Título: Troca de ISS por IVV traria prejuízo a capitais
Autor: Watanabe , Marta
Fonte: Valor Econômico, 04/12/2007, Brasil, p. A3

A proposta do governo federal de incorporar o Imposto sobre Serviços (ISS) ao Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) estadual deverá trazer perda para a maior parte das capitais. Pela proposta, as prefeituras perderiam a arrecadação de ISS e passariam a arrecadar o Imposto sobre Vendas a Varejo (IVV). Numa alíquota de 1,5% de IVV, apenas deixariam de perder os municípios de Boa Vista, João Pessoa, Porto Velho, Rio Branco, Teresina e Macapá.

Um estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda mostra que, para que não houvesse perdas em relação à atual arrecadação de ISS, São Paulo deveria ter uma alíquota de 3,3% de IVV. O Rio, de 3,3% também. Brasília, 3,1% e Salvador, 1,8%.

"Com a alíquota que está sendo divulgada, de 1,5%, São Paulo arrecadaria com o IVV cerca de R$ 2 bilhões. A arrecadação prevista de ISS em São Paulo para este ano é de R$ 5 bilhões. Isso significa uma perda de R$ 3 bilhões", diz o procurador municipal Fernando D. Fleury Curado, coordenador do Grupo de Trabalho sobre a Reforma Tributária. A possibilidade de ressarcimento via Fundo de Participação dos Municípios (FPM) é considerada remota. O FPM da capital paulistana, lembra o secretário de Finanças do município, Luiz Fernando Gusmão Wellisch, é de apenas R$ 100 milhões anuais. "São valores incomparáveis."

"De acordo com os estudos da União, para que os municípios não percam receitas em relação ao ISS, a alíquota média de IVV seria de 1,7%. Ou seja, mesmo considerando a média, com a proposta de 1,5% já haveria desvantagem global na comparação com o ISS", argumenta Curado.

Segundo os cálculos da prefeitura paulistana, o IVV do município de São Paulo precisaria ser de, no mínimo 5% para manter o nível de arrecadação atual do ISS. "Essa alíquota, porém, vale para uma base de venda a varejo ampla que inclui, além de venda de mercadorias, os serviços, inclusive combustíveis, energia elétrica e telecomunicações", explica. Numa base que inclua apenas mercadorias, diz, a alíquota necessária seria de 14%.

Seja de 5% ou 14%, a alíquota é considerada muito alta pela própria secretaria de Finanças. "As altas alíquotas são inviáveis porque geram sonegação", lembra Wellisch.

Segundo o estudo da Fazenda, Belo Horizonte manteria a atual arrecadação de ISS com uma alíquota de IVV de 1,6%. Para o secretário de Finanças de Belo Horizonte, José Afonso Bicalho, porém, a conta não é tão simples. O governo, diz, levou em consideração os números de 2005, mas nas regiões metropolitanas o ISS tem registrado tendência de aumento de arrecadação em função do crescimento do setor de serviços. "De 2005 a 2006, por exemplo, o ISS teve aumento real de arrecadação da ordem de 10% a cada ano", lembra. "É um recolhimento que tem se tornado cada vez mais importante para as capitais em função do crescimento do setor de serviços." A troca do ISS pelo IVV tende a ser vantajosa somente para as cidades muito pequenas que possuem uma arrecadação de ISS insignificante. "Nesses casos, não há praticamente nada a perder e a prefeitura ainda terá uma nova fonte de arrecadação."

No município de São Paulo, a evolução em termos reais também foi significativa. Dos R$ 1,8 bilhão em 2001, o recolhimento do imposto saltou para R$ 4 bilhões em 2006, com projeção a R$ 5 bilhões para 2007. O crescimento real do ISS desde 2001 foi superior a 40%, informa a prefeitura. "O governo federal propõe retirar o recolhimento do ISS dos municípios exatamente num momento em que o tributo começa a dar mais resultados", argumenta Wellisch.

Bicalho, de Belo Horizonte, aponta outro problema. "Além da perda de arrecadação, teremos um custo adicional para renovar toda a fiscalização, que hoje está focada no setor de serviços", diz ele. Além de redirecionar toda a política de fiscalização, o município teria o desafio de cobrar o ISS de um universo formado por pequenos estabelecimentos, com alta pulverização e, por isso, difícil de controlar. "O número de varejistas com certeza será maior do que o de prestadores de serviços", diz. "Não se sabe também como ficará o caso das empresas varejistas que já estão no Supersimples. Em Belo Horizonte, 85% do varejo está nessa sistemática, o que talvez inviabilize a cobrança do novo IVV."

A pulverização do segmento varejista também é um ponto de preocupação na capital paulista. Segundo o procurador municipal Fernando Fleury Curado, uma estimativa preliminar da prefeitura mostra que o universo de contribuintes do ISS é de cerca de 800 mil prestadores. "Em torno de 50% da arrecadação, porém, é garantida por 700 empresas porque há uma certa concentração de recolhimento. As instituições financeiras, por exemplo, são contribuintes importantes." No setor varejista, a escala é outra. "Os mesmos 50% de arrecadação demandariam o recolhimento do IVV por cerca de 40 mil contribuintes. "

O estudo do Ministério da Fazenda sobre o impacto do IVV calculou o custo que a União deverá ter com a implantação de várias alíquotas do novo imposto. A Fazenda fez cálculos usando ao total seis alíquotas, entre 0,5% e 3%. O custo da União, segundo o levantamento, aconteceria em duas pontas. Na primeira, para compensar os municípios que perderiam arrecadação na migração do ISS para o IVV. O segundo seria o custo de manutenção da carga tributária, já que a União se compromete a reduzir a carga tributária global caso o IVV represente aumento do nível totalç de tributos. Na alíquota de 1,5%, o custo fiscal da União é calculado em R$ 2,16 bilhões, levando em consideração os números de 2005.