Título: O PAC, os engenheiros e o desenvolvimento
Autor: Pinheiro , Murilo
Fonte: Valor Econômico, 20/09/2007, Opinião, p. A16

Lançado há um ano pela Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), o programa "Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento" é a contribuição da categoria para que o país retome o crescimento econômico com inclusão social. O esforço é uma resposta desses profissionais, ligados ao desenvolvimento por excelência, ao que se viveu no país nos últimos 26 anos: esquecimento ou até mesmo completa ausência de planejamento e investimentos públicos, os quais podem induzir a participação da iniciativa privada; o neoliberalismo e a ideologia do Estado mínimo, que concorreram contra a infra-estrutura nacional e os serviços essenciais, muito embora tenham sido elevadas a dívida pública e a carga tributária.

O debate para a produção do Manifesto da Engenharia percorreu as cinco regiões do Brasil, recebendo colaborações de milhares de profissionais e dando voz ao principal anseio da sociedade brasileira: é preciso voltar a crescer! O documento foi entregue a todos os candidatos ao Executivo na eleição de 2006, inclusive ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Acredita-se assim que o "Cresce Brasil" tem sido peça importante para a mudança da correlação de forças no país. De uma situação de imobilismo e perplexidade, evolui-se para a mobilização por alterações na economia. O projeto dos engenheiros antecedeu o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), lançado em janeiro último, não por acaso, mas sim como parte da expressão dessa vontade da sociedade de que haja mudanças efetivas em benefício da maioria.

Mais modesto e mesmo omisso em questões que os engenheiros consideram fundamentais, o PAC pretende implementar uma série de projetos que vão ao encontro, em grande medida, do que o "Cresce Brasil" propõe para o país. Ambos afirmam ser preciso elevar o PIB a taxas maiores que as atuais - mais ousado, o Cresce Brasil reivindica 6% ao ano em média, frente aos 4,5%, em 2007, e 5% de 2008 a 2010, previstos no PAC. Os dois projetos também indicam o investimento em infra-estrutura como aquele que melhor integra o país e desenvolve a economia, e elegem os mesmos objetivos setoriais em transporte, energia e desenvolvimento urbano.

-------------------------------------------------------------------------------- Espera-se que no processo de implantação do PAC surjam outros programas que promovam ações desenvolvimentistas --------------------------------------------------------------------------------

Quanto ao investimento estatal, o PAC não será ainda suficiente para recuperar os níveis anteriores, que foram de 5% do PIB no tempo em que a carga tributária era 25%, enquanto hoje não chega a 1% do PIB com impostos que batem em 38%. Chama a atenção a distribuição equilibrada dos investimentos do PAC pelas regiões, garantindo-se a continuidade do crescimento econômico no Sul e Sudeste e proporcionando ao Norte, Nordeste e Centro-Oeste grandes avanços na constituição de uma infra-estrutura que os melhor integre entre si e ao restante do país.

Boa parte das obras e projetos indicados como prioritários pelo "Cresce Brasil" foi atendida pelo PAC. Em energia, há expressiva confluência, como, por exemplo, quanto à construção das usinas hidrelétricas de Belo Monte e no Rio Madeira e a instalação das linhas de transmissão para interligá-las aos centros consumidores. Infelizmente, o PAC não prevê a conclusão de Angra III e a continuidade necessária do programa nuclear brasileiro. Em desenvolvimento urbano, os projetos do governo não são suficientes para dar conta da situação caótica das grandes cidades, mas avançam consideravelmente na construção de habitações, no saneamento básico, no programa "Luz para Todos" e na implantação de transportes urbanos de alta capacidade em algumas regiões metropolitanas. O setor da construção civil será bastante impulsionado, o que é de suma importância para gerar empregos e ativar a demanda industrial. Em recursos hídricos, o PAC não é tão abrangente quanto o "Cresce Brasil", mas atende parte considerável do que foi proposto pelos engenheiros brasileiros, notadamente na região Nordeste.

O programa do governo federal não abrange amplamente a questão das comunicações, que para o "Cresce Brasil" é uma condição sine qua non do desenvolvimento. Limita-se o PAC ao estímulo ao setor com desonerações tributárias para os semicondutores, TV digital e computadores. A inclusão informacional dos setores excluídos não avança com o PAC, o que ainda pode acontecer se destravados os recursos do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) previstos em lei para essa finalidade.

O PAC também não aborda o agronegócio, como faz o "Cresce Brasil", mas pode-se considerar nesse aspecto que a infra-estrutura em logística atende importante demanda do setor, bem como os projetos de infra-estrutura hídrica no Nordeste, além de apresentar excelentes oportunidades aos agricultores na produção de matéria-prima para biocombustíveis. O que, porém, é insuficiente, pois o agronegócio tem muitas outras dimensões a serem cuidadas.

Apesar das ressalvas, espera-se que as proposições do PAC tornem-se uma realidade e que, no seu processo de implantação, surjam outros programas que promovam ações capazes de um desenvolvimento integral, sustentável e soberano.