, acrescenta, há, em certos setores, uma menor tolerância dos investidores para operações que envolvam ofertas secundárias (de ações dos sócios), pois os acionistas que estão entrando no capital da empresa via IPO se dispõem a entregar dinheiro para o negócio e não para dar saída aos controladores.

A oferta da SulAmérica, um dos maiores grupos seguradores independente do Brasil, é toda primária (formada por papéis novos). A instituição está colocando à venda 21,739 milhões de units - recibos que representarão duas ações preferenciais (PN, sem voto) e uma ordinária (ON, com voto) -, avaliadas num intervalo entre R$ 30,00 e R$ 40,00. Ao varejo caberá uma fatia entre 10% e 20% dos papéis, para reservas a partir de R$ 3 mil. Havendo demanda, os lotes extras contemplam um adicional de 35% à operação, para R$ 1,027 bilhão, pela média de preços.

A companhia vai fazer par com a Porto Seguro na bolsa e a tendência é de que outras empresas do ramo rumem ao mercado, diz Correa Silva. Isso porque as seguradoras precisam reforçar a base patrimonial de forma a cumprir, a partir de janeiro, as novas regras de capital mínimo exigidas pela Superintendência de Seguros Privados (Susep). A Marítima Seguros já entrou com pedido de registro na CVM. Os bancos de médio porte, como BicBanco, Fibra e Panamericano, continuam na fila. Mas, na visão do executivo, os IPOs podem ser substituídos por uma nova onda de consolidação bancária no Brasil caso vingue a venda do holandês ABN Amro - dono do Banco Real no país - para algum dos grupos financeiros que estão na disputa.

Por ser uma empresa consolidada e de tradição no ramo em que atua, as expectativas são favoráveis ao lançamento da SulAmérica, diz o professor de finanças da Faculdade de Economia do IBMEC-RJ Luiz de Magalhães Ozório. Mas não há garantias de que o cenário internacional não vá atrapalhar a operação. "Com a queda de 0,50 ponto da taxa americana, parte do mercado intui que o Fed está vendo uma série de problemas mais à frente e por isso se antecipou, cortando o juro numa dose maior."

A oferta da Cosan Limited, em agosto, no meio do qüiproquó das hipotecas americanas de alto risco, diz, foi um prenúncio de que dias mais difíceis estariam por vir. Na tranche brasileira, os Brazilian Depositary Receipts (BDRs) saíram a R$ 21,05, valor 35% inferior ao previsto. "Começava a aumentar a aversão ao risco, embora ali também houvesse o desconto da insatisfação dos minoritários da Cosan já listada com a reestruturação" (mais informações na página D2).

Depois de cinco anos de alta do Ibovespa - em dólar, o indicador saltou da casa dos 2 mil pontos para os 28 mil pontos, um ritmo que não se vê nos mercados mais maduros - Ozório recomenda ao investidor recalibrar a carteira, evitando papéis de maior risco, colocando mais peso em ativos de renda fixa. E só entrar num IPO se estiver convencido de que os fundamentos são sólidos e que a empresa vai dar a resposta em crescimento no futuro. "Desta forma, mesmo que a oferta não seja bem sucedida num primeiro momento, o aplicador está ciente do que está levando para casa."

Com os desdobramentos do "subprime", há uma tendência a um mercado mais criterioso, com predileção por companhias de maior qualidade e histórias diferentes para contar, diz o diretor de Renda Variável para América Latina do Credit Suisse Brasil, Marcelo Kayath. "Os investidores querem preços mais baixos, ficaram mais seletivos, o que é saudável porque havia um 'oba-oba' excessivo", diz. Apesar de o momento ser aparentemente menos favorável e prometer alguma volatilidade, o executivo pondera que a Bovespa definitivamente se transformou numa fonte de criação de riqueza para o investidor e de capitalização para as empresas e que, portanto, as portas não serão fechadas para as emissoras. "Já começamos a ver companhias formadas do zero na bolsa, como a BrasilAgro, ou a MMX, que era apenas um projeto."

Entre as 49 ofertas de ações realizadas neste ano, num total de R$ 41,743 bilhões, só 16 têm desempenho melhor do que o Ibovespa. Mas há grandes sucessos também. Quem comprou GVT , por exemplo, já viu seu investimento render 114%. Anhanguera Educacional acumula ganhos de 87,5%, PDG Realty de 68,4%, e, Agra Empreendimentos, de 60,6%.