Título: Procurador-geral conclui que mandatos pertencem a eleitos
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2007, Brasil, p. A10

O procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, concluiu que os parlamentares que trocaram de partido não devem perder os seus mandatos. Ele fez um parecer sobre o assunto que será utilizado no julgamento de três mandados de segurança em que partidos de oposição (PSDB, DEM e PPS) pedem ao Supremo Tribunal Federal (STF) a devolução de mandatos que lhe foram tirados por deputados que trocaram de legenda.

Ao todo, 42 deputados trocaram de partido, segundo informações da Câmara, desde as eleições de outubro do ano passado. Os mais prejudicados foram os partidos de oposição, com 25 perdas.

A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, confirmou que as ações dos partidos de oposição serão julgadas no dia 3 de outubro. O STF tem que decidir o caso até o dia 4 para que a regra possa ser aplicada aos candidatos nas eleições municipais do ano que vem. É a data limite, pois as regras das eleições têm que estar consolidadas um ano antes da eleição, marcada para 5 de outubro de 2008.

Em março passado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, por seis votos a um, que os mandatos são dos partidos e, portanto, os deputados que trocaram de legenda teriam de entregar os seus cargos. Naquele julgamento, três ministros que atuam no STF votaram contra o troca-troca partidário. São: Marco Aurélio Mello, Cezar Peluso e Carlos Ayres Britto. Eles também irão votar a questão no Supremo.

O ministro Celso de Mello, o decano do STF, já votou contra o troca-troca em 1989, quando o tribunal analisou se um suplente de parlamentar poderia assumir o mandato do titular que abandonou o partido. Ele votou favoravelmente ao suplente, mas foi vencido pela maioria dos ministros que manteve o mandato do titular. Questionado ontem se aquele caso é igual ao atual, ele respondeu: "Era mais ou menos a mesma coisa. Tinha pontos em comum".

Num julgamento mais recente, em dezembro do ano passado, o vice-presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, defendeu de forma bastante incisiva a fidelidade partidária. O STF julgou, na ocasião a cláusula de barreira - medida que previa a extinção dos partidos que não atingissem os limites de votos nas eleições para a Câmara dos Deputados. "Qual a conseqüência da mudança de legenda? Há um festival de trocas, uma clara violação à vontade do eleitor", disse Mendes, na época.

Os votos do TSE e essas manifestações dos ministros indicam que seriam pelo menos cinco votos, entre os onze ministros, a favor de dar os mandatos aos partidos. "Não posso deixar de notar que há uma tendência dessa Corte", constatou Antonio Fernando. "A medida pode comprometer duramente a democracia, ao invés de promovê-la." Para Antonio Fernando, se os mandatos forem dados aos partidos, haverá uma "partitocrazia". O processo eleitoral e parlamentar será refém das lideranças partidárias, concluiu. Para o procurador, a "infidelidade partidária" é apenas um problema do sistema político brasileiro. "É apenas um sintoma de uma síndrome crônica que acomete o sistema político-partidário e representativo no país." Há outras questões, como as competições intrapartidárias, a duração dos vínculos partidários, os critérios de recrutamento, as listas abertas, os loteamentos partidários de cargos e funções públicas e as deficiências programáticas dos partidos políticos.

Para o procurador-geral, o troca-troca deve ser debatido dentro de uma reforma maior. "Embora esteja convicto de que a fidelidade partidária, na reunião com outras medidas que se fazem necessárias à reforma política, tende a reforçar o sistema partidário, considero que sua qualificação como causa ensejadora de perda de mandato esteja submetida à reserva de Constituição."

Antonio Fernando lembrou que os parlamentares se elegem mais pelo nome do que pela legenda. O procurador fez ainda uma crítica direta ao PSDB. "Ora, fosse esta a bandeira defendida pelo Partido, deveria ele, antes de reivindicar as cadeiras perdidas, devolver as cadeiras daqueles que, da mesma forma, deixaram seus partidos, após eleitos."