Título: TCU libera edital do Madeira, mas vê sobrepreço na obra
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2007, Brasil, p. A3

O Tribunal de Contas da União (TCU) encontrou inconsistências nos estudos de viabilidade técnica e econômica da usina Santo Antônio, a primeira das duas hidrelétricas do rio Madeira, mas liberou a publicação do edital para o leilão do empreendimento. Segundo o tribunal, o investimento na hidrelétrica foi superestimado em pelo menos R$ 900 milhões e a correção dos problemas apontados fará o valor máximo da energia na licitação cair cerca de 13%. Ao longo dos 30 anos de concessão, isso deverá reduzir o fluxo de caixa da empresa que arrematar a usina em R$ 14,5 bilhões, com economia similar das tarifas cobradas dos consumidores do sistema interligado.

Para avaliar os custos do empreendimento, o TCU baseou-se em estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, que projetam em R$ 9,5 bilhões o investimento na construção de Santo Antônio, com potência instalada de 3.150 megawatts (MW). O consórcio Furnas/Odebrecht estima o investimento em R$ 13,5 bilhões, mas o valor foi descartado pelos técnicos do TCU, que acharam nele "pontos de fragilidade".

A equipe do TCU chegou à conclusão de que a usina Santo Antônio pode ser erguida por aproximadamente R$ 8,6 bilhões e apontou uma série de inconsistências, que vão do sobrepreço das obras civis a valores exagerados das turbinas. A área técnica defendia a classificação dos problemas levantados como "irregularidades", gerando determinações que deveriam ser obrigatoriamente cumpridas para o lançamento do edital. O ministro-relator, Benjamin Zymler, não acatou esse pedido e ressalvou que "inexistem, até o momento, atos eivados de ilegalidade ou praticados por autoridade incompetente". Com isso, o acórdão do TCU indica somente "recomendações" ao ministério e à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

O relatório da equipe técnica sustenta que houve "sobrepreço" de R$ 680 milhões na estimativa de gastos com equipamentos eletromecânicos, depois de comparar as despesas previstas para a hidrelétrica Santo Antônio com a média de outras dez usinas equipadas com turbinas similares, do tipo bulbo. Também aponta "sobrepreço" de 6,32%, nas obras civis, em relação aos parâmetros de mercado. Corrigindo esse problema, o TCU indica economia potencial de mais R$ 220 milhões. A principal inconsistência verificada nos custos de obras civis está no cálculo da taxa de Lucro e Despesas Indiretas (LDI), estimada pela EPE em 35%, a partir de "metodologia questionável". O TCU corrigiu para 16,81%.

Há pelo menos outros dois pontos contestados pela equipe técnica do tribunal , que foram endossados por Zymler. O primeiro diz respeito a uma despesa com programa ambiental de R$ 90 milhões, descrita pela EPE, mas que não consta de nenhuma das exigências feitas pelo Ibama na emissão da licença prévia.

O segundo ponto é o custo do financiamento pelo BNDES. Para o TCU, a falha do ministério foi calcular o valor com base nos valores históricos cobrados pelo banco, sem levar em conta que a instituição já definiu valores pré-fixados para financiar as usinas. Essas inconsistências, segundo o tribunal, podem diminuir o preço máximo da tarifa em 13%. O valor de referência, mantido em sigilo, será adotado pelo ministério como teto no leilão. Ganha a concessão quem oferecer a menor tarifa.

Procurada pela reportagem, a EPE disse que está analisando as recomendações do tribunal. A Odebrecht não quis se pronunciar. O Valor apurou que o acórdão do TCU causou espanto na construtora pela estimativa de custos da usina, de R$ 8,6 bilhões, e pela recomendação de que sejam refeitos os estudos comparativos entre as soluções com turbinas do tipo bulbo e kaplan. A Amel, empresa criada pela Camargo Corrêa, afirmou que o acórdão "dá um sinal de que o edital vai sair, mas que ainda há algum dever-de-casa a ser feito".