Título: Alta nas exportações americanas ajuda a sustentar PIB
Autor: Phillips, Michael M.
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2007, Especial, p. A16

Nos últimos 12 meses, um estreitamento do déficit comercial americano fez a maior contribuição para o crescimento em 14 anos. E o padrão provavelmente persistirá até boa parte de 2008.

A recessão no mercado habitacional e as condições de crédito apertadas poderão até mesmo acelerar essa tendência: à medida que cair a demanda nos EUA, o mesmo acontecerá com as importações. Ao mesmo tempo, crescimento ininterrupto no exterior e nova desvalorização do dólar continuarão a estimular as exportações americanas. Isso pode assinalar o início do longamente aguardado realinhamento do crescimento mundial que reequilibrará os fluxos comercial e de capital entre os EUA e o resto do mundo.

Desde fins dos anos 90, os EUA vêm consumindo mais do que produzem - em grau cada vez maior -, o que se reflete na disparada do déficit em conta corrente. Ano passado, o desequilíbrio, compreendendo o déficit comercial e algumas outras transações financeiras, tinha crescido para um recorde de 6,2% do PIB, em comparação com apenas 2,5% em 1998. Totalizando US$ 811,5 bilhões no ano passado, a disparidade entre o consumo e a produção americanas precisou de um igual montante de capital estrangeiro para ser financiada.

O encarecimento do petróleo fez crescer o déficit comercial nos últimos anos, mas, em termos reais - isto é, após um ajuste por variações no preços -, o descompasso atingiu seu máximo no fim de 2005 e vem se estreitando desde então. Até mesmo com o petróleo mais caro, o déficit em conta corrente mais abrangente também diminuiu consideravelmente durante o segundo trimestre de 2007, e deverá encolher, neste ano, pela primeira vez desde 2001.

A inflexão acontece em momento oportuno, quando a economia defronta-se com mais desaquecimento no mercado habitacional. No ano passado, a construção de casas subtraiu cerca de um ponto percentual da taxa de crescimento da economia e exercerá aproximadamente o mesmo impacto negativo neste ano. Um desequilíbrio comercial maior em 2006 foi um freio adicional ao crescimento, mas, neste ano, o comércio está rumando para fazer sua primeira contribuição positiva desde 1995.

Um déficit comercial substancialmente menor contribuiu com saudável 1,4 ponto percentual para o crescimento de 4% no PIB real do segundo trimestre. Foi o maior incremento trimestral desde 1996. Economistas duvidam de que o ritmo possa ser sustentado, mas, em geral, acreditam que um estreitamento do déficit comercial poderia acrescentar pelo menos meio ponto percentual ao crescimento, tanto neste ano como no próximo.

A melhoria na tendência persistiu em julho. O déficit comercial mensal de produtos e serviços diminuiu um pouquinho, para US$ 59,2 bilhões, de US$ 59,4 bilhões em junho. Ajustados pela variação nos preços, os novos números mostraram-se ainda melhores, especialmente quanto à parcela da balança comercial referente a produtos, uma vez que o componente serviços foi superavitário. O déficit real referente a produtos caiu para seu mais baixo nível em quase três anos.

O vigor por trás da tendência no comércio americano está no lado exportador. As exportações reais de produtos deram um salto de 3,5% em comparação com junho, ou seja, o maior crescimento mensal desde o início de 2004, puxado pela demanda por automóveis, aeronaves e equipamentos para telecomunicações. Ao mesmo tempo, as importações reais de produtos continuaram a crescer, porém mais lentamente, neste ano, devido ao esfriamento nos gastos domésticos nos EUA.

A grande possibilidade de um desequilíbrio comercial ainda mais estreito em 2008 revela-se nas taxas de crescimento relativo das exportações e importações até agora, neste ano. Em julho, as exportações reais de produtos cresceram 7,7% em comparação com o mesmo período do ano anterior, ao passo que as exportações aumentaram 2,4%. Considerando que os produtos importados são mais do que 60% superiores às exportações, a taxa de crescimento das exportações tem de crescer pelo menos 60% mais rapidamente apenas para manter o déficit constante. Até o ano passado, isso era muito difícil. Mas até agora, neste ano, as exportações estão crescendo mais de três vezes mais rápido do que as importações.

O impulso por trás das exportações vem de uma economia mundial robusta e de um dólar competitivo, e os dois fatores continuarão a dar sua contribuição. No início de setembro, o valor do dólar ponderado pelas trocas comerciais atingiu um mínimo recorde frente a uma cesta de moedas importantes, e pairou próximo de um mínimo em dez anos em comparação com todos os parceiros comerciais. Essa queda reduziu efetivamente o preço dos produtos americanos em mercados estrangeiros, ao mesmo tempo em que encareceu as importações americanas.

Às vésperas de 2007, a moeda americana tinha caído 18% frente a todas as moedas, desde seu pico no início de 2002, e desde o início deste ano o dólar caiu outros 4,1%. Dois fatores que tendem a incrementar a atratividade de ativos fora dos EUA sugerem um declínio adicional: as perspectivas de crescimento externo continuam parecendo mais promissoras do que nos EUA, e o Fed reduz os juros enquanto outros bancos centrais mantêm as suas taxas. E as perspectivas no exterior são de renovados aumentos de juros, à medida que a crise de crédito ceder.

O aperto de crédito deverá reduzir um pouco os quase 5% de crescimento mundial esperado para este ano. Mas, o que é diferente, quanto ao crescimento no exterior, agora, é que as economias estrangeiras estão cada vez mais sendo impulsionadas por demanda interna, com menor dependência de suas exportações para os EUA. O crescimento no exterior não se desacoplou inteiramente do ciclo econômico americano, mas está hoje em melhores condições de resistir a um desaquecimento nos EUA. Em especial, a nova e enorme influência da China e da Índia, e seu impacto sobre os mercados emergentes asiáticos e em todo o mundo, ajudará a manter a demanda por produtos americanos

Indiscutivelmente, essa expectativa otimista sobre o comércio poderá ser minada, especialmente enquanto a incerteza sobre os preços de muitos ativos relacionados com o mercado de crédito imobiliário habitacional continuar a estrangular áreas cruciais dos mercados financeiros. Um risco é de que o aperto de crédito torne-se tão disseminado que termine por asfixiar o crescimento estrangeiro, em detrimento das exportações americanas. Outro risco é que o dólar dê um mergulho abrupto e perturbe os fluxos internacionais de capital. Finalmente, quaisquer iniciativas protecionistas dos EUA, que poderão surgir com a aproximação das eleições para a presidência americana em 2008, diminuiriam as perspectivas de melhoria do comércio, especialmente se o protecionismo americano desencadear retaliação no exterior.

Mas, a globalização contribui efetivamente para reduzir esses riscos. A rápida reação de política monetária ao imbróglio no mercado financeiro é sentida nos mercados em todo o mundo. A crescente riqueza das economias no exterior põe grande volume de poupança externa disponível para os EUA administrarem seus compromissos externos, proporcionando, assim, sustentação ao dólar. E as economias em todo o mundo estão ficando mais mutuamente dependentes para crescer. A China é hoje o quarto maior destino das exportações americanas. Isso contribui para deixar cada vez mais evidente as desvantagens do protecionismo. (Tradução de Sergio Blum)