Título: Governo conta com traições para aprovar CPMF no Senado
Autor: Jayme, Thiago Vitale; Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2007, Politica, p. A9

Ruy Baron/Valor - 16/5/2005 A relatora da PEC, Kátia Abreu, do Democratas, vai recomendar em seu parecer que a prorrogação seja rejeitada A proposta de emenda à Constituição (PEC) que prorroga a validade da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o imposto sobre o cheque, e da Desvinculação dos Recursos da União (DRU), chegou ontem ao Senado e o governo federal já começa a atuar para aprovar o texto o mais rápido possível. Depois de ser aprovado em segundo turno pelo plenário da Câmara por boa margem de votos, na madrugada de ontem, o texto terá negociação bem mais complicada entre os senadores.

Todo o esforço objetiva garantir os R$ 38 bilhões anuais do imposto. Se na Câmara a maioria governista fez a diferença (na votação do texto principal, durante a madrugada, a vitória foi de 333 votos a favor, 113 contrários e duas abstenções), no Senado o governo faz contas dos votos.

Como se trata de uma proposta de emenda constitucional, é necessária a aprovação por três quintos dos plenários das duas Casas. No Senado, são necessários 49 votos em dois turnos de votação. O Palácio do Planalto contabiliza 43 até agora e espera pelas traições da oposição para garantir o número mínimo. No último mês, o governo federal conseguiu cooptar três senadores do DEM. César Borges (BA), Édison Lobão (MA) e Romeu Tuma (SP) deixaram o partido, que fechou questão contra o imposto. O baiano foi para o PR. O maranhense rumou para o PMDB e o paulista engordou as fileiras do PTB.

O líder do DEM na Câmara, deputado Onyx Lorenzoni (RS), critica as mudanças e relembra as perdas de deputados para os partidos da base no primeiro mandato do presidente Lula. "O mensalão fez uma limpeza ética da nossa bancada na Câmara. Agora, a CPMF faz uma limpeza fisiológica na bancada do Senado. É ótimo. Ser oposição é ser transparente, coerente, ter voto de opinião. Quem não se pauta por isso, pode ir embora", afirma.

O governo aposta em duas frentes para aprovar a CPMF no Senado: negociação com o PSDB, ajudada pela pressão dos governadores do partido, e afastamento do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), até a votação da PEC no plenário - o que deve ocorrer somente no fim de novembro. Mas enfrenta divergências na própria base aliada e a disposição do DEM de protelar a tramitação. Para isso, o partido conta com dois trunfos - o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Marco Maciel (PE), e a relatora da PEC, Kátia Abreu (TO), são da bancada do Democratas.

A orientação do partido é que a CCJ use todo prazo regimental de que dispõe (30 dias) para aprovação do parecer de Kátia, que recomendará a não aprovação. Já está prevista a realização de audiências públicas. "A comissão vai utilizar o prazo necessário para esclarecimento da matéria, que é de interesse de toda a sociedade", afirmou Maciel.

Na terça-feira, a bancada do DEM reúne-se para discutir o assunto. Segundo o líder, José Agripino (RN), haverá tentativa de definir uma estratégia de procedimentos comum com o PSDB.

O governo já começou a intensificar a pressão sobre os senadores. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, repetiu ontem uma provocação que já vinha fazendo, mas foi mais direto. Disse que caso o imposto do cheque seja derrubado, poderia elevar alíquotas de tributos - IOF e imposto de exportação - sem a necessidade de aval do Congresso. O ministro afirmou que, se não aprovarem a CPMF, haverá cortes importantes no PAC e nos recursos destinados aos Estados.

O deputado Paulo Bornhausen, vice-líder do Democratas, respondeu às declarações de Mantega afirmando que o ministro "desrespeita o Senado Federal com mentiras e ameaças com base em argumentos falsos".

"O ministro Mantega acha que pode achincalhar o Senado e os senadores por causa da situação em que se encontra o Senado Federal", criticou. Na sua visão, esse cenário foi criado pelo apoio que Lula e o PT deram a Renan Calheiros, defendendo sua absolvição no primeiro processo de cassação quebra de decoro.

O vice-líder dos Democratas ainda considerou "chantagem baixa" a ameaça de aumentar outros impostos se a CPMF acabar. "O ministro mente. O que ele quer ignorar é que a opinião pública sabe que o Brasil pode viver sem a CPMF, que Lula não precisa da CPMF para continuar pagando a Bolsa Família e que existem alternativas viáveis e sem traumas, sem corte em orçamento, para substituir a receita truculenta da CPMF".

O líder do DEM no Senado, José Agripino, reagiu também a Mantega. "O governo mandou para o Senado a CPMF com uma ameaça. Entrou pelo pior dos mundos. Uma declaração dessa piora o humor. A reação do Congresso tem de ser explosiva", afirmou Agripino.

Ele avisa que o governo não terá colaboração da oposição para aprovar a PEC com rapidez. "O governo, que demorou cinco meses para aprovar a CPMF na Câmara, onde tem maioria, não pode querer aprovar aqui no Senado no prazo que pretende".

O presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE) - falando em seu nome e não do partido -, admite que a aprovação da PEC pode ser facilitada se o governo enviar ao Congresso sua prometida proposta de reforma tributária, negociando previamente o texto com as lideranças partidárias. Essa proposta negociada, segundo ele, deveria incluir dispositivos fixando redução da alíquota da CPMF e prazo para sua extinção.

Tasso preside subcomissão encarregada de discutir a questão tributária. Na segunda-feira, a subcomissão ouviu o secretário da Receita, Jorge Rachid, e o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. Ambos sinalizaram disposição para negociar. Nova reunião foi marcada para daqui a duas semanas. Hoje, os ministros Guido Mantega (Fazenda) e Walfrido dos Mares Guia reúnem-se com o presidente da CCJ e lideranças do Senado para também tratar da CPMF, mas chegam um dia depois das ameaças.

Pelo cronograma estabelecido pelos líderes governistas, a votação da PEC no plenário será concluída em 20 de dezembro, dia em que seria realizado o segundo turno.

A líder do PT, Ideli Salvatti (SC), reconhece que esse cronograma só será possível se os prazos regimentais forem cumpridos à risca - o que é praticamente impossível no ambiente conturbado vivido pelo Senado. Segundo ela, o governo aposta no fato de o PSDB ter interesse em manter a arrecadação da CPMF, por causa dos governadores do partido e pela perspectiva de vitória na sucessão presidencial de 2010. No caso do DEM, Ideli acredita que, apesar do fechamento de questão, algumas exceções poderão ser abertas para que senadores votem a favor da CPMF. "É com essas brechas que vamos trabalhar. E pondo durepox na nossa base", afirmou.

O senador Antonio Carlos Magalhães Júnior (DEM-BA) garantiu que votará contra o tributo e fará discursos contundentes tanto na CCJ quanto em plenário. Negou, como afirmado na edição de ontem do Valor, que esteja entre os votos oposicionistas contabilizados pelo governo. "Se eles estiverem contando com o meu voto, esqueçam. O governo terá uma surpresa desagradável no Senado", afirmou. (Colaboraram Paulo de Tarso Lyra e Arnaldo Galvão)