Título: Economistas brasileiros vêem freada brusca nos EUA, mas não recessão
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2007, Internacional, p. A12

Economistas ouvidos pelo Valor acreditam que o Fed conseguiu salvar os EUA de uma recessão prolongada ao cortar agressivamente os juros nesta semana. Mas, mesmo os otimistas, como Fernando Cardim, da UFRJ, e Fábio Silveira, da RC Consultores, não descartam a possibilidade de que a economia americana tenha crescimento zero ou mesmo se contraia no ultimo trimestre deste ano e no início de 2008, no rastro da crise deflagrada pelo setor imobiliário. No campo dos pessimistas, o economista e ex-presidente do Banco Central, Francisco Lopes, acha que "a situação da economia americana ainda não caracteriza um quadro recessivo, mas uma ruptura do tipo empresários parando de investir ou uma quebra de bancos pode desencadear uma recessão".

Lopes vê 50% de probabilidade de a taxa de crescimento ficar entre zero a 0,5% nos EUA em 2008. Neste cenário de redução da atividade, o PIB industrial cai entre 2% a 2,5% ao longo do ano até dezembro de 2008, ante dezembro de 2007. No mesmo período, a produção de bens de capital contrai 5%. Um cenário alternativo mais pessimista, com o PIB americano apresentando variação negativa no ano que vem, não é "descartável" para o economista. "O Fed já deveria ter cortado os juros há três meses atrás, pois a produção industrial local vem perdendo velocidade há uns seis meses, dado que o setor de imóveis tem efeito cascata sobre a economia", disse.

O economista teme que um movimento de contração dos créditos bancários possa vir a aprofundar um processo recessivo nos EUA. Neste contexto, reconhece que a queda dos juros determinada pelo Fed pode evitar tal situação, "apesar do mercado de commercial papers estar derretendo".

Para Fernando Cardim, do Instituto de Economia da UFRJ, a situação não é tão delicada. "Recessão pode haver, mas ainda não é provável. Já há uma desaceleração, mas para haver uma recessão seria preciso um contágio do subprime para o resto de oferta de crédito para empresas e outros títulos securitizados. É isso que o Fed está tentando segurar ao cortar os juros dos Fed Funds em 0,5 ponto", avalia. Ele acha que o clima não é tranqüilo, mas não vê razão para um cenário mais pessimista.

Para ele, o efeito mais imediato da queda dos juros básicos foi elevar o preço dos ativos financeiros, ou seja, os papéis das hipotecas e títulos de dívida (que são a parte podre na carteira dos bancos e fundos de investimento) se valorizaram. "A pressão sobre as instituições alavancadas se reduziu." No raciocínio de Cardim, o Fed já demonstrou que sabe o que faz. Ele diz que o truque nisso tudo é a autoridade monetária dar liquidez e procurar gerenciar a saída desses papéis podres do mercado, mudando devagar o perfil das carteiras, como ocorreu em 1998, quando quebrou o Long Term Capital Management (LTCM). Na época, os credores tiveram um ano para ir vendendo os ativos aos poucos.

O maior risco no mercado americano agora são as instituições que compraram papéis de subprimes e outros commercial papers quererem desarmar suas posições rapidamente, alerta Cardim. "Se quiserem desovar tudo de uma vez só, o preço desaba, vem o pânico e o contágio para toda a economia. E se entra num buraco negro".

Fábio Silveira, economista da RC Consultores, não crê que a economia americana vá embicar para cima de imediato após este corte de juros do Fed, mas não vê risco de recessão. E reconhece que "a autoridade monetária está se esforçando para oferecer uma expectativa mais favorável para o mundo dos negócios, numa perspectiva de retomada suave da atividade no segundo semestre de 2008".

Silveira projeta crescimento do PIB americano entre 1,5% a 2% em 2008. Até lá, a economia terá dois trimestres de baixo crescimento - o último deste ano e o primeiro de 2008 - com taxas perto de zero ou mesmo alguma retração. Mas ele vê fantasmas rondando os EUA, como a alta do preço do petróleo, que pode trazer impacto sobre inflação, deixando o Fed de "cobertor curto". Como poderá recorrer a política monetária para conter os preços, se está cortando juros para salvar o país de uma recessão?